Título: Aneel deve mudar o atual modelo de revisão tarifária
Autor: Leila Coimbra
Fonte: Valor Econômico, 11/03/2005, Brasil, p. A3

Os questionamentos das concessionárias de energia com relação aos seus índices de reajuste de tarifas deverão levar a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a reavaliar a metodologia de revisão tarifária atualmente empregada. A mudança do atual modelo foi sugerida pelo diretor-geral da Aneel, Jerson Kelman, ontem em seminário em São Paulo. Ele disse que a "agência é pouco experiente" neste quesito - afinal esta é a primeira rodada de revisões tarifárias, feitas a cada quatro anos após a privatização da companhia - e que a fórmula atualmente utilizada, de empregar os números de uma empresa-modelo como base, "causa uma certa inquietude" aos executivos do setor. Segundo Kelman, a reavaliação do modelo de revisão tarifária não afetará o atual ciclo de revisões e só trará diferenças no próximo ciclo, que começa em 2007. Neste ano, porém, Kelman disse que pretende transformar todas as bases de remuneração de ativos, que ainda estão provisórias, em definitivas. Com o precedente aberto pela mudança na base de remuneração tarifária da distribuidora carioca Light, recentemente, algumas empresas de distribuição de energia começaram um movimento de questionamentos à agência reguladora. O Grupo Rede, por exemplo, que controla oito concessionárias de distribuição no país, dentre elas a Celpa (PA) e a e Cemat (MT), não concordou com os números definidos em suas revisões. A empresa deverá encaminhar nos próximos dias um recurso administrativo à agência reguladora contestando os resultados. Hoje, a diretoria da Aneel se reúne extraordinariamente para decidir o adiamento da revisão tarifária da Celpe (PE), que também está causando dor de cabeça à Aneel e ao governo. A distribuidora tem como data-base de reajuste o próximo 30 de março, mas pede o adiamento da decisão para 30 de abril. Em relatório divulgado pela Aneel em seu site, a agência afirma que cálculos preliminares apontam um reajuste de 38% à concessionária. O pleito inicial da Celpe era um número de proporções ainda maiores: 56,78%. Mas a própria concessionária observou que o impacto de um reajuste desse porte poderia ser desastroso, em vez de benéfico: daria margem a contestações judiciais e também provocaria um aumento descontrolado da inadimplência e dos furtos de energia. O índice chegou a 38% por causa de um contrato de compra da energia produzida pela térmica Termopernambuco, que começou a valer no início deste ano. A distribuidora abandonou um contrato de compra de energia de R$ 62,8 o MWh em média, de geradoras hidrelétricas, para passar a adquirir energia da térmica a R$ 137,30 o MWh. Com a troca, a aumentará suas despesas em R$ 254,5 milhões por ano. Não fosse esse contrato, o reajuste da Celpe seria de 14,35%, segundo cálculos da Aneel. A Termopernambuco e a Celpe são controladas pelo mesmo grupo: a Neoenergia (associação entre Previ, Iberdrola e Banco do Brasil Investimentos). Esses contratos entre subsidiárias, chamados de "self-dealing" (auto-suprimento), foram proibidos no novo modelo do setor elétrico. Mas os contratos já assinados não puderam ser quebrados. Fontes do setor elétrico, que preferem não ser identificadas, dizem que o governo proibiu que a Aneel concedesse à Celpe um reajuste superior a 25%. Para tentar baixar o índice, a ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, teria pedido à diretoria da Petrobras uma renegociação do preço do gás fornecido à usina, como meio de minimizar o seu impacto no índice de correção tarifária. O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Maurício Tolmasquim, negou qualquer interferência do governo nas revisões tarifárias. "É uma atribuição da agência reguladora", afirmou. Quanto a uma possível onda de contestações das empresas sobre seus reajustes, Tolmasquim disse que "as concessionárias têm o direito de contestarem o que quiserem". Já o diretor-geral da Aneel admite que o governo "tem certas preocupações com os índices de reajustes dos preços regulados". Mas ele também nega qualquer interferência do governo nas questões de competência da Aneel.