Título: Petrobras descarta ser prestadora de serviços
Autor: Schuffner ,Claudia
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2009, Brasil, p. A4

Energia ¿para mudar isso, tem que mudar a lei¿, diz Gabrielli, sobre relacionamento com nova estatal do setor

Claudia Schuffner Do Rio

Apesar de ainda não serem conhecidos todos detalhes do novo marco regulatório do petróleo, que será apresentado por meio de projeto de lei, o presidente da Peterobras, José Sérgio Gabrielli, diz que a empresa não poderá ser uma prestadora de serviços, caso seja criada nova estatal. Ele atribui a uma campanha de empresas que estão fora do pré-sal a dúvida sobra a constitucionalidade da escolha da Petrobras, sem licitação, como sócia da nova estatal. ¿Quanto à questão da constitucionalidade, estamos absolutamente tranqüilos. Mas é uma discussão que vai existir e que é legitima.¿ Gabrielli acha que a simples mudança do modelo, que hoje é de licitação, para a aprtilha não vai elevar o risco de corrupção. ¿Os problemas da transparência e da corrupção não estão associados ao tipo de contrato, mas ao mecanismo de controle, às formas de escolha, às avaliações feitas, ao acompanhamento da sociedade.¿ Acha que o tamanho da Petrobras e sua importância para a economia brasileira incomodam mais a oposição do que o fato de a companhia ser administrada por petistas. A decisão do Congresso de instalar uma CPI para investigar a Petrobras mudou o ritmo de trabalho de Gabrielli, que agora passa dois dias da semana em Brasília. Na sexta-feira, no Rio, onde conversou com o Valor, mostrou-se bem humorado ao comentar noticias sobre supostos desentendimentos dele com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, presidente do conselho de administração da estatal. ¿Temos mais concordância que diferença, e elas nunca envolveram nada no plano pessoal e nem grosserias. Somos, os dois, pessoas de personalidade forte¿. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Valor: A Petrobras está participando das discussões sobre o novo marco regulatório do setor?

José Sergio Gabrielli: Estamos participando no limite do que se refere à Petrobras. Estamos contratando advogados pareceristas para estudar vários aspectos da mudança do novo marco regulatório. Foram contatados para responder a questões que colocamos e nos orientar sobre a partilha, a lei atual e mudanças possíveis.

Valor: Vai ser fácil o Brasil conviver com dois regimes?

Gabrielli: Acho que vai. Não vejo problema de conviver com dois regimes. O pré-sal vai ser definido com base na natureza do reservatório. A nova lei terá que definir o que é pré-sal, que é um reservatório criado antes do sal. Todos os temas estão em discussão ainda. Vai ser uma discussão longa.

Valor: É verdade que a Petrobras poderá ser responsável pela comercialização do petróleo da nova estatal, a Petrosal, seja como commodity ou pelo refino, para o país exportar um produto acabado?

Gabrielli: Não sei se existe esse modelo. São especulações que não me parecem muito lógicas. Até 2020 vamos construir cinco refinarias no país, para processar petróleo da Petrobras. É difícil especular sobre qual vai ser o comportamento da Petrobras para essas áreas não concedidas, se você não tem definido como será a exploração e o desenvolvimento delas. Vai ser um projeto de lei? Se for, dá para saber o que entra, mas não o que sai, isso vai depender do Congresso. Não vamos fazer um plano de investimentos com base em um projeto que sequer está definido.

Valor: A Petrobras desconhece o que está sendo definido?

Gabrielli: Eu não posso falar, porque não há definição até agora. Existem várias versões circulando na imprensa. Há uma situação bem diferente entre as áreas do pré-sal e as outras áreas exploratórias. Portanto, deve ter um novo marco regulatório para as novas áreas. Qual vai ser esse marco? Acho que existem algumas linhas gerais, sem detalhes definidos. Em linhas gerais o Estado vai ter maior parcela, maior gestão dos diversos ativos, vai controlar mais diretamente o ritmo de desenvolvimento das áreas e ter um papel maior na absorção do petróleo gerado. Quanto deve ser um contrato de partilha de produção ou um contrato híbrido. Mas não posso entrar em detalhes porque não tem nada aprovado.

Valor: Até que ponto a CPI poderá afetar as regras para o pré-sal?

