Título: Cresce dívida nos fundos constitucionais
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 30/03/2005, Agronegócios, p. B14

O Tesouro Nacional terá que reconhecer, nos próximos meses, um "esqueleto" de até R$ 6,8 bilhões em débitos atrasados dos fundos constitucionais de financiamento do Norte (FNO), Nordeste (FNE) e Centro-Oeste (FCO) desde 1989. Somadas as agroindústrias, a atividade rural absorve mais da metade dos desembolsos dos três fundos, e também é responsável por grande parte da inadimplência observada. Uma portaria conjunta dos ministérios da Fazenda e da Integração Nacional, publicada em 17 de março, determinou aos bancos gestores dos fundos a obrigatoriedade de contabilizar todas as operações de risco compartilhado vencidas há mais de 360 dias como prejuízo nos balanços dos fundos. De 1998 a 2003, o Tesouro repassou R$ 13,5 bilhões aos três fundos criados pela Constituição de 1988. Até setembro de 2004, foram mais R$ 2,584 bilhões. Esses recursos vêm de 3% da arrecadação do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), sendo administrados pela Integração em parceria com Banco da Amazônia (no caso do FNO), Banco do Nordeste (FNE) e Banco do Brasil (FCO). A nova regra do governo também determina o provisionamento, nos balanços dos fundos, de parcelas e encargos vencidos há mais de 180 dias. O BB provisionava esses créditos em atraso desde 1999. Basa e BNB faziam isso na parcela de risco próprio, mas não no risco compartilhado e integral dos fundos. O reconhecimento dessas dívidas reduzirá o patrimônio líquido (PL) e os ativos totais dos fundos constitucionais, mas, segundo o governo, não impactará os desembolsos para este ano. "Aumentaremos os recursos disponíveis dos fundos e pagaremos menos taxas de administração aos bancos", diz Roberto Albuquerque, diretor de Gestão dos Fundos do Ministério da Integração. Hoje, os fundos pagam 3% ao ano sobre seus PLs, limitado a 20% dos repasses do Tesouro. O PL do FNE soma R$ 18,5 bilhões; no FNO, são outros R$ 5,8 bilhões, e no FCO, R$ 5,3 bilhões. "Embora traga impactos ao Tesouro e ao superávit primário, é uma medida saneadora", afirma Albuquerque. "Esses valores não seriam recebidos mesmo. E ainda daremos uma sobrevida aos empreendimentos". A carteira total de empréstimos soma R$ 14,4 bilhões no FNE, R$ 6,1 bilhões no FNO e R$ 5,4 bilhões no FCO. A inadimplência da carteira está em 36% no Nordeste, 21% no Norte e 3,2% no Centro-Oeste. Até novembro de 1998, o risco dos empréstimos era só dos fundos. Depois disso, os bancos passaram a bancar metade do risco, ganhando 3% ao ano, ou assumiram todo o risco, abocanhando 6% de taxa de administração. Pela nova norma, os bancos poderão "devolver" os 50% do seu risco aos fundos. Eles terão que retornar operações assumidas com risco integral ou parcial, lançadas como prejuízo, em até dois dias úteis após a baixa contábil. Para os bancos, diz Albuquerque, a perda de receita será baixa. Os bancos têm em caixa R$ 3,7 bilhões dos fundos sob a rubrica "disponível". Sobre isso, têm de pagar taxa equivalente a 95,5% da Selic como remuneração aos fundos. Os três fundos têm dívida total de R$ 6,8 bilhões. A maior está no FNE e somava, até 1998, R$ 4,8 bilhões em operações atrasadas. No Norte, são R$ 1,41 bilhão em débitos. O FCO tem outros R$ 170 milhões. O gerente de Fundos Constitucionais, Divino da Costa Vaz, estima que até 90% desses valores serão contabilizados como prejuízo. No fundo do Nordeste, 20% dos recursos aplicados no setor rural estão em atraso - são R$ 2,95 bilhões. Na região, 56% das dívidas do FNE são rurais. O FNO registra R$ 992 milhões em débitos rurais atrasados - 16,2% dos desembolsos efetivos para o setor estão vencidos. O Centro-Oeste contabiliza 3,4% de atrasos na carteira rural, mas tem R$ 137 milhões (81% do total) em dívidas vencidas. Os empréstimos via fundos constitucionais têm aumentado nos últimos anos. De 2002 a 2004, houve salto 147%, de R$ 2,3 bilhões para R$ 5,68 bilhões. Em 2004, foram contratados 85% dos R$ 6,697 bilhões de orçamento total para o ano. Aplicou-se R$ 3,2 bilhões no FNE, R$ 1,321 bilhão no FNO e R$ 1,172 bilhão no FCO. Em 2004, até setembro, a atividade rural concentrou 47% do total desembolsado (R$ 1,547 bilhão). O setor industrial, com destaque para a agroindústria, levou 27%.