Título: Efeito maré e economia
Autor: Ives Gandra
Fonte: Valor Econômico, 28/03/2005, Empresas &, p. B2

O Brasil cresceu, em 2004, 5,2%. Em 2003, o crescimento foi de 0,5%. A Argentina cresceu 9,2% em 2004 e 8%, em 2003. Quase todos os países emergentes cresceram mais que o Brasil. "The Economist" mostra que, nos últimos 10 anos, a China cresceu 8,61%, Índia 6%, a Rússia 2,94% e o Brasil apenas 2,4%. Ou seja, das quatro "baleias" emergentes, foi o que menos cresceu. E, mesmo em 2004, a China cresceu 9,5%, Índia 6,5% e Rússia 7,1%, o que vale dizer que todos estão à frente do Brasil. Além disso, mesmo admitindo uma média de 5% ao ano, para os próximos 10 anos, deveremos ficar atrás do México, com menor população, mas com crescimento maior, em face de ainda hoje (2004) exportar o dobro do Brasil. Embora todos os organismos internacionais elogiem o Brasil, o certo é que alertam, também, para o fato de que o alto endividamento, a alta carga tributária, os juros elevados e o peso do Estado, tornam a nação ainda bastante vulnerável, para o futuro. Os analistas, todavia, já prevêem um crescimento menor para 2005. Um exame frio dos fatos e dos dados não me permite compartilhar da euforia dos governantes. Em primeiro lugar, por força do "efeito maré", o Brasil cresce, como todos os países emergentes crescem e crescem mais. A economia mundial ainda vive um momento excepcional de pujança, o que permite às nações subdesenvolvidas colocar "pontas de estoque" nos países desenvolvidos. Mas, já há nuvens no horizonte que preocupam os analistas. Ciclicamente, alternam-se, na economia internacional, momentos de "boom", com momentos de menor pujança e até de retração. O mundo vive agora um "boom" muito semelhante àquele de 67 a 72, com o que as nações avançam, inclusive os países desenvolvidos, que crescem menos que os países emergentes, mas crescem excepcionalmente em face do tamanho de seu PIB.

Brasil cresce menos do que os outros emergentes

Teme-se, todavia, como sempre ocorre após um "boom econômico", que o mundo possa desenvolver-se menos, em 2005, do que em 2004, com o que haverá redução do crescimento brasileiro que, curiosamente, não trouxe sensível aumento do emprego, nem melhoria de renda, em 2004. Houve, menor evolução social e emprego, do que foi o crescimento da economia como um todo. O que, efetivamente, me preocupa, é o que o governo federal, em vez de se aprofundar no exame das causas pelas quais a economia brasileira cresceu menos que a dos outros países para atalhá-las, resolva ficar soltando fogos de comemoração, como se todos os problemas do País estivessem resolvidos e a sua política econômica não merecesse reparos. No mar da economia, o Brasil é um barco mais pesado que o das demais economias emergentes e, por esta razão, o "efeito maré" faz com que ande com menor velocidade do que os demais. No dia, todavia, em que a "maré" diminuir ou ficar turbulenta, terminará encalhando ou afundando primeiro do que os outros, pois não há nenhuma preocupação de eliminar o lastro pesado de suas insuficiências - ou seja, excesso de juros, excesso de tributos, excesso de gastos públicos, excesso de clientelismo político, excesso de encargos trabalhistas, excesso de intervencionismo governamental, excesso de burocracia e escassez de eficiência. As amarras da economia são tão grandes, que o menor "espirro" da economia mundial poderá segurar o crescimento nacional. Por esta razão, o Brasil continua tão vulnerável, no mundo atual. Pessoalmente, gostaria que o governo aproveitasse o crescimento nacional para fazer a lição de casa, reduzindo juros e tributos, enxugando a esclerosada máquina administrativa, preferindo a seleção mediante concursos públicos à contratação de correligionários e, principalmente, não permitindo que os encargos sociais sejam o principal estimulador da informalidade. Se, todavia, optar por medidas que venham a piorar o quadro, aumentando juros, tributos e encargos sociais, mantendo a esclerosada máquina administrativa e continuando a empregar mais correligionários e amigos do que gente competente, e substituir, nas Universidades, o critério de mérito pelo assistencialismo, dificilmente o país ganhará o "status" mundial que todos os brasileiros gostariam. Vi, mais com preocupação do que com euforia, os dados de 2004 e ficaria mais tranqüilo se o governo tivesse o bom senso e a humildade de comparar o nosso crescimento com o dos demais países emergentes de igual tamanho.