Título: O Conselho Nacional de Combate à Pirataria
Autor: André de Almeida
Fonte: Valor Econômico, 24/03/2005, Legislação & Tributos, p. E2

Os festejados trabalhos da CPI da Pirataria - investigação parlamentar levada a cabo pelo Legislativo brasileiro para debater, discutir e investigar as causas da contrafação, evasão fiscal e descaminho no mercado nacional, práticas que comumente se convencionou chamar de pirataria - finalizaram em agosto de 2004 com a mais completa análise pública sobre a questão. Críticas do setor privado, comentários dos órgãos de fiscalização de estradas, fronteiras, portos e aeroportos e relatos de autoridades fiscais e da Fazenda permitiram que a CPI da Pirataria resumisse seu trabalho em um extenso relatório. Uma das mais relevantes sugestões do órgão de inquérito parlamentar foi justamente a criação de um órgão ligado à administração pública direta, com a participação do Poder Executivo, Legislativo e da sociedade civil organizada, que se incumbiria de estudar, propor e traçar políticas públicas de combate à pirataria no Brasil. Tal sugestão chocou frontalmente com a postura que até então o Poder Executivo tinha sobre a matéria, por anos tratando a questão da pirataria como um problema empresarial a ser combatido unicamente pelas empresas vítimas, negando implicitamente (e muitas vezes até explicitamente) a existência de interesse público. Aceitando as sugestões da CPI da Pirataria, o governo federal, em 14 de outubro de 2004, fez publicar o Decreto nº 5.224, que criou o Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual, órgão colegiado consultivo, integrante da estrutura básica do Ministério da Justiça, que tem por finalidade elaborar as diretrizes para a formulação e proposição de um plano nacional para o combate à pirataria, à sonegação fiscal dela decorrente e aos delitos contra a propriedade intelectual. Apesar de o Decreto nº 5.224 expressamente citar o gênero "propriedade intelectual" em seu título, o parágrafo único de seu artigo 1º limita as ações do conselho ao definir pirataria como sendo apenas a violação aos direitos autorais de que tratam as Leis nº 9.609 e 9.610, ambas de 19 de fevereiro de 1998. Criou-se assim, de início, uma dúvida acerca da competência do conselho: se limitado a dirimir questões relativas a direito autoral ou se apto para discutir temas relacionados a todos os direitos protegidos pela legislação de propriedade intelectual, como marcas e patentes. Como órgão consultivo, integrante da estrutura básica do Ministério da Justiça, o Conselho Nacional de Combate à Pirataria tem por escopo, sucintamente: (1) estudar e propor medidas e ações destinadas ao enfrentamento da pirataria e combate a delitos contra a propriedade intelectual no país; (2) criar e manter banco de dados a partir das informações coletadas em âmbito nacional, integrado ao Sistema Único de Segurança Pública; e (3) efetuar levantamentos estatísticos com o objetivo de estabelecer mecanismos eficazes de prevenção e repressão da pirataria e de delitos contra a propriedade intelectual. Compõe o Conselho Nacional de Combate à Pirataria integrantes de diversos membros da administração pública direta, como o Ministério da Justiça, o Ministério da Fazenda e a Polícia Federal, bem como representantes da Câmara dos Deputados, do Senado e da sociedade civil. Muitos planos e esperança são esperados dos trabalhos do conselho e muita responsabilidade é depositada em cada um dos participantes, dentre os quais o humilde subscritor. De qualquer forma, em um Estado que por anos negligenciou o problema da pirataria, deixando o poder privado à deriva, talvez até mais relevante que os emanamentos do conselho é a admissão tácita de que pirataria se combate com ações e esforços públicos e privados, e que o beneficiário da melhoria será toda da sociedade, e não somente o setor vitimado. No presente cenário, a existência do debate é tão importante quanto o resultado deste.