Título: Sob pressão dos governadores, Senado deve rejeitar mudanças na PEC paralela
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 18/03/2005, Política, p. A7

Atendendo aos apelos de governadores, o Senado deverá rejeitar as principais alterações introduzidas pela Câmara na chamada PEC paralela da Previdência - a proposta de emenda constitucional que flexibiliza as regras de aposentadorias e pensões de servidores públicos. Os governadores alertam que as mudanças, especialmente o privilégio concedido a delegados de polícia, procuradores e auditores fiscais para que tenham o direito de receber salários idênticos aos de desembargadores de Justiça, vai desequilibrar as políticas de ajuste fiscal e contenção do déficit previdenciário nos Estados. No texto original elaborado no Senado, essas carreiras não tinham tal privilégio, pois seus salários e aposentadorias não poderiam ultrapassar o subsídio do governador de Estado. O desembargador, pela lei, tem o direito de receber até 90,25% do subsídio de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), hoje fixado em R$ 19,1 mil. Além de o salário ser mais alto que os rendimentos nos Executivos estaduais, o problema adicional é que o subsídio dos ministros do Supremo pode ser reajustado para R$ 21,5 mil neste ano e R$ 24,5 mil em 2006. Já há, no governo e na oposição, senadores defendendo abertamente a supressão das mudanças adicionadas ao texto da PEC paralela pelos deputados. Na Câmara, o texto final foi aprovado por acordo entre todos os partidos políticos, do qual participaram os aliados do governo. "O que foi aprovado aqui na Câmara é de uma irresponsabilidade enorme, pois pode dificultar muito a situação dos Estados. A base aliada fez demagogia e o PT não teve como ficar sozinho contra esses privilégios. Estamos ainda numa fase de adaptação, ainda confusa, com as mudanças na presidência da Câmara", tentou justificar um petista da cúpula, que preferiu o anonimato. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), sinalizou claramente a resistência ao texto da Câmara. "Nós fizemos no Senado um exaustivo acordo, negociado com governadores. O compromisso que assumimos, inclusive com a oposição, é de votar a PEC paralela originada no Senado. A Câmara introduziu novos temas que não fizeram parte desse acordo com governadores e com a oposição", argumentou Mercadante. O líder do governo salientou que vai analisar as mudanças introduzidas na Câmara e está aberto a negociações, mas deixou claro que é sensível aos clamores dos governadores. "A Previdência Social hoje é o grande buraco das contas públicas no país. Vamos reanalisar as mudanças, pois não podemos votar uma coisa sem saber qual é o impacto fiscal disso", ressaltou o líder do governo. O governador de Minas Gerais, Aécio Neves, já fez um apelo, nesta semana, aos colegas do PSDB. Pediu que retomem no Senado o texto original da PEC paralela. A assessoria do governador informou ao Valor, ontem, que ainda não foram concluídos os estudos de impacto fiscal com as mudanças feitas na Câmara. Em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin também já solicitou a elaboração de estudos para calcular o impacto. "O governador Aécio nos manifestou perplexidade com o que foi votado na Câmara, pois o impacto nos Estados será forte. A maneira como a Câmara beneficiou algumas categorias de servidores públicos nos preocupa. É um problema que a Câmara manda para o Senado", resumiu o presidente nacional do PSDB, senador Eduardo Azeredo (MG). Segundo ele, certamente os governadores começam a partir de agora a trabalhar para convencer o Senado a derrubar as mudanças. "O governo, na Câmara, rompeu o acordo com os governadores. Deixaram a coisa lá correr solta", disse Azeredo. A avaliação dos oposicionistas e governistas é que os governadores foram surpreendidos pelo presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, que colocou a PEC paralela na pauta sem fazer alarde. Desta forma, com a votação relâmpago, não houve tempo de mobilização. Outro governador que já colocou o bloco na rua foi Eduardo Braga (PPS), do Amazonas. Ele esteve ontem no Senado e já iniciou a pressão sobre os parlamentares. "Essas alterações aprovadas na Câmara causarão impactos bastante expressivos e, portanto, precisam ser revistas no Senado", disse Braga. O governador informou que tem, hoje, um salário de R$ 17 mil bruto, enquanto os delegados de polícia recebem R$ 12 mil no Estado. Se prevalecer a regra da Câmara, os servidores poderiam ter os vencimentos elevados para R$ 19 mil. "Todos os Estados estão fazendo um esforço enorme para reduzir os déficits previdenciários. É claro que haverá uma gigantesca mobilização dessas categorias pela elevação de salários", acrescentou o governador do Amazonas.