Título: Cena externa anula confiança pós-FMI
Autor: Luiz Sérgio Guimarães
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2005, Finanças, p. C2

Amplamente sinalizada pelo governo, a decisão de não renovar o acordo com o FMI foi recebida com certo desinteresse pelos mercados financeiros. Se algum efeito o anúncio teve sobre o comportamento dos vários segmentos, foi de leve otimismo, sem jamais anular a pressão negativa exercida pela conjuntura externa incerta. A reação favorável à autoconfiança demonstrada pelo governo petista foi iniciada lá fora, no mercado secundário de títulos da dívida externa brasileira. Após subir 2,5% de manhã, refletindo a alta dos juros americanos de 10 anos e o fortalecimento do dólar nas principais praças mundiais, o risco Brasil perdeu parte do ímpeto. Fechou a 480 pontos-base, com evolução de 1,48%. Incentivados por Wall Street e pelo preço atraente de R$ 2,7510 por dólar, os exportadores retornaram com vigor ao mercado de câmbio. A oferta de moeda derrubou a cotação. E o dólar encerrou o dia a R$ 2,7230, queda de 0,62%, pesada em se tratando de um dia de valorização internacional da moeda americana. A Bovespa e o mercado de juros não puderam acompanhar a distensão exibida pelo câmbio e pelos bônus externos. Se o cancelamento do acordo com o Fundo pode ser capitalizado politicamente pelo governo Lula - sob o argumento de que o atual governo melhorou os fundamentos a ponto de dispensar a ajuda do organismo - , a não renovação não é entendida como gesto temerário e audacioso, capaz de aumentar o risco. Como o governo atual pratica de bom grado uma política econômica mais ortodoxa que a sugerida pela cartilha do FMI, em caso de grave crise global um novo acordo seria entabulado com muita facilidade e rapidez.

Bovespa cai 1,68%; risco Brasil sobe a 480 pontos

O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, disse ao mercado o que o mercado esperava ouvir de Palocci, que a austeridade fiscal é um compromisso de governo, não uma imposição de fora. É por isso que a suspensão pôde ser anunciada justamente num ambiente externo crescentemente hostil, quando os mercados sinalizam a possibilidade de diminuição do fluxo aos emergentes. As taxas dos treasuries de 10 anos subiram ontem de 4,59% para 4,63%. A ampliação da rentabilidade revalorizou o dólar. O euro fechou abaixo de US$ 1,29. O petróleo, por força do juro americano mais elevado, cedeu US$ 0,79 em Nova York, a US$ 54,05 o barril. A recuperação da auto-estima nacional não conseguiu desatolar a Bovespa. Com volume muito acanhado, de R$ 1,05 bilhão, a Bolsa fechou em baixa de 1,68%, a 26.257 pontos. A três pregões do final do mês, acumula perda de 6,69% em março. O mercado futuro de juros da BM&F permaneceu grudado no câmbio. A queda vespertina do dólar aliviou o pregão. A piora nas expectativas de IPCA do mercado - a referente a 2005 subiu de 5,80% para 5,83% e a relativa ao índice projetado para 12 meses avançou de 5,54% para 5,59% - não azedou os negócios. O contrato para o final de abril subiu 0,01 ponto, para 19,28%, embutindo alta de 0,25 ponto percentual da Selic na próxima reunião do Copom, dia 20 de abril. A taxa seria estabilizada em 19,50% por longos meses. Para a virada do ano, a projeção de CDI avançou de 19,29% para 19,32%.