Título: Renda per capita cresce, mas consumo perde participação
Autor: Sergio Lamucci e Denise Neumann
Fonte: Valor Econômico, 01/04/2005, Brasil, p. A3

A renda per capita brasileira cresceu 3,7% no ano passado, segundo os dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atingindo R$ 9.743, ou US$ 3.330, segundo cálculo feito pela consultoria GRC Visão com base em uma taxa de câmbio média de R$ 2,9257 no ano passado. Os números do IBGE mostram ainda que, mesmo tendo crescido 4,3% no ano passado, o consumo das famílias perdeu participação relativa no conjunto do PIB do país, caindo para 55,3%, que é a menor participação desde 1991, quando teve início a atual série histórica das contas nacionais do IBGE. Os números revelam ainda que o PIB brasileiro alcançou R$ 1,769 trilhão no ano passado, o que corresponde a US$ 605 bilhões, segundo cálculo da GRC Visão. Para o economista Alex Agostini, da GRC Visão, o dado referente à participação relativa do consumo das famílias no PIB é preocupante. "Historicamente essa participação se aproxima de dois terços do PIB. Hoje ela está mais próxima da metade", ressaltou. Segundo ele, a situação "é preocupante na medida em que se espera que ele (o consumo das famílias) dê a dinâmica do PIB daqui por diante". Agostini disse que a situação reflete uma gestão equivocada da política monetária. "Estamos preocupados em ter uma inflação de Primeiro Mundo com uma qualidade de vida de Terceiro Mundo." O economista ressaltou que a política monetária dos Estados Unidos, por exemplo, ainda que preocupada com a inflação, tem suas preocupações mais focadas no bem-estar social, vale dizer, no emprego e na renda. "Aqui, a preocupação do Copom (Comitê de Política Monetária) é uma paranóia de inflação." Mas ele reconhece que o aumento da taxa de investimento e o fato de nos últimos tempos ter havido recuperação produtiva de vários setores pode beneficiar o aumento do consumo das famílias. "O crescimento econômico de 2005, mesmo sendo menor que os 5,2% de 2004, pode atingir mais setores, o que é bom para o consumo das famílias", disse. Para o economista Paulo Levy, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o fato de o consumo das famílias ter crescido no ano passado é mais importante que a queda da sua participação relativa no conjunto do PIB. "Se a poupança cresce, é natural que o consumo caia como proporção do PIB", disse Levy, ressaltando que essa queda não é significativa por si só. Mas ele admite que a exportação de poupança que o Brasil vem fazendo nos últimos dois anos, expressa no superávit nas contas externas (conta corrente), tem influência na redução proporcional do consumo das famílias e não é desejável a longo prazo. Segundo o IBGE, o fato de a taxa de investimento da economia no ano passado ter sido de 19,6% e a taxa de poupança, de 23,2%, reflete o que foi feito no ano passado pelo governo e pelas empresas brasileiras para amortizar dívida externa, aproveitando o câmbio favorável. Para Levy, embora a idéia de se utilizar poupança para reduzir o endividamento externo seja saudável, é importante ter em mente que a permanência do superávit em conta corrente não é desejável indefinidamente. "Eu quero que o consumo aumente, não importa que seja como proporção do PIB. Agora, se há o desejo de que ele cresça como proporção do PIB, pode ser necessário que se encontre outra forma de financiar o investimento", resumiu. Uma dessas formas seria a utilização integral da poupança doméstica, em vez de exportar uma parte dela. Com base nos números divulgados pelo IBGE e a partir de projeções de crescimento de outros países feitas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) a consultoria GRC Visão calculou que em 2004 o PIB brasileiro ultrapassou os da Coréia do Sul, da Holanda e da Índia, passando a ocupar a 12ª colocação entre as maiores economias do mundo. A comparação leva em conta apenas o valor de cada economia em dólar, sem considerar as diferenças de poder de compra interno de cada uma delas. Por esse critério, o Brasil perde, em ordem decrescente, para Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, China, Espanha, Canadá, México e Austrália. (CS)