Título: OCDE quer Brasil no combate a paraísos
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2009, Finanças, p. E2

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) está convidando, mais uma vez, o Brasil a se engajar concretamente na luta contra os paraísos fiscais, que está no centro da agenda da reforma financeira internacional.

Em repetidos discursos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem acusado os paraísos fiscais de "esconder o crime organizado, narcotráfico, lavagem de dinheiro" e defender seu fim como "um bem para a humanidade".

Mas na prática o país continua sem aceitar participar do Fórum Mundial sobre Transparência e Troca de Informações, da OCDE, que se torna o mecanismo central para desmantelar a evasão fiscal e os centros financeiros ditos de zona cinzenta, por onde passam centenas de bilhões de dólares que deveriam ir para os cofres públicos.

A OCDE produz padrões pelos quais os países podem melhorar a taxação da renda de seus cidadãos. A entidade diz que isso é relevante não apenas para os centros financeiros "offshore", mas que todos os países ganham com sua implementação.

Certas fontes interpretam que o mecanismo da OCDE levaria o Brasil a dar informações automaticamente, tirar dúvidas dos outros países participantes sobre a situação tributária de indivíduos e empresas suspeitos de fraude ou práticas fiscais abusivas. A Receita Federal bloqueia a participação brasileira, segundo fontes, sob alegação de que a troca de informações fiscais precisa ser precedida de acordos bilaterais. Já o Itamaraty defende a adesão ao mecanismo da OCDE.

O secretário-geral da OCDE, Angel Gurria, visita Brasília no dia 14 de julho e parece evidente que o tema será levantado.

O fórum já tem 84 países membros, e o combate aos paraísos cresceu mais nos últimos três meses do que em 20 anos, de acordo com fontes em Paris. Dezenas de acordos já foram assinados para permitir a troca de informações bancárias em todos os casos fiscais, por exemplo.

A ausência brasileira está ficando desconfortável, diante do desenvolvimento da luta contra os paraísos fiscais. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, vem pedindo ao presidente Lula para se engajar concretamente no combate à fraude fiscal, que fragiliza a capacidade dos Estados e causam mais imposto para os contribuintes.

Nos corredores da conferência anual da OCDE, ontem, delegados indagavam do que o Brasil tem medo e como pode se permitir estar fora de um acordo de cooperação internacional que combate a evasão fiscal. "Que imagem o Brasil quer dar?", indaga uma fonte. "Até a Suíça parece querer ser mais cooperativa."

O Brasil só tem um acordo para troca de informações tributárias, fechado em 2007 com os EUA, em meio à polêmica entre especialistas.

Certos advogados interpretaram que, pelo acordo, um agente americano, não necessariamente fiscal, acompanhado de um brasileiro poderá investigar uma empresa, por exemplo, e vice-versa.

A próxima ocasião para o Brasil mudar de posição será em 1º e 2 de setembro, quando o fórum mundial se reune no México e faz um balanço da luta contra os paraísos fiscais. Dezenas de acordos de cooperação foram assinados por países suspeitos e tentando evitar a lista negra.

Segundo o jornal francês "Les Echos", os fundos detidos nos paraísos fiscais por indivíduos ou empresas com o objetivo de se esconder do fisco chegaria a algo entre US$ 5 trilhões e US$ 7 trilhões - uma soma gigantesca, ainda mais no cenário atual em que os governos precisam de recursos para superar a crise econômica global.

Mas o segredo bancário não é o único instrumento de dissimulação. Os "trusts" anglo-saxões estão no alvo. Certas formas jurídicas não permitem que os governos consigam informações mesmo quando o país de acolha assinou acordos de troca de dados. Somente na ilha britânica de Jersey, o montante de fundos geridos através de "trusts" chegaria a US$ 450 bilhões, segundo a organização americana Tax Analyst.