Título: Fiscalização pesa menos na criação de novos empregos
Autor: Raquel Salgado
Fonte: Valor Econômico, 30/03/2005, Brasil, p. A6

Pela primeira vez nos últimos nove anos, os empregos formais criados no país resultaram mais da abertura efetiva de postos de trabalho do que da fiscalização do governo. No ano passado, o saldo final entre admitidos e demitidos, descontados os efeitos da fiscalização, chegou a 814,3 mil, acima das 708,9 mil vagas formais originadas a partir da ação do governo, que faz com que empresas com trabalhadores sem carteira formalizem os vínculos de emprego. Esse total de vagas formais superou em 703 mil o resultado do ano anterior, quando sem os efeitos da fiscalização foram criados apenas 111 mil postos. A participação total dos empregos gerados sem a ação do governo atingiu 53,5% do saldo entre admitidos e demitidos, que ficou em 1,523 milhão em 2004. É o maior percentual da série histórica do Cadastro de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho (MTE), com início em 1992. Em 2003, por exemplo, ano em que a geração de empregos com carteira assinada chegou a 645 mil, a participação dos postos abertos sem o efeito da fiscalização sobre o total ficou em apenas 17,2%. Isso significa que o crescimento de mais de 136% no saldo de trabalhadores entre 2003 e o ano passado não derivou somente de uma maior abrangência e eficiência da fiscalização federal, mas principalmente da efetiva abertura de postos de trabalho. Em 2004, foram admitidos com carteira assinada mais de 11,2 milhões de pessoas. Com a exclusão das vagas via fiscalização, essa quantidade de trabalhadores segue alta, na casa dos 10,6 milhões. Ao mesmo tempo, o número de desligados chegou a 9,8 milhões de trabalhadores. Na avaliação de Fábio Romão, economista da LCA Consultores que analisou os dados do Caged para o Valor, a partir dessas informações é possível concluir que o desempenho do mercado de trabalho foi mais dinâmico do que se pensava. "O governo intensificou a fiscalização, mas a parcela disso no saldo de empregos não foi tão forte como muitos pensavam, pois desde 2000 os números de vagas formais criadas por meio desse instrumento giram acima de 500 mil ao ano. O que fez a diferença foram os postos realmente novos", enfatizou Romão. Apesar da menor contribuição da fiscalização no saldo de empregos, na comparação com anos anteriores, os dados deixam claro que o governo atuou com mais rigor no ano passado. O número de empregos vindos da fiscalização ficou 32,7% acima do resultado de 2003. O fato de que 6,3% das admissões no ano passado foram feitas através da ação dos fiscais também evidencia maior eficiência do governo no controle do trabalho informal no país. Nos quatro anos anteriores, esse percentual era inferior e variou entre 5% e 5,7%. O que se viu em 2004 foi uma menor dependência do saldo entre admitidos e demitidos do efeito da fiscalização. No ano de 1996, por exemplo, houve uma redução superior a 271 mil postos formais. Se não fosse a ação do governo para fazer com que empresas passassem a contratar seus funcionários pelas regras da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), esse déficit chegaria a quase 540 mil empregos, uma vez que só a fiscalização gerou mais de 268 mil postos de trabalho formalizados. Os dados do início deste ano indicam que a formalização do emprego segue crescendo. A pesquisa mensal de emprego (PME) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referente ao mês de fevereiro, revelou incremento no número de pessoas contratadas com carteira assinada no setor privado. Foram mais 117 mil trabalhadores nessas condições em todo o país. Em fevereiro do ano passado, os trabalhadores com carteira representavam 39,6% da população ocupada. No mesmo mês de 2005, essa participação chegou a 40,4%, o maior percentual evidenciado pela pesquisa desde fevereiro de 2003, quando a participação era de 40,9%. Na comparação com janeiro deste ano, a variação foi de 1,5%. Em relação a fevereiro de 2004, a elevação foi ainda maior e chegou a 5,9%. Ao mesmo tempo, os empregados sem carteira assinada no setor privado equivaliam a 15,7% da população total ocupada em fevereiro. Esse percentual é 3,5% menor sobre janeiro de 2005 e 5,7% maior sobre o mesmo mês do ano passado. O economista da LCA comenta que é raro, na comparação anual, o emprego formal crescer acima da vaga sem carteira assinada, exatamente o que ocorreu mês passado.