Título: Deputados temem que desenlace afete relação do partido com o Planalto
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 03/07/2009, Política, p. A7

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), recebeu apoio do presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), para permanecer no cargo e tomar as medidas administrativas necessárias a que a Casa saia da crise em que se encontra. Temer disse a Sarney que "não seria útil que ele desistisse agora".

A solidariedade de Temer corresponde ao sentimento das principais lideranças pemedebistas na Câmara, entre eles o líder da bancada, Henrique Eduardo Alves (RN). Mas há no partido quem comemore o enfraquecimento de Sarney. É histórica a rivalidade entre as bancadas do PMDB da Câmara e do Senado - esta representada por Sarney e Renan Calheiros (AL), líder e ex-presidente da Casa. Os senadores tinham interlocução privilegiada com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Uma avaliação feita entre deputados do PMDB é que o apoio do PT a Sarney fortalecerá o senador, mas não terá influência sobre a aliança para 2010, que depende do resto do partido. Hoje, a tendência majoritária do PMDB é pelo apoio à candidatura Dilma Rousseff (ministra-chefe da Casa Civil). Mas a formalização da aliança dependerá de acertos locais entre as legendas. E essa relação não será influenciada pelo comportamento do PT em relação a Sarney.

Apesar das diferenças entre as bancadas do PMDB na Câmara e no Senado, não há interesse na derrocada de Sarney, um dos políticos mais importantes do partido. Ele é respeitado pelo papel que desempenhou na transição democrática. Deputados lembram que, sem ele, não teria sido realizada a Assembleia Constituinte de 1988. Além disso, a união do partido aumenta o cacife para 2010. Hoje, Temer é o mais cotado para compor a chapa de Dilma como candidato a vice-presidente.

Se por um lado a queda total de Sarney não interessa à bancada da Câmara, por outro lado sobram críticas à forma como ele tem conduzido a crise do Senado desde o início. Líderes de outros partidos avaliam que o pemedebista deveria ter tomado medidas radicais, com a demissão dos principais responsáveis, quando possível, e abertura de sindicância, quando coubesse.

Comparam com os procedimentos adotados na Câmara, quando surgiram denúncias de uso indevido da verba indenizatória (decidiu-se divulgar os gastos na internet) e de cota de passagens aéreas (Temer cortou 20% e limitou o uso ao deputado e um assessor). Depois, para dar mais transparência, todas as verbas às quais o parlamentar tinha direito (indenizatória, passagem, cota telefônica e cota postal) foram unificadas em um "cotão". A prestação de contas irá para a internet.

Em cerca de 20 dias, a comissão de sindicância que apura a questão das passagens deve concluir os trabalhos. A expectativa é que os envolvidos em irregularidades - deputados ou servidores - sejam punidos. Ao lado dessas medidas, Temer adotou uma interpretação do dispositivo constitucional referente à tramitação das medidas provisórias, que acabou com o constante trancamento de pauta por MPs com prazo de tramitação vencido. A decisão permitiu que 95 projetos fossem votados entre maio e junho.

O Senado, ao contrário, está paralisado. A avaliação feita por lideranças partidárias do PMDB na Câmara é que Sarney está pagando por erros que não são só dele. E que resultam, em parte, da relação de proximidade mantida entre parlamentares e a burocracia do Senado. Alguns a classificam de "burocracia parceira", que não existe na Câmara. Pemedebistas lembram que o DEM sempre fez parte dessa burocracia e, por enquanto, não tem sido alvo de tantas denúncias quanto Sarney.

Outra crítica feita aos hábitos do Senado é o fato de não haver reunião de líderes para discutir medidas - administrativas ou legislativas. Sarney também é visto como "contemporizador demais", o que teria permitido o acúmulo de irregularidades na máquina administrativa.

Apesar do diagnóstico, a aposta entre os deputados do PMDB, do PT e de outros partidos aliados é que, com apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e tomando medidas duras daqui para a frente, Sarney sobreviverá à crise. A não ser que a onda de denúncias continue e surjam fatos mais comprometedores.