Título: Câmara da Bolívia aprova lei que prejudica Petrobras
Autor: Agências internacionais
Fonte: Valor Econômico, 17/03/2005, Internacional, p. A13

A Câmara dos Deputados da Bolívia aprovou uma nova Lei de Hidrocarbonetos que pode levar as empresas a cortar ainda mais os investimentos a até inviabilizar a exploração de gás no país. A Petrobras é a principal empresa no setor e a maior da Bolívia, respondendo hoje por quase 20% do PIB do país. Horas antes da aprovação, o presidente Carlos Mesa pediu ao Congresso a antecipação para agosto das eleições presidenciais, previstas para 2007, como forma de romper a paralisia política. Mesa, que quase renunciou na semana passada, fez o pedido após ficar claro que o projeto de Lei de Hidrocarbonetos seria modificado à sua revelia. Ele denunciou ainda os protestos da oposição, que anteontem paralisaram as estradas do país. "A Bolívia está no caminho do suicídio coletivo", disse. "Não posso mais governar assim." O texto aprovado pela Câmara não tinha sido divulgado oficialmente até a noite de ontem, mas segundo relatos ele estabelece royalties de 18% e impostos de 32% sobre o gás boliviano explorado por multinacionais (como queria Mesa), mas com aplicação imediata e sem deduções e compensações tributárias. A versão apoiada pelo presidente, e considerada aceitável pelas empresas, previa a elevação progressiva da carga tributária total, hoje em 35%, para 50%. Com isso, as empresas teriam tempo para retomar os investimentos (paralisados há quase dois anos), ampliar a produção (hoje estagnada) e a produtividade. Isso permitiria a absorção gradual de uma carga tributária maior. Segundo o Valor apurou, a receita líquida das empresas hoje apenas bastaria para pagar o aumento imediato dos impostos. O projeto de lei ainda precisa passar pelo Senado, onde pode sofrer emendas (nesse caso, voltaria à Câmara). Mesa ameaçou vetar a lei como ela está, mas o Congresso pode derrubar o veto. O deputado Evo Morales, líder do Movimento ao Socialismo (MAS, segunda maior força no Congresso) e o principal articulador dos bloqueios de estradas, queria fixar os royalties em 50%, mas teve algumas de suas reivindicações aprovadas. "Não é uma vitória, mas, em sua maioria, nos pontos centrais, o povo boliviano saiu ganhador", disse. Segundo ele, a proposta aprovada na Câmara "garante uma receita de US$ 600 milhões/ano, menos que os US$ 750 milhões de nossa fórmula, mas muito mais do que os US$ 105 milhões da [proposta] do governo". Quanto à antecipação das eleições, analistas acreditam que é mais uma jogada política do presidente para tentar aglutinar uma base de apoio que permita a ele governar. Mesa disse estar bloqueado no Congresso e na Procuradoria, e que as estradas estão bloqueadas, o que o impedia de governar. A Constituição boliviana não prevê a antecipação de eleições nessas circunstâncias, mas já houve precedente de o Congresso autorizar. "Queremos que ele fique", disse Morales, o principal líder indígena do país e candidato derrotado nas eleições presidenciais de 2002. "Nós, junto com membros de outros partidos, achamos que a antecipação é inconstitucional." Para analistas, é pouco provável que o Congresso aceite antecipar as eleições pois isso implicaria reduzir o mandato dos congressitas. A aprovação da Lei de Hidrocarbonetos na Câmara deve criar uma trégua, ainda que breve, entre o presidente e a oposição. "Decidimos suspender os bloqueios de estradas enquanto a lei é apreciada pelo Senado. Mas, nesse meio tempo, vamos nos preparar protestos mais sérios. E, da próxima vez, vamos bloquear as estradas em todo o país", disse Roberto de la Cruz, um dos líderes dos manifestantes. A Petrobras diz que está acompanhando de perto a situação, mas que só se pronunciará quando houver uma decisão definitiva sobre a Lei de Hidrocarbonetos.