Título: Dirceu acumula derrotas com o desfecho da reforma ministerial
Autor: Raymundo Costa,Cristiano Romero e Taciana Collet
Fonte: Valor Econômico, 24/03/2005, Política, p. A6

Muito embora a feição da Esplanada dos Ministérios não tenha mudado, o PT e em particular o ministro José Dirceu sentiram-se os grandes derrotados da reforma ministerial que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva negociou, negociou e não fez. Perdeu também o ex-presidente do Senado José Sarney (AP), mas o PMDB avalia que ele e a filha Roseana Sarney (PFL-MA) teriam ficado mais expostos se Lula tivesse feito a reforma sem dar uma Pasta à senadora. Enquanto era negociada a reforma com os partidos, Dirceu parecia ter recuperado o prestígio e a coordenação política do governo. O ministro esteve no centro das principais negociações. No fim, quando Lula anunciou que encerrara as conversas, Dirceu ficou desolado. A amigos, confidenciou que se sentia desmoralizado e que ficara numa situação complicada. Chegou até a dizer que deixaria de fazer articulações política, o que ninguém no PT acredita. Dirceu negociou diretamente a entrega de um ministério ao PP e a entrada de Roseana no governo. As duas articulações falharam, muito embora diga-se no Planalto que Lula não pretende deixar Sarney magoado e, por isso, mais adiante deverá chamar Roseana. O difícil é o presidente ainda dar um ministério ao PP. Mas a derrota que mais complicou a situação de Dirceu foi a manutenção de Aldo Rebelo na Coordenação Política. O desenho do chefe da Casa Civil previa a nomeação do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha, um fiel aliado, para o lugar de Aldo, combinada com a designação do deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) para líder na Câmara. Na hipótese de não ir para o Planalto, João Paulo seria o líder. Lula designou Chinaglia, mas não nomeou João Paulo. Lula quer Dirceu operando só a máquina de governo, o que, aliás, deixou claro na reunião ministerial de ontem, quando disse a todos os ministros que o ministro continuará cuidando das ações do governo. "Não tenho nenhuma dúvida de que ele (Aldo) é o coordenador político do governo", disse o presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ). O esforço do PT para retomar a Coordenação Política chegou a reunir os principais ministros da sigla numa reunião secreta na casa de Dirceu. De início, o grupo integrado por Dirceu, Luiz Gushiken (Comunicação de Governo), Luiz Dulci (Secretaria Geral) e Antonio Palocci (Fazenda) permaneceu unido na defesa da tese de que o PT deveria retomar o lugar de Aldo. No fim, ao perceber que a reforma complicava, Palocci decidiu concentrar suas energias na nomeação do deputado Paulo Bernardo para o Planejamento. Foi mais uma vitória de Palocci sobre Dirceu, que se esforçava para Lula nomear - em aliança com José Genoino, presidente do partido - o deputado Jorge Bittar, candidato derrotado do PT às eleições do Rio de Janeiro. Ontem, Dirceu disse a Paulo Bernardo que sempre apoiou o seu nome. "Lula trocou seis por meia dúzia. O Rio está subrepresentado no governo e pleiteava Bittar para o Planejamento, mas Palocci queria alguém ultra-conservador para auxiliá-lo e insitiu em Paulo Bernardo", criticou Chico Alencar (PT-RJ). Há cerca de um mês, Dirceu comentou com outro ministro que, fora da articulação política, o que queria mesmo era ser nomeado para um ministério-fim, como o da Saúde. O problema seria Lula, que não abre mão de tê-lo na coordenação dos assuntos de governo. Surpreendido com a reviravolta de Lula na reforma, o PT se encolheu. A avaliação da cúpula é que o presidente expôs o partido, cuja imagem foi contaminada pelas cenas de fisiologismo explícito das negociações. Genoino andou se queixando nos bastidores. Mas é pouco provável que a sigla, refeita do susto, volte à mesa disposta a ceder espaços de poder quando Lula retomar as conversas sobre as alianças. O presidente ainda tem um contencioso para resolver com o PMDB: a nomeação de Roseana. Embora tenha assimilado o golpe por não ter havido reforma, Sarney não gostou da forma como Roseana foi exposta. E culpa Aloizio Mercadante (PT-SP), um dos emissários do Planalto nas negociações. A margem de segurança da maioria governista no Senado é pequena. Nas conversas com a cúpula do PMDB, Lula sinalizou que vai resolver essa e outras demandas do partido. Lula, por exemplo, teria considerado "excelente" a conversa que teve com o presidente do PMDB, deputado Michel Temer. O Planalto tenta também atrair os deputados Eliseu Padilha (RS) e Geddel Vieira Lima (BA), da oposição e ligados ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e Lula já pediu para Dirceu marcar uma "conversa política" com o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB). Nos cálculos do Planalto, reduzindo o tamanho da oposição no PMDB será possível negociar com o PP em outras bases. O grupo oposicionista do PMDB soma cerca de 43 dos 90 deputados da bancada. Desses, 27 seguem a orientação do ex-governador Anthony Garotinho. Mesmo essa ala a cúpula governista não dá como perdida. Garotinho disse à sigla que só será candidato a presidente por um grande partido, com capilaridade nacional. Ou seja, se o PMDB lhe fechar as portas, pode se compor e tentar uma vaga no Senado.