Título: Sarney anula atos secretos e alcance da medida gera dúvidas na Mesa
Autor: Agostine , Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 14/07/2009, Política, p. A9

Acuado diante de denúncias de irregularidades, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), anunciou ontem a anulação de 663 atos administrativos secretos. A decisão, tomada às vésperas da instalação do Conselho de Ética, entretanto, gerou polêmica e dúvidas entre servidores e senadores e foi classificada como uma "atitude política". Nem mesmo o consultor legislativo designado para esclarecer os efeitos administrativos da anulação sabia explicar se os funcionários nomeados por atos secretos continuarão a trabalhar a partir de hoje ou como será a devolução de recursos desviados.

A anulação dos atos secretos foi uma recomendação do Ministério Público Federal e abrange todos os atos não publicados nos últimos 14 anos. O anúncio foi recebido com surpresa por senadores e funcionários do Senado. Sarney não consultou a Mesa Diretora, que estava acompanhando a análise das centenas de atos secretos, em comissão criada por Heráclio Fortes (DEM-PI), primeiro-secretário. Para o senador do DEM - que continuou a defender Sarney mesmo quando seu partido pediu o afastamento -, o pemedebista deveria ter consultado a Mesa para tomar a decisão. Até semana passada, Heráclito dizia que "99% dos atos não poderiam ser anulados", por se tratarem de nomeações e exonerações.

Sarney esclareceu que todos os atos secretos perderão validade com a publicação da medida assinada por ele ontem. Ao ser perguntado sobre se os atos secretos seriam cancelados devido à medida assinada, Sarney respondeu: "Claro, o ato é nulo." O presidente do Senado também garantiu que todos os servidores nomeados por atos secretos serão exonerados "a partir da publicação" da medida assinada ontem.

Todos os atos não publicados foram anulados, sem nenhuma triagem. A denúncia de existência dos atos foi feita há cerca de dois meses. A decisão de Sarney surpreendeu até mesmo a advocacia do Senado. O consultor legislativo Bruno Dantas, indicado pela direção da Casa para explicar a anulação, não sabia explicar seus efeitos administrativos. O diretor-geral, Haroldo Tajra, não quis se pronunciar.

A direção-geral do Senado terá um mês para analisar todos os atos secretos e definir como será feita a contratação de funcionários nomeados por meio desses atos e a devolução de recursos usados indevidamente. O anúncio foi feito um dia antes da instalação do Conselho de Ética, previsto para hoje, assim como o início da CPI da Petrobras. O PMDB, que não havia indicado seus integrantes para o conselho, escalou a " tropa de choque " ligada ao líder do partido, Renan Calheiros (AL) para defender Sarney: Wellington Salgado (MG), Almeida Lima (SE), Gilvam Borges (AP) e Paulo Duque (RJ) como titulares; Valdir Raupp (RO), Romero Jucá (RR), Gerson Camata (ES) e Mão Santa (PI) como suplentes.

A avaliação de senadores da base governista, até mesmo os mais próximos de Sarney, é que a situação do presidente do Senado complicou-se com a denúncia que a Fundação Sarney, em São Luis (MA), teria desviado recursos provenientes de patrocínio da Petrobras para empresas fantasmas. Em plenário e em nota, o presidente do Senado disse que não tinha responsabilidade administrativa sobre a fundação. Sarney é presidente de honra e presidente vitalício da fundação e o estatuto da entidade que ele tem responsabilidade financeira. Se for confirmado que mentiu, ele poderá ser julgado pelos senadores por quebra de decoro parlamentar e poderá até mesmo ser cassado.

O governo, ao contrário, avalia que a crise do Senado está "instalada, mas em processo de superação". Esta foi a definição dada ontem pelo ministro da coordenação política, José Múcio Monteiro, durante pausa da reunião ministerial realizada na Granja do Torto. Segundo Múcio, Lula elogiou a decisão de anular os 663 atos secretos editados ao longo dos últimos anos. "O Senado fez o que toda a sociedade esperava dele neste momento", afirmou Múcio.

Perante os demais colegas de Esplanada, Múcio e o ministro da comunicação social, Franklin Martins fizeram um breve relato aos ministros da base aliada no Congresso . Ele garantiu que, durante o encontro, não foram discutidas as pressões pelo licenciamento do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). (Colaborou Paulo de Tarso Lyra).