Título: Nos cursos do Senai, uma experiência bem-sucedida
Autor: Simone Biehler Mateos
Fonte: Valor Econômico, 11/03/2005, Valor Especial, p. F4

A ausência de mão-de-obra especializada na região foi um problema que custou caro à Daimler-Chrysler quando a empresa instalou sua fábrica de caminhões em Juiz de Fora (MG), em 1996. A indústria investiu quase US$ 25 milhões na qualificação dos novos funcionários: mais de 200 tiveram de ser enviados para treinamento na Alemanha e, na volta, multiplicavam o aprendizado dando aula para centenas de outros numa mini-planta industrial montada só para isso. Tudo ficou muito mais simples a partir de 2000, quando, para atender às necessidades da Daimler e seus fornecedores, o Senai montou na região uma unidade focada na formação de mão-de-obra para a indústria automobilística. Embora a unidade do Senai seja quase auto-suficiente financeiramente, os custos da empresa com formação despencaram e as sinergias do processo se multiplicaram. Centenas de pessoas que já passaram pelos cursos técnicos de nível médio dessa unidade do Senai e quase 200 funcionários da Daimler e alguns do parque de fornecedores já fizeram o curso de pós-graduação latu sensu, um curso de um ano de especialização em gestão de produção na área automobilística. Em abril, a primeira turma - de 35 pessoas - concluirá o mestrado na área, oferecido em parceria entre a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o Senai. Sem contar os 80 alunos da graduação, criada no ano passado para formar, em três anos, tecnólogos em produção automobilística. A maioria dos professores do curso de especialização é formada por engenheiros que são funcionários da Daimler. "Isso resultou não só num curso sintonizado com a realidade da fábrica como em melhoria na performance profissional dos gerentes e supervisores que lecionam. De tanto estudar para dar aula de gestão, eles acabaram sendo os que mais inovam e melhoram a gestão das suas áreas", conta Newton Ricardo Lino, supervisor da área de estratégia de Recursos Humanos da empresa. Todo o pessoal administrativo da empresa e vários do parque de fornecedores já fez o curso de especialização do Senai e muitos estão sendo estimulados a fazer o mestrado para tornarem-se professores de novas turmas. Mais recentemente, o Senai local passou a oferecer também uma graduação, com duração de três anos, que forma tecnólogos em produção automobilística. Mas a Daimler-Chrysler é só um exemplo dentre as centenas de empresas beneficiadas pelos cursos superiores do Senai. Embora o objetivo prioritário da instituição seja a aprendizagem industrial e qualificação profissional básica a jovens e adultos, desde 1987, passou a oferecer também cursos de nível superior para suprir necessidades da indústria que não eram atendidas por outras instituições de ensino superior. O primeiro curso superior do Senai foi criado no seu Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil (Cetiqt), do Rio de Janeiro. Hoje, 20 departamentos regionais do Senai oferecem cursos superiores, seis por ações próprias e 14 em parceria com universidades. Em 2003, a instituição tinha 863 alunos na graduação (a maioria de curta duração, para formar tecnólogos), 45 em mestrados e 1.117 em pós-graduações latu sensu, conhecidas como especializações - 950 em cursos presenciais e 167 em modalidades a distância. Ao todo são 35 cursos de graduação, 63 especializações e três mestrados, englobando áreas tão diversas como automação, direito ambiental, gestão (estratégica, de produção, de qualidade, de tecnologia, de marketing, etc), engenharia de software, tecnologia de gás, logística da produção, etc em 22 setores industriais diferentes. "Atuar em educação superior foi decisão estratégica do Senai para atender à demanda das indústrias por gente com formação tecnológica", frisa Alberto Borges de Araújo, do Senai nacional. Além da formação de nível superior, desde a década de 80, o Senai também atua intensamente em duas áreas próprias das universidades: desenvolve atividades de extensão e pesquisa aplicada, sempre em sintonia com as necessidades da indústria. Para isso, nos últimos 20 anos, com a colaboração de instituições similares da Alemanha, Japão, EUA, Canadá, França e Itália, o Senai criou vários centros de ensino para pesquisa aplicada, cada um deles dirigido a determinado segmento industrial. Além de laboratórios para pesquisa e ensino, esses centros contam com 69 laboratórios de ensaio credenciados pelo Inmetro, pela Anvisa ou outras autoridades responsáveis por emitir certificados ou licenciamentos de empresas e produtos. Estes centros trabalham em 317 projetos diferentes de pesquisa aplicada, tendo registrado já 15 patentes. O primeiro deles foi o Cetiqt, hoje o maior centro de tecnologia têxtil da América Latina e um dos maiores do mundo. Sua infra-estrutura inclui instalações- piloto e os laboratórios necessários ao aprendizado, à especialização e à pesquisa na área têxtil e de confecções. Além de cursos técnicos, o Cetiqt oferece uma das poucas graduações em engenharia industrial têxtil do país, complementada por um programa de estágio dirigido (o Fortex), que leva pequenos grupos de alunos, a partir do sexto semestre, para dentro das fábricas, para realizar diagnóstico de problemas de determinadas áreas e sugerir soluções. "As áreas que serão avaliadas pelos alunos são escolhidas conjuntamente por professores, alunos e empresa, buscando compatibilizar o interesse acadêmico com o da fábrica", diz Daniel Roedel, diretor de educação e tecnologia do Cetiqt. A Indústria Têxtil Cedro, que tem 133 anos de existência, é uma das que está se beneficiando com o Fortex. "Nossos gerentes estão se reunindo com os alunos do programa para fazer o diagnóstico. Vemos que é gente preparada, por isso temos muita expectativa de que os projetos que eles vão elaborar resultarão em melhorias em vários processos produtivos", diz Antonio Gonçalves Rosa, assistente de recursos humanos da Cedro. Com mais de três mil empregados espalhados em cinco plantas fabris, a empresa recruta egressos do Cetiqt há anos, tendo ficado especialmente satisfeita com a criação do curso de engenheiro industrial têxtil. "Os engenheiros sem formação específica exigem que invistamos muito mais tempo em treinamento, com engenheiros têxteis tudo fica mais fácil e os do Cetiqt chegam prontos, são sempre os que têm a melhor performance nos nossos testes de seleção", diz Rosa. (S.M.)