Título: PT deflagra guerra pelo governo de SP
Autor: César Felício e Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2005, Política, p. A9

Além de atravancar a reforma ministerial, a disputa pela candidatura petista ao governo estadual começa a colocar o campo majoritário que controla o partido em São Paulo à beira do esfacelamento. Lutando por espaços na estrutura partidária, os pré-candidatos Aloizio Mercadante, Marta Suplicy e João Paulo Cunha devem trazer para a escolha do novo diretório estadual, este ano, a competição marcada para as prévias de 2006. Formalmente eqüidistante, o atual presidente estadual Paulo Frateschi tenta convencer apoiadores dos três a adiar o confronto e pode não se reeleger, mesmo já tendo recebido diretamente de Mercadante e de João Paulo garantias de apoio. O controle do diretório estadual é estratégico para a definição da candidatura e da realização ou não das prévias. A direção local poderá sugerir alternativas ao processo de prévias entre todos os filiados, cujo resultado ficou imprevisível depois do crescimento do partido. Na eleição direta de 2001, 47 mil petistas compareceram para votar no Estado. Este ano, depois do recadastramento, há 190 mil petistas habilitados. Frateschi levanta a hipótese de um processo de seleção dos candidatos por meio de pesquisas de opinião, combinado com consulta aos possíveis aliados e a um seleto grupo de lideranças petistas. Quer ganhar tempo e só fazer esta definição no próximo ano, o que interessa mais a Marta e a João Paulo do que a Mercadante. "O cenário não está posto. Não sabemos quais são os aliados de Lula, os adversários, o que fará o governador Geraldo Alckmin. Porque deflagrar a guerra agora?", indagou o dirigente, acreditando que a disputa poderá fazer com que as alas radicais do partido avancem. "O campo majoritário é forte quando não se divide". Será difícil, entretanto, cumprir este cronograma. "Há uma contradição entre o interesse da atual direção em ter o apoio de todos os pré-candidatos e a ocupação de espaços pelas três correntes dentro do partido. Estão todos testando suas forças",comenta o prefeito de Guarulhos, Elói Pietá, um aliado de Mercadante. Líder do governo no Senado, Mercadante tem o apoio do alto clero do partido mas a repercussão desse apoio na base de militantes é uma incógnita. Também há dúvidas sobre seu desempenho nas pesquisas em relação ao de Marta. As pesquisas internas do partido mostram o senador à frente da prefeita, mas sem uma vantagem acachapante. "No PT, o resultado de uma prévia se constrói pela influência das lideranças em todos os níveis, mas é evidente que estas lideranças também procuram se sintonizar com suas bases", afirmou Pietá. Os aliados de Mercadante trabalham ativamente para que o evento não ocorra. O senador já anunciou que irá trabalhar pelo que chama de "compromisso de união" entre os adversários para que se busque uma alternativa. A ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy conta com um patrimônio eleitoral na capital do Estado, formado pela memória da campanha do ano passado. "É a única com uma administração para mostrar", argumenta o deputado estadual Cândido Vaccarezza, seu aliado. Também beneficia a ex-prefeita as filiações maciças ao partido nas áreas mais pobres da capital, redutos tradicionais do PT. A capital conta com 76,8 mil filiados aptos, ou 40,4% do total. A região do ABC, segundo maior colégio eleitoral do partido, representa 12,9% e Campinas, o terceiro, 7,4%. A ex-prefeita, entretanto, não tem bases no interior. Os adversários tentarão argumentar que a presença de seu ex-marido, Eduardo Suplicy, na chapa como candidato à reeleição ao Senado não será bem recebida pelo eleitor. É ameaçada ainda pela ação do seu sucessor, o tucano José Serra. O prefeito expõe ao máximo as dificuldades administrativas que encontrou ao assumir . "O Serra destrói a Marta um pouco a cada dia", comentou um aliado de João Paulo. É deste desgaste, que ameaça envolver a ex-prefeita com infrações à Lei de Responsabilidade Fiscal, que o grupo de Mercadante pretende se valer contra a prefeita em um processo interno. Integrantes do grupo martista admitem que ainda não conseguem medir como a imagem da prefeita está sendo afetada pelas acusações. Acreditam que na capital o problema tende a ficar sob controle, já que a prefeitura poderá exibir suas realizações. Em razão da disputa eleitoral do ano passado, só agora Marta começa a percorrer as cidades estratégicas de São Paulo. Mercadante e João Paulo Cunha já o fizeram em 2004. " O noticiário dá a entender que ela está antecipando o processo, quando na verdade está entrando por último", disse o deputado estadual e aliado da ex-prefeita, Cândido Vaccarezza. O parlamentar teme o comportamento dos recém-filiados na sigla e afirma também preferir uma solução sem prévias. Os apoiadores de Marta acreditam que uma definição mais tardia do candidato beneficia Marta, já que sua rejeição insuflada por Serra tenderia a cair. " Tem que ser o mais perto possível do próximo ano, porque a avaliação da imagem dela ainda está muito contaminada pela gestão passada", disse o vereador Antonio Donato, um martista do diretório estadual. Ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha também foi presidente estadual e coordenador eleitoral do partido. É quem tem o maior conhecimento dos prefeitos de cidades menores e vereadores petistas e quem mais aposta na realização das prévias. Sua maior base, Osasco, soma 6,7% dos habilitados. Mas não tem densidade eleitoral e poderá ser convencido a sair da disputa, caso se torne coordenador político do governo. Taticamente, o grupo de João Paulo aproxima-se de Marta na intenção de evitar a discussão eleitoral este ano . Ambos acusam os defensores de Mercadante de forçarem uma definição agora, algo que o senador rebate. A função de líder do governo no Senado o tolheria para a pré-campanha. Como Frateschi está abrindo espaço para que Marta faça campanha no interior do Estado, os aliados da ex-prefeita estão dispostos a apoiar a sua reeleição, mas irão lançar candidato caso o grupo de Mercadante também o faça ou percebam que o dirigente estaria descumprindo seu propósito de manter-se imparcial. No ano passado, houve atritos entre os aliados da ex-prefeita e o comando da sigla em São Paulo. Frateschi trabalhou contra a presença de Rui Falcão como candidato a vice na chapa de Marta, porque queria entregar o cargo a alguém do PMDB. Na ala de Mercadante, o nome cogitado para substituir Frateschi em caso de disputa é o de Elói Pietá, mas o prefeito de Guarulhos garante que a possibilidade não existe. "Sou prefeito de uma grande cidade e não terei condições de cuidar de um partido que vive um processo de escolha de candidaturas", diz. Dentro do grupo de Marta, quem aparece como opção é Vaccarezza, que também diz não ter interesse pelo cargo. A eleição para a escolha das direções dos diretórios nacional, estadual, municipal e zonais será em setembro e as chapas terão que estar inscritas até maio para a direção nacional e junho para a estadual. A prévia eleitoral poderia ocorrer entre o final deste ano até abril de 2006.