Título: Lula deixará de defender Sarney publicamente
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2009, Política, p. A11

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não vai mais defender publicamente o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Na avaliação de auxiliares próximos do presidente Lula, esta fase, motivada por dívidas de gratidão e necessidade de manutenção da aliança com o PMDB, já passou. "Se o problema persistir, corre-se o risco de o Legislativo transferir para o colo do presidente uma crise que não é dele, o que não é nada bom para o governo".

Por duas vezes, Lula veio a público defender um dos seus principais aliados no PMDB. Durante viagem à Europa para encontro dos Bric (Brasil-Rússia-Índia e China), o presidente disse que Sarney não podia ser tratado como "uma pessoa comum". Na terça-feira, em São Paulo, ele atacou o clima de denuncismo na imprensa e repetiu o apoio ao presidente do Senado. "Minha solidariedade é porque o Sarney já foi presidente, tem responsabilidades, tem passado que lhe garante muitas coisas. Está fazendo uma investigação e, se for provado que houve erro, pune-se quem errou e a vida continua", afirmou o presidente.

A crise do Senado foi um dos principais temas debatidos durante a reunião de coordenação política realizada na manhã de ontem. Depois que o presidente Lula deixou o encontro para recepcionar a presidente das Filipinas, Glória Arroyo, no Palácio do Itamaraty, os demais ministros do comando do governo permaneceram no Centro Cultural Banco do Brasil, debatendo a questão, que pode trazer prejuízos ao Executivo.

O governo teme que a paralisia da Casa impeça a aprovação de matérias importantes para o Executivo. O clima de disputa política altera a relação de forças no Senado, uma Casa na qual o governo tem uma maioria extremamente frágil. E mais: Sarney e a cúpula do PMDB, incluindo o líder do partido, Renan Calheiros (AL) estão na alça de mira de oposicionistas e até alguns aliados, como o principal deles, o PT, partido do presidente.

O governo teme possíveis retaliações pemedebistas. Integrantes do Executivo lembram que a ideia de criar uma CPI para investigar a Petrobras nasceu da insatisfação de setores do PMDB com a demissão de afilhados políticos na Infraero. Por enquanto, a instalação da CPI encontra-se suspensa, apesar de os nomes já terem sido indicados pelos líderes partidários. "Mas ninguém tem certeza se a CPI não será desenterrada como fruto de chantagem", lembrou um assessor governista.

Auxiliares do presidente lembram que existe independência entre os Poderes. Mas não escondem que as dificuldades dos senadores, especialmente da cúpula, começam a incomodar o governo, embora tenha sido iniciativa do próprio presidente ligar-se ao caso Sarney. "São aliados, mas esperamos que o Senado busque saídas e soluções para não se repetirem os fatos descobertos nos últimos dias", destacou ao Valor um petista muito próximo de Lula.

Segundo este interlocutor, as denúncias não podem ser simplesmente esquecidas sem que medidas sejam tomadas em defesa da transparência. "O Senado não pode mais tomar suas atitudes à revelia da opinião pública, dando as costas para os critérios de transparência", defendeu um governista.

Os atos secretos e a descoberta de que o Senado tem duas contas paralelas à contabilidade oficial (ver matéria nesta página) - que é fiscalizada pelo Tesouro da União - surpreenderam o governo. "Não existe mais espaço para fazer coisas que não sejam publicadas nos diários oficiais ou em outros mecanismos de informação para a população". Segundo o auxiliar, a política brasileira vive um outro momento no qual situações como estas tornam-se anacrônicas.

Um aliado do governo ficou impressionado com a descoberta das contas paralelas, afirmando que nos últimos anos foi montada uma estrutura de poder clandestina no Senado, que começa a vir à luz neste momento. Segundo governistas, a crise deflagrada a partir da eleição de José Sarney começa a ganhar contornos perigosos. "O Senado pode parar de votar", lamentou um governista.