Título: Votação impôs a Palocci a maior derrota desde a posse
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 04/04/2005, Política, p. A5

O presidente Lula foi até o limite no apoio ao ministro Antonio Palocci, mas, ao final, rendeu-se à verdadeira rebelião que se estabeleceu na Praça dos Três Poderes contra a Medida Provisória 232. A oposição à MP juntou do mesmo lado ministros desavindos como José Dirceu (Casa Civil) e Aldo Rebelo (Coordenação Política), e os líderes de uma coalizão governista esgarçada. Foi a maior derrota de Palocci em 27 meses de governo. "Foram três dias que valeram por 30", comemorava, na tarde de sexta-feira, o novo líder do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP). "Esse equilíbrio é fundamental. É preciso também levar em consideração as relações políticas, a base tem de participar das decisões do governo", avaliou o deputado Paulo Rocha (PA), que teve seu primeiro teste efetivo como novo líder do PT na Câmara. Desde que foi editada, a MP 232 deixou contrariada a área política do governo. Lula decidira corrigir em 10% a tabela do IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física), havia concordância geral de que ela conteria medidas de combate à elisão fiscal. Mas o que a equipe econômica apresentou foi uma MP que atingia diversos setores com aumento de imposto. Isso não estava combinado com ninguém. A equipe econômica insistiu nos termos da medida mesmo depois de o PT perder a presidência da Câmara, quando a coalizão governista passou a viver na instabilidade. Já na Páscoa os líderes emitiram os primeiros sinais de que a MP não passaria no Congresso, mas a equipe econômica não mudou de postura - admitia isentar alguns setores, mas a medida teria de ser aprovada com a correção e as compensações para a perda estimada de arrecadação. Nos três dias que valeram por 30, na expressão de Chinaglia, a situação não mudou nem mesmo quando a oposição manobrou para fatiar a medida e aprovar só a correção da tabela do IR. A equipe econômica, neste caso, concordou em que a Câmara rejeitasse a MP - O Congresso faria em seguida um decreto regulamentando os três meses em que ela vigorou e o governo depois enviaria projeto de lei com a correção e as compensações. Com a rejeição da MP, seria restabelecida a situação de 2004: Palocci era contrário não só à correção da tabela do IR como também torceu o nariz para o salário mínimo de R$ 300, decisões pessoais do presidente Lula. Na terça-feira, os líderes aliados conseguiram obstruir a votação da MP. Na quarta-feira, Lula mantinha o apoio às posições da Fazenda, mas já demonstrava alguma hesitação. Dizia que o pacote todo caíra em seu colo. Os líderes conseguiram do presidente o compromisso de que o governo corrigiria a tabela, mas também adotaria medidas de combate à elisão fiscal. Isso levou ao sucesso a nova obstrução na votação noturna da Câmara. Estava aberto o espaço para Lula faturar politicamente a correção. Na quinta-feira Lula viajou com Dirceu, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) e o deputado João Paulo Cunha (PT-SP). Aparentemente, foi no "vôo 232" que Lula bateu definitivamente o martelo: editar MP para revogar o aumento de impostos para prestadores de serviço e votar só a correção da tabela, e enviar como projeto de lei ao Congresso as medidas compensatórias exigidas pela Fazenda. Entre são Carlos e Araraquara, Bernard Appy, ministro interino da Fazenda - Palocci estava viajando - e José Toffoli, subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, receberam instruções para a redação da medida. Nos setores mais ligados a Dirceu no PT, avalia-se que Lula só não bancou Palocci até o fim porque foi grande a derrota sofrida pelo chefe da Casa Civil na reforma ministerial que não houve. Nos partidos, a avaliação é que faltou um mínimo de sensibilidade política à equipe econômica. Além de querer impor medidas impopulares no terceiro ano de mandato, véspera de ano eleitoral e na seqüência de um ano de crescimento econômico, Palocci e sua turma não se expuseram na defesa da MP 232 - o desgaste era todo da área política.