Título: Reforma de códigos terá resistência
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 05/04/2005, Legislação & Tributos, p. E1

No primeiro dia de painéis no seminário sobre a reforma dos códigos processuais, organizado em Brasília pela Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, os debates deixaram claro quais interesses corporativos estarão em jogo nos lobbies a serem realizados no Congresso Nacional para aprovar ou vetar alguns dos 23 projetos de lei encaminhados pelo governo para a apreciação de senadores e deputados. Os representantes da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não pouparam críticas a algumas das propostas nas quais entendem haver prejuízos aos seus associados. O primeiro a falar no seminário foi o diretor da AMB e juiz trabalhista Roberto Siegmann. Antes de criticar os projetos da reforma infraconstitucional, o magistrado tratou de relembrar o inconformismo da associação com pontos aprovados na Emenda Constitucional nº 45, que estabeleceu a reforma do Judiciário. "O Conselho Nacional de Justiça, criado pela reforma, torna o Judiciário inferior diante dos demais poderes. Nós, como poder de Estado, não poderíamos ter saído com alguns de nossos pilares atingidos: a súmula vinculantes quebra a independência dos juízes de primeira instância e a federalização dos crimes contra os direitos humanos trata os magistrados como se eles fossem suspeitos de julgar os processos de sua comarca", disse o magistrado. Siegmann também criticou o que chamou de campanha contra os juízes. "O Judiciário é um poder diminuído e menor. Houve uma crise de prestígio que teve início com a reforma da Previdência, quando prerrogativas importantes dos tribunais foram transformadas em privilégios", disse Siegmann. Para o magistrado, as críticas feitas aos juízes durante as duas reformas, embora algumas delas sejam reconhecidas pela magistratura, obedecem a interessados em "atingir o âmago do Judiciário". O magistrado prosseguiu nas críticas às idéias do governo federal para o Judiciário brasileiro e centrou o foco na segurança jurídica, princípio muito defendido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Nelson Jobim, e pelo Planalto. A súmula vinculante, aprovada com a reforma do Judiciário, pretende garantir a previsibilidade das decisões e dar conseqüente segurança jurídica ao país. "Se a previsibilidade procurada é para responder ao capital estrangeiro, então é melhor transformar o Judiciário em uma máquina de estatística. Não interessa um Judiciário previsível", disse. Depois do magistrado, foi a vez de Marcus Furtado Coelho, integrante da Comissão de Estudo da Legislação Processual da OAB, defender a bandeira dos advogados. E a contrapor diretamente o discurso de Siegmann. O representante da Ordem defendeu a necessidade de uma simplificação do processo e pediu o respeito a dois princípios estabelecidos na Constituição. "A qualidade dos julgados e a segurança das decisões são duas exigências constitucionais", disse Coelho na defesa da permanência de recursos que poderão ser extintos com a aprovação da reforma dos processos. "O contraditório não deve ser tolhido, o direito de defesa é importante. É preciso que o devedor tenha dignidade nas ações, o direito ao recurso integra o direito de defesa", afirmou. Notadamente, magistrados elogiam processos criticados por advogados e vice-versa. O secretário da Reforma do Judiciário, Sérgio Renault, disse já esperar os confrontos e as críticas durante o seminário. "Sabemos que vai ter discussão aqui e também no Congresso: os projetos têm um meio termo, e são criticados por não agradarem totalmente nenhum dos dois lados. Tínhamos clareza disso", disse. Sobre a previsão de fortes lobbies no parlamento, Renault diz esperar a aprovação do fundamental dentre as propostas. "Não tenho ilusões de que não vão sofrer alterações, mas a discussão tem que ser feita e isso é positivo."