Título: Gustavo Franco é contra mudança brusca na lei
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2005, Finanças, p. C1

O ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco é contra mudanças "revolucionárias", no Congresso, para extinguir a exigência de cobertura cambial para as exportações - a exigência de que, nas vendas ao exterior, os dólares sejam trazidos ao país e vendidos no mercado de câmbio. Também não vê com bons olhos a conta em dólares para exportadores. "Não gosto dessa idéia de ter mais uma classe de cidadãos - os exportadores -, que tem o privilégio de ter conta em dólar, e os outros não." Para Franco, o ideal seria, ao longo do tempo, "uma morte natural" da regra de cobertura cambial. Mas ele prefere que isso seja feito devagar, por meio de pequenas medidas no âmbito do BC e do Conselho Monetário Nacional (CMN) - como, aliás, toda a liberação cambial ocorrida desde a década de 1980. Há dez dias, exemplificou, o BC ampliou para 210 dias o prazo de internalização de dólares das exportações; quando esse prazo chegar a 720 dias, assinala, a cobertura cambial estaria extinta na prática. "Se há uma regra que está funcionando, é muito melhor aperfeiçoá-la de forma incremental, na direção correta, em vez de correr o risco de ter uma mudança revolucionária, que acaba não sendo prudente," diz Franco, que fez um minucioso estudo sobre a desregulamentação da conta de capitais, junto com o ex-diretor do BC Demósthenes Madureira Pinho Neto. Franco lembra que o decreto que criou a cobertura cambial para as exportações tem várias implicações. Na ótica do ex-presidente do BC, é por este decreto - juntamente com regras do CMN e BC - que se exerce, de fato, o controle cambial no país. Sua eliminação criaria um vácuo, com repercussões difíceis de medir. Nele, por exemplo, estão definidos conceitos fundamentais, como o de sonegação de cobertura, que é o nome usado na legislação para subfaturamento de exportação; e de cobertura em excesso, que é o superfaturamento de importação. Eliminado o conceito de cobertura cambial, argumenta Franco, outras esferas de governo - entre elas a Receita - terão de preencher essa lacuna. Outro ponto relevante, diz, é que a cobertura cambial forma a base do atual sistema de financiamento exportação - as operações de Adiantamento de Contratos de Câmbio (ACC) e de Adiantamento sobre Cambiais Entregues (ACE). Os bancos no exterior oferecem linhas interbancárias aos seus pares brasileiros para financiar esse sistema. Sem a cobertura cambial, afirma Franco, os grandes exportadores irão buscar diretamente financiamentos em bancos no exterior. "Seria destruída a demanda por ACCs", diz. Neste caso, quem perderia seriam as pequenas empresas, que não têm acesso a financiamentos no exterior. Outro problema, afirma, é que no modelo atual o saldo positivo no balanço de pagamentos reforça as reservas internacionais. Teoricamente, esse indicador poderia ser substituído por um outro, os ativos brasileiros em dólar, que incluem os depósitos de exportadores. O difícil, diz Franco, será mudar uma cultura arraigada entre investidores e agências de rating, que insistem em acompanhar as reservas. "Não será fácil mudarem seus conceitos." (AR)