Título: Empresários estranham a ausência do setor privado
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 11/03/2005, Valor Especial, p. F7

Nos 100 artigos do anteprojeto de Lei de Educação Superior, a palavra "empresa" não aparece uma única vez. A ausência do termo que remete à idéia de interação entre universidade e empresa foi uma das maiores críticas dos participantes do seminário "A Indústria e a Reforma da Educação Superior", realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) com apoio do jornal Valor Econômico. "Esta é uma das grandes lacunas do documento que, além de não explicar como as universidades deverão conduzir suas pesquisas, não diz como este anteprojeto vai se relacionar com a Lei de Inovação", critica Carlos Roberto Rocha Cavalcante, superintendente do Instituto Euvaldo Lodi, da CNI. A falta de conexão entre a Lei de Inovação e o projeto da educação é, para muitos, mau começo para uma reforma que visa acelerar o desenvolvimento do país. Mas esta questão não foi a única a ganhar destaque no seminário. Sobre o artigo que sugere o descredenciamento das fundações das universidades federais, a opinião geral foi pela manutenção das fundações, um canal fundamental de relação entre empresa e universidade. "As fundações, que são uma válvula de escape, estão sendo desautorizadas", reclamou Ernesto Heinzelmann, presidente da Embraco, para quem o texto não contém nenhum facilitador da relação empresa/universidade, nem esclarece questões importantes como a de cooperação internacional. Pela ótica da indústria, o texto foi considerado inócuo pela falta de agressividade em buscar não só a cooperação entre universidade e empresa, como também parcerias internacionais. O governo também foi acusado de dificultar os esforços em torno dos trabalhos referentes à inovação. Em sua exposição, Heinzelmann lembrou que o relacionamento empresa/universidade é positivo para ambas. "Se as empresas buscam novas aplicações, agregar valor aos seus produtos e processos e formar profissionais altamente qualificados, as universidades querem, via parceria, gerar conhecimentos, buscar recursos financeiros para pesquisas, executar pesquisas e publicá-las", disse o presidente da Embraco, que há 23 anos faz contratos de parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), resultando em 80 projetos e 150 artigos publicados. Do lado acadêmico, Carlos Henrique Brito Cruz, reitor da Unicamp, defendeu que o projeto valorize o relacionamento entre empresa e universidade, "já que este é um importante canal de relacionamento." Representantes da indústria e das universidades concordaram quanto à importância da integração entre as instituições e as empresas. E destacaram a importância de a universidade formar recursos humanos qualificados para o setor produtivo local e a inclusão de representantes da indústria nos conselhos consultivos das instituições de ensino superior. Com um conselho formado por associações, sindicatos e profissionais de diferentes setores, Roberto Nicolsky, diretor-geral da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec), disse acreditar que as universidades conseguiriam ter acesso a informações como as principais demandas do mercado. Por isso, muitas empresas também defendem a flexiblização dos currículos para atender necessidades específicas de mão-de-obra. A disseminação da cultura de empreendedorismo nas universidades também foi intensamente debatida, assim como a importância de se ampliar as visitas de universitários aos ambientes corporativos, o aumento do número de doutores dentro das empresas e de executivos dentro das universidades, além da necessidade de estágios mais eficazes. O fato de a palavra empresa ter ficado fora do documento e os prejuízos que esta omissão pode causar preocupou tanto os reitores quanto os empresários. Outro item também deixado de lado no anteprojeto, na opinião dos participantes do seminário, diz respeito ao papel da universidade na pequena e média empresas, já que as grandes teriam dinheiro e capacidade suficiente para caminhar sozinhas. A iniciativa privada defendeu que a universidade tenha como foco, além de educação e formação de recursos humanos, a pesquisa, o desenvolvimento e o fortalecimento da demanda do setor produtivo da indústria. Mas o interesse na ampliação da parceria entre empresas e universidades não se dá só nas corporações. As instituições de ensino também vêem resultados sadios nesta relação. Segundo o padre Jesus Hortal Sanchez, reitor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), a realização de pesquisas casadas entre a universidade e empresa gera professores empenhados em importantes pesquisas, laboratórios atualizados e retorno financeiro. Para Sanchez, as parcerias também funcionam como ação de marketing para atrair novos alunos e formar profissionais preparados para atender determinadas demandas e gerar conhecimento para o mercado.