Título: Oposição e PT dizem que MP 232 foi o maior desgaste
Autor: Arnaldo Galvão, Maria Lúcia Delgado e Henrique Gom
Fonte: Valor Econômico, 01/04/2005, Política, p. A8

O governo sofreu forte desgaste político por causa da Medida Provisória 232 no momento em que poderia colher frutos políticos, especialmente entre os setores de esquerda, com a decisão de não renovar o acordo com o FMI. Aumento de imposto nunca foi tema fácil no Congresso, mas o governo, segundo análises feitas pelos próprios parlamentares da base e da oposição, cometeu erros em série e assistiu ao PFL e PSDB se apropriarem do discurso histórico da esquerda, que é a defesa da correção da tabela do Imposto de Renda. "Esse governo é tão forte, tão forte, que nem quando quer ser derrotado consegue", brincavam os próprios petistas no plenário da Câmara anteontem, ao perceber o imbróglio da votação da MP 232. O governo queria derrotar a MP para não deixar a oposição defendendo sozinha no plenário a correção da tabela. PFL e PSDB tinham tomado a decisão de votar e tentar aprovar só a correção da tabela. A base estremeceu. Como justificar, numa votação nominal, que PT, PSB, PCdoB, PPS - isso para mencionar o campo da esquerda - estavam contra uma medida que alivia a tributação sobre o trabalhador? Na opinião da oposição, o episódio trouxe mais danos ao governo que a derrota do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) para a presidência da Câmara. "O governo foi fragorosamente derrotado. Na democracia, é assim: às vezes é preciso fazer concessões à oposição. No jogo político, eles se mostram completamente despreparados. Essa era para ser uma semana anti-imperial, diante da decisão em relação ao FMI, e terminou com a vitória das oposições", ironizou o deputado Eduardo Paes (RJ), vice-líder do PSDB. O governo cometeu um pecado original, admite um petista. A decisão, em 2004, era editar uma medida provisória para corrigir a tabela em 10%. A Receita Federal, para compensar a renúncia de receita que a correção causaria, incluiu aumentos de imposto no texto, que passaram desapercebidos. O texto misturava temas distintos, como mecanismos de combate à sonegação com aumento de tributação. A oposição descobriu a manobra, denunciou-a e conseguiu mobilizar a sociedade. Ainda foi dado aos oposicionistas o trunfo de creditar o Executivo por incluir em MP assuntos tributários extremamente polêmicos. Em reunião na noite de quarta-feira, a bancada do PT buscava uma saída para a crise política, que passou a ter sérias implicações sociais. O temor era que a população, com o episódio, passasse a associar o aumento de carga tributária a esse governo, enquanto as benesses sociais, como a correção da tabela, estavam sendo associadas à oposição. Houve reclamações de petista sobre o excesso de tecnocracia no governo, sobre o autismo da Receita, o excessivo rigor da equipe econômica, que muitas vezes insiste em tributar sem analisar que tais medidas precisam ter o aval no mundo político. "Pela primeira vez, a equipe econômica e o governo nos ouviram", comemorava o deputado Chico Alencar (PT-RJ), ao comentar a decisão de Lula de revogar o aumento tributário contido na MP 232. "Quem leva no lombo aqui somos nós, e não o Rachid (secretário da Receita) ou o Levy (secretário do Tesouro)", acrescentou Chico Alencar. O deputado Carlito Merss (PT-SC), relator da MP 232, passou um bom tempo explicando aos colegas o que era o objetivo da Receita. Várias pessoas da bancada não entendiam as razões da celeuma em torno da medida. Segundo Merss, trata-se, sim, de uma questão ideológica: para a esquerda, não é justo que os trabalhadores assalariados paguem imposto antecipadamente, e os profissionais liberais não sejam submetidos a tais regras, tendo facilidades para sonegar imposto. Merss foi aplaudido. "Esse é um discurso absolutamente equivocado: não se combate sonegação com aumento de imposto", rebateu o tucano Eduardo Paes. Neste debate de correção da tabela do IR, o PFL atuou na oposição com mais desenvoltura. Afinal, somente ao final de oito anos de mandato o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso concordou com a correção de 17,5% da tabela do IR. "Ainda assim estamos na frente do PT. Dois a zero", justificou Eduardo Paes. Para o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), o governo percebeu que o impacto negativo da MP 232 afetaria também a imagem de Lula. "Ou esse governo muda o time de operadores políticos, ou vão perder sempre. Nós agora estamos na posição de simpáticos", celebrou o pefelista. "O governo assumiu a derrota. O impressionante é que vai fazer outra MP. Querem tirar uma vitória onde não existe", disparou o líder do PFL, Rodrigo Maia (RJ). Na tribuna, os petistas corriam atrás do prejuízo. "O governo está honrando um acordo feito com os trabalhadores. O governo Lula cumpre sua palavra sobre as reivindicações do povo brasileiro no que tange a correção da tabela do imposto de renda", disse o líder do PT, Paulo Rocha (PA). (MLD)