Título: País conquistou direito de andar com as próprias pernas, diz Lula
Autor: Maria Lúcia Delgado e Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2005, Finanças, p. C1

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva comemorou a decisão de seu governo de não renovar o acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em discurso durante solenidade destinada a comemorar exportações, no Palácio do Planalto, Lula afirmou que o faz com "serenidade e com a tranqüilidade de um governo que conquistou, com o sacrifício de todo o povo brasileiro, o direito de andar com as próprias pernas". Segundo o presidente, "ninguém precisa dizer para nós que temos que ser responsáveis com os gastos públicos". Para Lula, há 10 ou 15 anos gente do seu governo estaria gritando "fora FMI". "Entretanto, embora não tenhamos sido nós que fizemos os acordos com o FMI, todo mundo sabe que o Brasil quebrou três vezes. E o acordo com o FMI deu sustentabilidade para que o país pudesse chegar a sobreviver." Logo após anunciada a decisão de não renovar o acordo, o meio político deu largada ao debate previsível: se a medida foi possível devido à estabilidade econômica obtida no governo anterior ou se é fruto exclusivo de ações desta administração. O líder do governo no Senado, Aloízio Mercadante (PT-SP), exaltou o esforço da atual administração para romper um ciclo de déficit de transações correntes, mas acabou admitindo que o caminho da estabilidade vem sendo trilhado há dez anos. "É um trabalho que vem sendo feito há mais tempo, mas o ajuste fiscal mais consistente foi feito neste período (governo Lula). E os resultados das contas externas foram nestes dois anos", disse. "O país saiu do hospital, está andando com os próprios pés", alegou. Mercadante afirmou ainda que a decisão de governo exige total responsabilidade fiscal, manutenção do esforço exportador, e continuidade de aprovação de reformas relevantes "para manter a estabilidade com crescimento econômico". Como contraponto ao raciocínio do petista, o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), ex-ministro de Fernando Henrique Cardoso, listou uma série de medidas adotadas no governo do PSDB que, segundo ele, permitem essa decisão do governo atual. "O Presidente Lula pode hoje dizer, até com uma certa dose de ousadia, que dispensa fazer acordos com o FMI por uma razão simples: ele estaria se dispondo a manter o cuidado com os fundamentos da economia", alfinetou o tucano. No duelo verbal com Mercadante, Virgílio disse que foi a falta de confiança internacional em Lula que colocou o país na UTI. "Foi preciso seguir os princípios das políticas macroeconômicas que aqui herdaram para tirar o país da UTI", acrescentou o líder do PSDB. Para Virgílio, o PT finge agora ter inventado a roda, apesar de ter insistentemente se recusado a entender a necessidade de auxílio do FMI, sobretudo em momentos de crise internacional, como ocorreu no governo de Fernando Henrique Cardoso. "O PT levou 500 anos para compreender isso. É impressionante. Eu jamais vi uma compreensão tão retardada na minha vida", afirmou. A síntese feita pelo líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna, sobre a decisão de não renovar o acordo com FMI, mostra que o governo vai se apropriar do fato politicamente: "Tive nesses dias duas grandes alegrias: ver chuva no Nordeste e ver o Brasil sair da tutela do FMI", disse. O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia, comemorou o anúncio da não renovação do acordo: "É um passo importante com vários significados políticos e simbólicos", disse. (Colaborou Henrique Gomes Batista).