Título: Equipe econômica de Bush não é o forte do governo
Autor: The Economist
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2005, Internacional, p. A11

O presidente dos Estados Unidos (EUA) tem uma agenda econômica relativamente ambiciosa para seu segundo mandato. Os objetivos de George W. Bush incluem rever a política tributária, reformar o sistema de Seguridade Social, reduzir à metade o déficit fiscal e aprovar novos acordos comerciais. Entretanto, exatamente a quem caberá fazer tudo isso? Em tese, a equipe econômica de Bush é comandada por John Snow. O presidente esteve a ponto de demitir seu secretário do Tesouro no fim do ano passado; depois recuou da decisão, mas apenas, aparentemente, para manter Snow como um caixeiro viajante incumbido de vender seu plano de reforma da Previdência. O ex-executivo ferroviário recentemente visitou conhecidíssimos centros financeiros mundiais, como San Antonio, Albuquerque e Nova Orleans. Ao próprio Tesouro parece faltar tanto pessoal como influência junto ao governo. Isso poderia ser desculpável se a política econômica fosse comandada por uma equipe profissional na Casa Branca. Mas o que há é um déficit de economistas, especialmente próximos a Bush. No comando do Conselho Econômico Nacional está Allan Hubbard, um velho amigo do presidente, mas trata-se de um empresário de Indiana, e não homem afeito a questões de política econômica. O mesmo se aplica ao vice-chefe de Gabinete responsável por política econômica: Karl Rove pode ser um gênio político, mas ele não é conhecido por seu domínio das minúcias da política fiscal. Na semana passada, Bush finalmente nomeou um novo negociador comercial em substituição a Robert Zoellick, que foi para o Departamento de Estado. Rob Portman, respeitado deputado republicano, será um bom vendedor da agenda comercial de Bush no Congresso, mas não sabemos como será seu desempenho ao negociar acordos comerciais internacionais. Bush indicou Paul Wolfowitz para a presidência do Banco Mundial. A transferência do arqui-neoconservador do Pentágono ainda poderá provar-se uma decisão sábia, mas é difícil justificá-la em termos de expertise econômica. Indiscutivelmente, Bush prefere homens de negócios e crentes verdadeiros a gente do mundo acadêmico e de Wall Street. É difícil afirmar que economistas sejam garantia de sucesso. Mesmo assim, Bush está, sem dúvida, assumindo riscos - especialmente se acontecer algum tipo de crise econômica. Consideremos, por exemplo, o Tesouro. No governo Clinton, particularmente sob a liderança de Robert Rubin e, depois, de Larry Summers, o Tesouro dominou outros ministérios. Hoje, é um dos mais fracos. O primeiro secretário do Tesouro de Bush, Paul O´Neill, entendia de política econômica, mas era muito ousado e independente para ter a simpatia de seu patrão e dos mercados. Snow tem perfil mais comedido, mas ele tem recebe pouca informação para a definição da política econômica. Cerca de um terço dos principais cargos no Tesouro estão vagos ou ocupados interinamente. O Tesouro parece particularmente fraco em especialistas em política tributária. Depois que a comissão do governo que analisa a questão tributária formular suas sugestões de reforma, quem as converterá em propostas legislativas claras? No primeiro mandato, Bush buscou boa dose de orientação no presidente de seu Conselho de Assessores Econômicos, Glenn Hubbard (nenhum parentesco com Allan). Glenn deixou o cargo em 2003. Seu sucessor, Greg Mankiw, outro excelente economista, foi fritado e saiu, depois de comentários corretos, ainda que politicamente infelizes, sobre os benefícios da terceirização no exterior. O sucessor de Mankiw, pelo menos nos próximos meses, é Harvey Rosen, um reconhecido especialista em finanças públicas, mas que não é do círculo íntimo de Bush. O real poder sobre questões econômicas na Casa Branca está com Allan Hubbard (é consenso que ele é um coordenador eficaz) e Rove. Há duas fortes suspeitas sobre como Bush enxerga as questões de política econômica. A primeira é que, para ele, trata-se predominantemente de como "vender o peixe". Demonstrando admirável fé nos mercados, o presidente parece julgar que a política econômica basicamente vai andar sozinha; necessário seria apenas um pouco de espírito marqueteiro para vender as reformas. Daí o entusiasmo da Casa Branca por Carlos Gutierrez, o novo secretário de Comércio, que construiu sua fortuna vendendo cereais matinais na Kellogg. A segunda é que lealdade é mais importante que conhecimento. Foi esse o problema com O´Neill: ele disse que mais cortes de impostos eram má idéia. Larry Lindsey, o primeiro presidente do Conselho Econômico Nacional de Bush, foi descartado após emitir a afirmação politicamente incorreta (embora acurada) de que a guerra no Iraque custaria US$ 200 bilhões. Infelizmente, os mercados não funcionam tão harmoniosamente. O que faria a equipe de Bush se ocorresse alguma crise econômica internacional, como um colapso do dólar? O principal especialista internacional no Tesouro, John Taylor, não causou boa impressão. Seu substituto deve ser Tim Adams, chefe da campanha Bush-Cheney e, antes disso, chefe de gabinete de Snow. Na Casa Branca, há ainda menos gente que entenda de economia internacional. Numa crise, Bush provavelmente acabaria se apoiando em duas pessoas. A primeira é Zoellick, que além de ter sido negociador comercial também trabalhou no Tesouro. O outro é Alan Greenspan, o presidente do Federal Reserve (o Fed, banco central dos EUA) e única autoridade econômica respeitada no mercado. Fred Bergsten, do Instituto de Economia Internacional, diz que já houve um precedente para isso. No início dos anos 80, o presidente Ronald Reagan recorreu a Paul Volcker, do Fed, e a Jacques de Larosière, do FMI, para administrar a crise da dívida mexicana. O problema é que as relações do FMI com Bush não estão tão amistosas; e seu manda-chuva, Rodrigo Rato, não tem a estatura de Larosière. Em outras palavras, tudo recairia sobre Greenspan. Mas o presidente do Fed deve deixar o cargo no início do ano que vem. Há três favoritos para substituí-lo: Glenn Hubbard, bastante respeitado mas ainda visto como especialista em questões fiscais, e não monetárias; Ben Bernanke, ex-professor de economia de Princeton e hoje diretor do Fed; e Martin Feldstein, especialista fiscal de Harvard que comandou o Conselho de Assessores Econômicos na era Reagan. Nenhum deles tem experiência recente em lidar com crises financeiras. Isso também já foi verdade para Greenspan, que conquistou suas medalhas no combate ao colapso das bolsas em 1987. Mas, considerando sua falta de peso no governo, os riscos são agora certamente maiores. Bush precisa cruzar os dedos para que nada dê errado.