Gabrielli: A CPI, diretamente, não vai afetar de forma nenhuma. O que ela pode afetar é o clima do Congresso. E aí, para que direção, eu não sei.

Valor:É possível imaginar que existam pontos de divergência sobre a regulamentação carimbados por partido? Com o PT junto com o PMDB e o PSDB com o DEM?

Gabrielli: Se eles forem coerentes com a experiência histórica anterior dos diversos partidos, acho que vai ter uma divisão entre os que acham que o Estado deve ter papel maior, e os que acham que deve ter papel menor. Deve ter um forte conteúdo partidário, mas não 100%. Um dos elementos chave vai ser exatamente a discussão sobre o tamanho do Estado.

Valor: E o risco de corrupção e superfaturamento nas compras de equipamentos e componentes? Todos os especialistas dizem que a falta de transparência na escolha das sócias do Estado é um facilitador.

Gabrielli: Corrupção é um problema a ser combatido. Não necessariamente partilha significa menor transparência. Isso não é correto. A análise internacional não diz isso. A partilha pode ser tão transparente quanto um processo de concessão. A diferença fundamental da concessão é o retorno ao risco exploratório.

Valor: Vários especialistas afirmam que os sistemas de partilha são mais corruptos. Não concorda?

Gabrielli: Existem corruptos na concessão também. Os problemas de transparência e corrupção não estão associados ao tipo de contrato mas o mecanismo de controle, às formas de escolha, às avaliações feitas, ao acompanhamento de controle, às formas de escolha, às avaliações feitas, ao acompanhamento da sociedade. Não está intrinsecamente, na natureza do contrato, o risco da falta de transparência, da manipulação de informações e da corrupção. Não é isso. Essas questões decorrem da falta de transparência, da falta de controle e de acompanhamento pela sociedade.

Valor: O que acha das avaliações de que seria inconstitucional ceder áreas da nova empresa diretamente para a Petrobras?

Gabrielli: Existem uma campanha, muito sutil ainda, e principalmente das empresas que estão fora do pré-sal, de evitar que o marco regulatório crie dificuldades para elas entrarem. É até legitima essa campanha, dizer que a Petrobras não pode ser escolhida por ser inconstitucional, é um direito que elas têm. Mas nossa visão é que não é verdade. Hoje, o que predomina, pela Constituição brasileira, é o monopólio das reservas pertencendo à União. A exceção é a concessão, a regra é o monopólio.

Valor: Mas esse é mesmo um tema polemico.

Gabrielli: Quanto à questão da constitucionalidade estamos absolutamente tranqüilos. Mas é uma discussão que vai existir e que é legitima.

Valor: Outra questão que se coloca é o espaço que a Petrobras vai ter se não for descoberto mais petróleo fora do pré-sal. Vai ser tornar prestadora de serviços da nova estatal?

Gabrielli: É só ver o que acontecer recentemente no Iraque. Ninguém entrou na licitação que fizeram, com exceção da PB, que já está lá, e da CNPC, da China. O contrato de serviços serve para empresas de serviços, que não querem assumir risco exploratório. Elas querem fazer o seu serviço, receber e ir embora. Isso é legitimo, mas não está na natureza de uma empresa de petróleo como a Petrobras. Além do mais, o objeto social da Petrobras, definido em lei, diz que a Petrobras não presta serviços. Para mudar isso, tem que mudar a lei.

Valor: Não acha eu, ao politizar a Petrobras, o PT fragilizou a empresa, que agora é alvo de uma CPI?

Gabrielli: Estão atacando a Petrobras não porque é PT, mas porque os programas sociais da Petrobras atingem 18 milhões de pessoas, porque ela representa 10% dos investimentos do país, 7% das exportações, representamos 12% da arrecadação federal. Nosso investimento há cinco anos foi de US$ 5 bilhões e estamos investindo este ano US$ 30 bilhões. O investimento cresceu seis vezes em seis anos. Ela está incomodando. Por isso o ataque a ela.

Valor: É a CPI da Petrobras? O senador José Sarney saindo da presidência do Congresso ajuda ou prejudica a Petrobras? A Petrobras precisa do Sarney?

Gabrielli: A CPI existe, provavelmente vai ser instalada. O presidente do Congresso é o presidente do Congresso e a Petrobras não está precisando de ninguém. Estamos nos preparando para responder o que a CPI perguntar. Não há outra alternativa para a Petrobras.