Título: Brecha deixada por Temer, leva à inclusão de contrabandos em MPs
Autor: Galvão,Arnaldo ; Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 07/07/2009, Política, p. A5

Face às últimas oportunidades de emplacar propostas alheias ao conteúdo original das medidas provisórias editadas pelo Executivo, deputados e senadores estão usando a MP 460 e a MP 462 para dar fim à arrastada novela do crédito-prêmio do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e para ressuscitar uma polêmica mudança na legislação ambiental. O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), vetou a inclusão de "emendas-contrabando" nos textos das medidas provisórias, mas a norma valerá apenas a partir da MP 464, que foi editada em 9 de junho.

Apesar de destinada inicialmente a socorrer as prefeituras, por meio de um reforço do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), a MP 462 pode receber uma emenda para isentar de licenciamento prévio obras de recuperação, pavimentação e duplicação de rodovias existentes.

Já a MP 460, que tratava originalmente de desonerações tributárias, propiciou um acordo entre o governo e a oposição para terminar a briga do crédito-prêmio do IPI. Isso significa reconhecer, a favor dos exportadores, uma conta de mais de R$ 288 bilhões. A relatora do projeto de conversão, senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO), revela que a matéria pode ser aprovada nesta semana.

Lúcia Vânia explica que, entre os principais pontos, uma norma limita o reconhecimento dos créditos até 31 de dezembro de 2002. O benefício será apenas para os que levaram seus pedidos à Receita Federal ou ao Judiciário. Não vai haver desembolso por parte do governo, mas um encontro de contas. Os resíduos a favor dos exportadores poderão ser usados em compensações além da data de corte (31 de dezembro de 2002). Créditos não compensados poderão ser convertidos em títulos públicos que serão resgatados, gradualmente, depois de cinco anos. A alíquota para o crédito-prêmio do IPI foi definida em 15% e todas as contestações, administrativas ou judiciais, serão extintas.

A conta, segundo alguns setores da equipe econômica, pode passar dos R$ 288 bilhões se considerada alíquota de 15% no perríodo que vai de 1983 a 2002. O crédito-prêmio do IPI, criado em 1969, dava crédito de 15% sobre o valor de bens vendidos ao exterior para compensar a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

O estímulo seria gradualmente reduzido, por decreto de 1979, até sua extinção em 1983. Atos da administração, publicados depois disso, permitiram intensa contestação que chegou ao Judiciário para que fosse reconhecida a vigência do crédito-prêmio. Em 2004, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o benefício foi extinto em 1990. Mas, em 2008, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), juntou-se ao colega Marco Aurélio Mello para decidir que o incentivo foi extinto em 1983.

De acordo com Lúcia Vânia, o acordo entre setor privado e governo demorou mais de seis meses para ser definido e exigiu muitas reuniões de parlamentares com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, seu secretário executivo, Nelson Machado e o procurador geral da Fazenda Nacional, Luiz Inácio Lucena Adams. Para ela, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), teve papel decisivo.

A votação da MP 460 interessa ao governo porque o texto original prevê várias desonerações e aumenta a carga tributária sobre cigarros. Também remete à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) a arrecadação da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública. A oposição também quer aprovar emendas que beneficiam o setor privado e, portanto, tem de evitar que a MP 460 perca sua eficácia em 12 de agosto.

Outras duas emendas apresentadas no Senado devem ser incorporadas ao parecer de Lúcia Vânia. A primeira define que os depósitos judiciais dos contribuintes beneficiados com o quarto programa de refinanciamento de dívidas federais (Lei 11.941) podem ser levantados depois da redução do valor principal, das multas e juros. A relatora ainda quer ouvir o governo sobre uma emenda, do senador Adelmir Santana (DEM-DF), que permite aos comerciantes cobrar preços diferenciados nas vendas com cartões de crédito.

A tramitação da MP 462 é observada com preocupação pelos ambientalistas porque o relator, Sandro Mabel (PR-GO), está propenso a incluir uma emenda simplificando o processo de licenciamento para rodovias que constam do Plano Nacional de Viação, de 1979. Ele pretende bater o martelo hoje à tarde, em uma reunião com lideranças da Câmara, a inclusão do "contrabando". "É importante para o desenvolvimento do Brasil", disse Mabel. Se não for votada, a MP 462 começa a trancar a pauta de votações. Mabel é do mesmo partido que o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, provável candidato ao governo do Amazonas em 2010. Nascimento e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, entraram em confronto aberto em torno do licenciamento das obras de restauração e asfaltamento de trechos da BR-319 (Manaus-Porto Velho).