Título: Crescem consultas para compra de máquinas
Autor: Bouças,Cibelle ; Bueno, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 29/06/2009, Brasil, p. A4

O ambiente para investimentos industriais melhorou no segundo trimestre deste ano e estimulou um pequeno avanço tanto nas consultas para novos financiamentos como nos desembolsos (projetos já definidos) do BNDES. A redução da taxa básica de juros e do spread bancário, a leve recuperação na demanda do mercado interno e no nível de utilização da capacidade instalada (Nuci), além da melhora nos índices de confiança foram apontados por empresários e economistas como aspectos que tornaram o clima mais favorável.

Esses fatores, somados à expectativa de medidas do governo para estimular as vendas de bens de capital, que devem ser anunciadas hoje, fizeram as indústrias retomar os estudos para investir em modernização a partir do segundo semestre. Essa melhora no "ânimo" empresarial, dizem economistas, sinaliza o início de um processo de recuperação, que será lento e não livrará o setor de bens de capital de encerrar o ano com queda.

Conforme dados do BNDES, o total de consultas para novos empréstimos foi de R$ 19,53 bilhões em abril, resultado 45,5% superior ao registrado em abril de 2008. O montante também supera a média das consultas feitas entre outubro e fevereiro, de R$ 10,5 bilhões ao mês e que foram turbinados pelo pedido de R$ 25 bilhões da Petrobras. Na comparação por trimestres móveis, que permite avaliar uma linha de tendência de curto prazo, observa-se crescimento de 17,7% em relação ao trimestre encerrado em março.

Além dos novos pedidos, os dados do BNDES sinalizam recuperação nos projetos em andamento, ainda que mais tímidos. Os indicadores de financiamento para aquisição de máquinas e equipamentos apontaram expansão de 5,1% em abril, comparado a igual mês de 2008, expansão sustentada pelo desembolso para o setor de transportes. No trimestre encerrado em abril, o aumento dos desembolsos foi de 3,4%, totalizando R$ 8,6 bilhões.

Na avaliação por setor industrial, também houve melhora em setores específicos. Em abril, comparado a igual mês de 2008, houve aumento das consultas feitas pelos setores de veículos (10,8%), madeira (40,5%), eletricidade (93,1%), farmoquímico (62,4%), confecções, borracha e plástico (22,9%), vestuário e acessórios (23,1%), entre outros. Na comparação por trimestre móvel, houve incremento para os setores de transporte (4,5%), química (238%), móveis (5,3%), máquinas e equipamentos (35,1%), minerais não metálicos (79,2%) e farmoquímico (45,7%), entre outros setores.

"Investimento é um dado difícil de ser coletado. O cenário indica uma recuperação muito lenta. A crise ainda está sendo digerida. Só haverá uma melhora efetiva a partir do terceiro trimestre, sendo que no último trimestre, quando será feita uma comparação de intervalos pós-crise, será possível perceber uma melhora generalizada", avalia o diretor do Grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), David Kupfer. Os setores de infraestrutura, petróleo e construção civil, diz, resistiram melhor aos efeitos da crise externa e têm ajudado a impedir uma queda maior nas vendas de bens de capital.

Os desembolsos do BNDES cresceram para alguns setores industriais, entre eles produtos de metal (alta de 12,6% no mês e de 11% no trimestre), metalurgia (19,8% no mês e 3,5% no trimestre), minerais não metálicos (alta de 43,4% no mês e queda de 3,5% no trimestre), coque, petróleo e combustíveis (alta de 136,9% no mês e queda de 3,1% no trimestre). O setor de construção registrou incremento de 96,2% nos desembolsos em abril e de 1,1% no trimestre. O setor de água, esgoto e lixo registrou incrementos de 80,9% no mês e de 13,4% no trimestre.

A Kepler Weber, depois de quase três trimestres de encomendas afetadas pela crise, voltou a receber pedidos com "maior intensidade" a partir de maio, ainda que em ritmo menor do que no mesmo período de 2008, diz o diretor-presidente, Anastácio Fernandes Filho. De acordo com ele, os clientes ainda estão "conservadores" e "lentos" na tomada de decisões sobre investimentos. "O mercado está um pouco freado, mas pelo menos parou de cair", afirmou o executivo. As exportações, que respondem em média por 30% a 35% do faturamento da empresa, estão um pouco mais aceleradas do que o mercado interno, onde o melhor desempenho aparece nas regiões Sul e Sudeste, explica. No primeiro trimestre, a Kepler registrou queda de 29,2% na receita consolidada líquida, para R$ 30,8 milhões.

