Título: Dirceu assume o leme da reeleição
Autor: Claudia Safatle e Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 04/04/2005, Política, p. A4

A 18 meses da reeleição, o ministro chefe da Casa Civil, José Dirceu, assume, no governo, a face de principal mandatário do PT. É a partir daí que demonstra sua insatisfação com uma reforma ministerial que não houve e, principalmente, faz importantes reparos à política econômica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele se queixa de ter saído enfraquecido das articulações políticas que fez e dos compromissos que assumiu e não foram cumpridos na reforma patrocinada pelo presidente da República. A contrariedade do ministro, porém, vai além das questões relacionadas à articulação política e à permanência no cargo do responsável por essa área - o ministro Aldo Rebelo. Na semana passada, ele e Rebelo teriam, inclusive, feito as pazes. Como responsável por manter a militância do PT junto a Lula na reeleição, Dirceu tem feito, a interlocutores que estiveram com ele nos últimos dias, críticas fortes às decisões da política econômica que, a seu contragosto, foram tomadas nos dois primeiros anos e que agora estariam restringindo as possibilidades de crescimento mais acelerado da economia. Por ele, o presidente Lula não teria, no início de 2003, aumentado para 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB), o superávit primário das contas consolidadas do setor público. A meta anterior, acertada com o Fundo Monetário Internacional (FMI), era de 3,75% do PIB. Agora, assinala Dirceu, não dá mais para voltar atrás porque o presidente se comprometeu com esse ajuste fiscal interna e externamente. Acha que também foi equivocada a decisão de colocar como meta (ajustada) uma taxa de inflação de 5,1% para este ano. "Por que não poderia ter sido de 6% (o IPCA de 2004 chegou a 7,6%)", indagou numa conversa recente com um interlocutor. Assim, a taxa de juros básica poderia ser menor hoje. Dirceu tem alertado, ainda, para o receio que alimenta agora de que, a persistirem os sinais de elevação dos juros mais rapidamente nos Estados Unidos e de aumento do preço do petróleo no mercado internacional, a taxa de juros básica (Selic) tenha que ser aumentada mais e mais, até chegar, quem sabe, à casa dos 22% ao ano. Hoje, ela está em 19,25%. Na avaliação de assessores graduados do presidente, Dirceu, "que é o PT no governo", nunca concordou com a política econômica adotada por Lula. Os bons resultados dessa política levaram à ascensão do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e da sua influência sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, sem ter conseguido reconquistar o comando político do governo, Dirceu voltou, também, a apontar o que ele considera opções erradas de política econômica. Essa não é uma postura nova. Sempre que há algum contratempo com o presidente Lula, o ministro da Casa Civil, segundo assessores do presidente, volta suas baterias para a equipe econômica. Ironicamente, foi Palocci quem, nas disputas internas, tentou convencer Lula a devolver a coordenação política a Dirceu. Na visão da Fazenda, um Dirceu enfraquecido é ruim para o governo e, portanto, para a área econômica. Sem o apoio do PT, Palocci precisa contar com o auxílio da Casa Civil. Com Lula, lembram assessores do Planalto, a relação de Dirceu é profissional. Os dois nunca foram amigos, como são hoje Lula e Palocci. "A relação dos dois é esquizofrênica, complicada. Trata-se, na prática, de uma relação de Lula com o partido. O presidente confia em Dirceu, mas essa confiança não é ilimitada", explica um interlocutor muito próximo do presidente. Assim, mesmo que queira diminuir o tamanho de Dirceu no governo, Lula não poderia prescindir dele por causa do PT. "O Lula não é mais petista", exagera um colaborador do presidente. O presidente não gostou de ver a desenvoltura de Dirceu em criticá-lo, nas duas últimas semanas e chamou-o para uma conversa, numa tentativa de "aparar arestas", conta um assessor direto do presidente. O encontro, na semana passada, teria sido bem-sucedido. Nele, Lula reafirmou o papel que espera ver desempenhado pelo ministro da Casa Civil de agora em diante. O ministro, por seu lado, disse a um interlocutor que pretende ficar de três a quatro meses totalmente distante das articulações políticas. Ele promete se concentrar na coordenação das ações de governo, sobretudo nos programas de investimento em infra-estrutura e nas Parcerias Público-Privadas (PPPs).