Título: Minc tenta se desculpar e é desrespeitado pelos ruralistas
Autor: Zanatta , Mauro
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2009, Política, p. A10
Personagem de diversas polêmicas e recentes altercações públicas, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, foi submetido ontem a uma constrangedora sessão de ataques pessoais e desagravos aos ruralistas ao longo de cinco horas de retratações na Comissão de Agricultura da Câmara.
O clima beligerante entre Minc e os parlamentares começou há quase um mês, quando o ministro classificou os ruralistas de "vigaristas". De cima de um trio elétrico, na Esplanada dos Ministérios, Minc afirmou que os representantes do setor rural aproveitavam da boa-fé dos pequenos produtores para conseguir vantagens aos grandes latifundiários. O substantivo, sinônimo de "velhaco, trapaceiro", provocou a ira de líderes ruralistas no Congresso. Convidado a explicar sua declaração na semana passada, Minc informou que viajaria a Natal (RN). Irritados, os ruralistas decidiram, então, convocá-lo para aplicar-lhe um passa-fora público.
Jogado aos "leões" na arena ruralista, Minc tentou antecipar-se à enxurrada de agressões verbais que viria dos mais exaltados entre os 30 deputados. "Quero ir além do pedido de desculpas. Não penso aquilo. As pessoas eleitas pelo voto não podem ser tratadas com expressão desse jeito", afirmou. Diante do impacto pífio da escusa, tentou ir além: "Invoco como atenuante o calor de um carro de som de uma manifestação, o que pode explicar, mas não justificar". Mas a humildade do ministro não arrefeceu os ânimos. Ao contrário, instilou mais veneno ao ambiente hostil. "São estes "vigaristas" que dão comida aos consumidores do seu Rio. Essas desculpas devem ir para os milhões de produtores rurais brasileiros que foram atacados por Vossa Excelência", abriu, dedo em riste, o deputado arrozeiro Luis Carlos Heinze (PP-RS). Acuado, Minc emendou: "Retiro a expressão. Foi indevido, impróprio, incorreto e descabido".
Ninguém se comoveu. E o tom de penitência deu mais combustível. "Dá vergonha ser brasileiro ao ver um homem como o senhor neste cargo tão importante falando do que não sabe e não conhece", discursou o deputado pecuarista Giovanni Queiroz (PDT-PA). "Vossa Excelência não merece o cargo. Deveria sair daqui e pedir demissão". O ministro assentiu com a cabeça e o burburinho se espalhou pela comissão.
Em meio ao clima de embaraço, o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), ficou sozinho na defesa de Minc. "Uma frase não apaga uma vida. Estamos diante de um líder ambiental do país". A tímida intervenção não foi convincente. O troco veio ainda mais inflamado. Influente ruralista, o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO), pesou a mão. "O senhor usa o agronegócio como boi de piranha para salvar barbaridades como a licença para a usina nuclear de Angra 3", disse. "O ministro é um professor de maniqueísmo. É primário". E, em tom de palanque, arrematou: "O senhor se sentiria confortável se eu dissesse que nós, produtores rurais, defendemos a produção de arroz, de milho, de soja, de carne, e que Vossa Excelência defende a produção de cocaína e de maconha?". O desconforto virou assombro. Minc segurou o fôlego, mas Caiado insistiu: "Ninguém aqui quer tirar picanha do Minc porque não comemos carne contaminada", disse, sobre declarações irônicas de Minc sobre os apelos dos ruralistas por sua demissão sumária.
Na réplica, Minc respondeu a Caiado. "Sempre combati o crime organizado. Essas expressões contra mim são mentirosas, falsas, injuriosas e não as aceito", irritou-se. À saída do bombardeio, e após almoçar "dois biscoitos", o ministro quase arrependeu-se do tom penitente de suas respostas: "Usaram expressões 10 vezes mais graves aqui e não ouvi desculpas".
Antes, com o plenário mais vazio, Minc acenou com propostas de afrouxar as regras do Código Florestal, como regularizar áreas consolidadas, mas rejeitou a delegação de poderes legislativos aos Estados, como querem os ruralistas em sua proposta de alteração na lei atual. "Podemos ter convergências nas divergências", disse Minc. "Defeitos, tenho vários. Mas sou do diálogo".