Título: Governo põe fim à tutela do FMI
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2005, Finanças, p. C1

O governo brasileiro comunicou ontem ao Fundo Monetário Internacional (FMI) que não vai renovar o acordo de ajuda financeira que expira no final deste mês. A decisão põe fim ao programa que começou em 1998 e, após sucessivas prorrogações, já durava mais de seis anos. Com o encerramento da tutela do Fundo, o compromisso do governo com a disciplina fiscal será expresso pela fixação de metas quadrimestrais de superávit primário para todo o setor público, anunciou o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Ele reafirmou que para 225 e 2006 a meta de superávit primário do governo é de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB). As metas serão estabelecidas nos próximos decretos de programação financeira do governo federal, explicou o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. Até então, fora as do FMI, que eram trimestrais, só havia metas para períodos inferiores a um ano no caso do próprio governo federal. Assim como o acordo com o FMI, a Lei de Diretrizes Orçamentárias também estabelece metas para o conjunto do setor público, mas apenas para períodos anuais. Com a edição dos próximos decretos, o governo federal será legalmente obrigado a fazer um esforço fiscal maior a cada quadrimestre, sempre que Estados, Municípios e empresas estatais não fizerem a sua parte. Isso já acontecia antes, mas por força do acordo com o FMI e do "compromisso político" do governo Lula com o ajuste fiscal, disse Levy. O acordo que agora expira foi firmado em fins de 2002, no governo Fernando Henrique Cardoso, e renovado em fins de 2003, no mandato de Lula. Ao anunciar a decisão do governo, ontem, o ministro Palocci lembrou que a renovação feita em 2003 teve caráter preventivo e que, na ocasião, o objetivo era justamente fazer uma transição para o encerramento do programa com o FMI. Desde então, acrescentou ele, "as condições dos pilares da economia brasileira evoluíram melhor do que o esperado", sobretudo no que diz respeito às contas externas, permitindo que o Brasil agora dispense o apoio do fundo. Como exemplo, ele citou o desempenho das exportações, que passaram dos US$ 100 bilhões no acumulado de 12 meses. "Os indicadores das contas externas são os melhores dos últimos 20 anos", disse o ministro, citando ainda indicadores de crescimento econômico, de controle de inflação e de redução da dívida pública. Perguntado sobre a recente piora do cenário externo, por causa da elevação do preço do petróleo, Palocci disse que o governo não teria resistência em voltar a recorrer ao FMI, se necessário. Não é isso, porém, que ele prevê para o horizonte de curto prazo nem para 2006, mesmo com as eleições para presidente da República. "O Brasil iniciou um ciclo sustentado de crescimento e não há previsão de que se aproxime algo capaz de bloquear esse novo ciclo", afirmou. Para ele, o fato de que a economia vem melhorando progressivamente, "sem solavancos", é uma das evidências de que o país está preparado para enfrentar eventuais pioras de cenário externo sem ajuda do FMI. "Não há motivo para se prever chuvas e trovoadas. A não ser que tenhamos dificuldade de lidar com o sucesso... O Brasil não deve ter medo de seu futuro", insistiu ele, depois de ressaltar, diversas vezes, que as políticas fiscal e monetária mudaram a percepção de risco do mercado externo em relação ao Brasil. À noite, o ministro fez um pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV, para anunciar a decisão de não renovar o acordo. O tom foi de vitória, de superação de uma fase difícil. "É com grande satisfação que, em nome do presidente Lula, comunico um fato da maior relevância: depois de tantos e tantos anos dependendo dos empréstimos do FMI, nosso país, finalmente, tem, conseguido equilibrar as suas contas..., colocando a sua economia em ordem." Ele reconheceu, por outro lado, que a ajuda do FMI foi "fundamental" para a recuperação de credibilidade do país e o fortalecimento da economia. "Com credibilidade em alta, foi possível voltar a crescer", disse o ministro. Em outro trecho do pronunciamento, ele reafirmou o compromisso do governo com a responsabilidade fiscal, um dos fatores que, segundo ele, permitiram a retomada do crescimento. O Brasil termina esse ciclo de acordos devendo ao Fundo 15,35 bilhões de DES, a moeda do FMI, o que corresponde atualmente a cerca de US$ 23,19 bilhões, informou Joaquim Levy. A maior parte, cerca de US$ 21 bilhões, refere-se a dinheiro sacado em 2002 e 2003, antes da renovação do acordo pelo governo Lula. Depois da renovação, não houve saque, uma vez que o acordo ganhou caráter preventivo. Dos empréstimos dos acordos de 1998 e de 2001, restam a pagar US$ 2,2 bilhões, apenas. A dívida toda, que foi reescalonada no final de 2003, será paga ao longo de três anos, até 2007. Só este ano, vencem US$ 7,7 bilhões, dos quais US$ 1,2 bilhão aproximadamente já foram pagos em março.