Título: BNDES quer que investimento externo traga mais tecnologia
Autor: Vera Saavedra Durão
Fonte: Valor Econômico, 17/03/2005, Brasil, p. A10

O diretor de Planejamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Antonio Barros de Castro, advertiu que apesar de todos os benefícios que traz, o investimento estrangeiro pode promover "retrocesso tecnológico", como pode ocorrer com o setor de aço no Brasil. Barros de Castro participou do seminário sobre investimento estrangeiro no Brasil promovido pela Comissão Econômica para a América Latina (Cepal). Apesar de ser favorável ao pólo siderúrgico do Maranhão, que vai causar mudança "explosiva" geograficamente, Castro criticou o fato de as três usinas serem projetadas para produzir placas, pois como fabricantes de semiacabados elas não negociam tecnologia, "ficam passivas na placa", como disse. Esse tipo de investimento pode atuar como um "impeditivo de rota tecnológica" do setor siderúrgico nacional, alertou. A questão das rotas tecnológicas vem sendo discutida no BNDES e, segundo ele, foram levantadas em estudo ainda inédito da Cepal com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O estudo levanta as rotas alternativas em vários setores. Castro admite que o assunto é complexo e tem de ser negociado com os vários atores dos projetos de investimento, inclusive com órgãos de financiamento, como o banco. Para ele, esse trabalho alerta para o fato de que não se pode mais fazer especialização setorial, "tem de ser produto embasado em estratégia". Esse é o caso da siderurgia, que segundo revelou, já vem apresentado retrocessos. Entre os anos 90 e o ano passado, as usinas brasileiras encolheram sua participação na produção mundial do mercado de aço plano acabado de 5% para 1%. Essa queda, observou, não diz respeito à média dos tipos de aço produzidos no país, pois a fabricação de aços longos e de placas aumentou. A seu ver, a siderurgia pode ter um futuro promissor no Brasil. Ainda no âmbito da siderurgia, Castro adiantou que já existe no país, e prontos, pelo menos dois novos processos inovadores para produção de aço não plano. Um foi desenvolvido pela PUC/RJ há mais de 10 anos e já está passando da fase de protótipo para a de projetos a serem aprovados com interesse pelo BNDES. O outro protótipo foi desenvolvido pela Embrapa, capaz de promover uma redução dramática de custos, pois dispensa a coqueificação. O seminário de lançamento do relatório de Investimento Estrangeiro na América Latina e no Caribe, promovido pela Cepal, apoiado pelo Valor, tratou do que o diretor do BNDES considera o maior desafio na relação com as poderosas transnacionais: "Saber como se colocar diante desses seres, pois as experiências podem ser de êxito ou de fracasso." O relatório, ao falar do Brasil, constata que a abertura comercial ocorrida no país nos anos 90 obrigou as empresas estrangeiras que estão no país a modernizarem-se e a destinarem uma parcela maior de sua produção ao mercado externo, destacando que as multinacionais de produtos tecnologicamente mais complexos começaram a explorar os mercados de exportação. O Brasil hoje precisa fomentar uma transição de estratégias corporativas de busca de mercados para as de busca de eficiência, o que contribuiria para fortalecer as bases produtivas do país, diz o documento. Para Mônica Baer, da MB Associados, o grande desafio ao investimento estrangeiro direto no Brasil hoje é o setor de serviços. O Censo de Capital Estrangeiro do Banco Central revelou que em 1995 a indústria respondia por 67% desse investimento, porcentagem reduzida a 34% no ano 2000, enquanto os investimentos no setor de serviços passaram de 31% para 64% no período. Mônica destacou o interesse dos estrangeiros em investir em infra-estrutura, com destaque para saneamento e energia, mas considerou que "nós ainda não resolvemos o problema do modelo de investimento, da política tarifária". Ele ainda defendeu regras estáveis para investir. Antonio Correia Lacerda, da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), disse que o Brasil está se consolidando como a segunda opção entre os emergentes para o investimento estrangeiro direto, depois da China, e defendeu a ampliação de investimentos de melhor qualidade. Ele pregou a necessidade de aumentar a taxa de investimento para 25% do PIB (hoje responde por 10% da formação bruta de capital fixo do país). E apontou o câmbio como a "questão chave" para atrair investidores estrangeiros. "Não podemos sucumbir à tentação da valorização artificial do real, pois podemos reverter os ajustes virtuosos nas contas externas", alertou. Antonio Maciel, presidente da Ford, criticou os custos tributários e falou do sucesso da reestruturação da empresa no Brasil, baseado em novos produtos, em novas bases tecnológicas, treinamento de mão-de-obra e confiança na engenharia nacional.