Segundo Fernandes Filho, o maior rigor dos bancos na liberação das linhas de crédito do BNDES também contribui para reduzir o ritmo dos negócios, já que cerca de 40% das vendas da empresa dependem de financiamento. Além disso, alguns clientes ficam à espera de novas reduções das taxas de juros para assinar contrato com as instituições financeiras.

A Dedini Indústrias de Base apresentou no segundo trimestre incremento de 50% nas consultas para aquisição de equipamentos voltados a usinas sucroalcooleiras, cervejarias e hidrelétricas, em comparação com o primeiro trimestre, afirma o presidente executivo do grupo, Sérgio Leme Santos. A média de consultas está em 75 por mês, contra 45 no início do ano. Em 2008, média era de 200 consultas ao mês. "O número de consultas cresceu, mas ainda não se converteu em encomendas efetivas. Ainda assim, é um indicador importante de que o processo de recuperação dos investimentos está mais próximo", afirma Leme. Ele prevê fechar o ano com queda de 30% sobre o faturamento de R$ 2,2 bilhões alcançado em 2008.

De acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), as vendas em maio recuaram 22,6% em comparação com o mesmo mês de 2008, mas em relação a abril cresceram 6%. "O desempenho ainda está aquém do que era e em junho piorou, porque desde que o governo sinalizou com medidas para incentivar as vendas de bens de capital, os negócios travaram", afirma o presidente da entidade, Luiz Aubert Neto. As empresas do setor, diz, sofrem ainda com a concorrência dos importados, vendidos no país com melhores condições de financiamento - juros de 1,5% a 3% ao ano e com prazos de carência superiores a dois anos. Aubert Neto prevê, para os próximos meses, crescimento na comparação com o mês imediatamente anterior, mas "quedas mais assustadoras" comparadas a 2008, "porque serão comparadas com os meses de vendas recordes do terceiro trimestre".

Para o economista do Itaú Unibanco, Fernando Fenolio, o cenário macroeconômico permite recuperação suave dos investimentos industriais. Conforme dados do BC, em abril as operações com crédito nacional para a indústria somaram R$ 299,2 bilhões, montante similar ao de março (R$ 300,1 bilhões) e 26% superior ao registrado em abril de 2008. Na comparação por trimestre, as operações cresceram 0,58% até abril. As operações com crédito externo somaram R$ 49 bilhões, também semelhante ao resultado de março (R$ 50,2 bilhões) e 19,8% acima do registrado em abril do ano passado. Na comparação trimestral, houve queda de 1,2%.

A melhora no nível de operações está relacionada à retomada do crédito e à redução da taxa anual de juros - que desde setembro caiu 3,6 pontos percentuais, para 10,4% - e do spread (que caiu 1,8 ponto nesse intervalo, para 28,2%). Para o ano, o Itaú Unibanco projeta queda de 12% na formação bruta de capital fixo (no primeiro trimestre a queda foi de 12,6%).

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, que prevê para o ano queda de 8,1% na formação bruta de capital fixo, acredita que uma recuperação mais intensa dependerá de uma mudança na demanda. "O cenário é importante, mas o que vai determinar os investimentos é uma elevação significativa do Nuci. Pode até haver uma antecipação de compras de máquinas com o estímulo tributário que o governo anunciará, mas nem isso será suficiente para garantir uma recuperação", afirma.

O economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, calcula que o nível de utilização da capacidade instalada acima de 81,5% estimula investimentos industriais. Em maio, conforme sondagem da Fundação Getúlio Vargas (FGV), esse indicador estava em 79,2%. Ele estima que até o fim do ano o Nuci chegará a 82,5%, permitindo uma desaceleração na queda do investimento para 7%. "A formação bruta de capital fixo teria que crescer 15% no segundo semestre para fechar o ano com crescimento zero. A recuperação passa no começo por resultados menos negativos e a percepção neste momento é de que o pior ficou para trás", afirma Borges.