Título: O pacote de Annan para mudar a ONU
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2005, Internacional, p. A11

O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Kofi Annan, anuncia hoje um pacote de medidas para reformar e fortalecer a instituição. Num relatório de 62 páginas, Annan propõe a ampliação do Conselho de Segurança e mudanças na Comissão de Direitos Humanos. Ele espera que suas recomendações sejam acatadas na Assembléia Geral de setembro. O pacote de Annan, de 62 páginas, está sendo considerado o mais ambicioso já proposto para a ONU desde a sua criação, em 1945, mas sua aprovação não está garantida. A proposta de ampliação do Conselho de Segurança, dos atuais 15 para 24 membros, por exemplo, já vem sendo discutida há anos. A questão é delicada e requer que a Carta da ONU seja emendada - para isso, é necessária a aprovação de dois terços dos 191 membros da Assembléia Geral, incluindo-se os cinco membros permanentes do atual Conselho (Estados Unidos, Inglaterra, França, China e Rússia ), e a ratificação por parte dos parlamentos nacionais. Há dois modelos na mesa da ONU para o Conselho ampliado. O primeiro prevê que dos nove membros "novos", apenas seis seriam permanentes e sem direito a veto. O segundo modelo manteria os cinco membros permanentes atuais, e mais nove temporários, que se somariam aos atuais dez membros temporários. Dos nove, oito teriam mandato de quatro anos, com direito a reeleição. O primeiro modelo, que parece contar com mais apoio dentre os países membros da ONU, é visto com simpatia por Brasil, Alemanha, Índia e Japão. Mas estes quatro rejeitam a idéia de não dispor do direito ao veto. As outras duas vagas caberiam à África e a disputa, nesse caso, é travada por África do Sul, Egito, Quênia e Nigéria. O secretário-geral não aponta o modelo de sua preferência, mas diz aos países membros que façam sua opção antes da Assembléia Geral da ONU, em setembro. Annan também propõe que a ONU seja mantida como o centro de decisões para ações globais envolvendo questões de segurança - uma tentativa de evitar futuros constrangimentos como o imposto pelo presidente George W. Bush, que decidiu invadir o Iraque em 2003 sem o sinal verde da ONU. O relatório, de 62 páginas, recomenda um acordo em torno de regras comuns para o uso de força e de ações preventivas, e novas medidas para bloquear a proliferação de armas nucleares. Annan também sugere a criação de um corpo para ajudar países a recuperar-se de guerras e pede aos países ricos que contribuam com 0,7% de sua renda bruta nacional para programas de ajuda ao desenvolvimento. Apenas seis países enviam à ONU recursos dessa monta para esse fim, embora essa determinação tenha sido feita em 2000, quando foram estabelecidas metas de combate à pobreza mundial até 2015 . O relatório de Annan traz uma inovação importante: a Comissão de Direitos Humanos, que reúne 53 países, deveria encolher e ser transformada num conselho a ser eleito diretamente pela Assembléia Geral. O processo atual de seleção, por grupos regionais, dá assento a países com políticas questionáveis como Sudão e Cuba. Annan foi eleito secretário-geral da ONU há oito anos, com o apoio dos EUA. Tem mais dois pela frente. O pacote a ser anunciado hoje pode ser sua última chance de completar o mandato como o grande reformador da ONU.