Título: Artilharia de Aécio
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 04/03/2010, Política, p. 2

Em solenidade idealizada por tucanos para mostrar unidade, mineiro demonstra força. Com frase dita pelo avô, ele reafirma que não será vice de Serra: ¿Não adianta me empurrar¿

Serra e Aécio participaram de homenagem a Tancredo: paulista fugiu de questões eleitorais

Idealizada pelos tucanos como uma solenidade para mostrar a unidade do PSDB, o centenário de Tancredo Neves acabou por se transformar num evento de demonstração de força do governador de Minas Gerais, Aécio Neves, neto e herdeiro político do ex-presidente. Aécio chegou ao Congresso como candidato a senador e saiu com a torcida de um grupo expressivo para que concorra à Presidência da República, embora fizesse questão de declarar que sua ¿participação na campanha presidencial terminou em dezembro¿, quando decidiu concorrer ao Senado. Sobre a hipótese de ser candidato a vice numa chapa tucana encabeçada pelo governador de São Paulo, José Serra, o mineiro foi incisivo: ¿Não adianta me empurrar. Porque empurrado eu não vou¿, disse relembrando uma frase do avô dita em janeiro de 1985 numa conversa com o comunista João Amazonas.

Ao seu redor, desde às 10h da manhã, quando chegou a Brasília para inaugurar um busto do seu avô no Salão Nobre(1) , Aécio reuniu personalidades de todos os partidos. A presença do presidente do PP, Francisco Dornelles, seu primo, que ficou o tempo todo ao seu lado, deu a muitos a certeza de que Dornelles levará o PP para os braços do mineiro, caso do PSDB reveja sua rota.

Num ano eleitoral, onde as palavras dos discursos são escolhidas com precisão cirúrgica, o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB), principal nome na bolsa de apostas para compor a chapa de Dilma Rousseff (PT) à sucessão de Lula, deu o seu recado: ¿Tancredo não via inimigos na classe política, mas adversários que, num dado momento, podem se somar às suas teses. O governador Aécio é o homem da conciliação, da leveza. Não cria embaraços, nem adversidades. Busca sempre as soluções¿, discursou Temer.

Na saída do Salão Nobre, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o comandante do país em 85, quando Tancredo morreu antes de tomar posse, não escondia a sua alegria com o sucesso político do governador mineiro. Perguntado se apoiaria Aécio na hipótese de mudança do PSDB, ele respondeu: ¿Não me ponha numa saia justa. Acho que a esta altura, o candidato do PSDB está escolhido: é o governador José Serra¿, comentou o senador ao Correio.

Serra perdeu a solenidade de inauguração do busto de Tancredo. Atrasou-se por conta das dificuldades para decolar em São Paulo. Perdeu ainda alguns minutos porque todo o tucanato esperava por ele no gabinete do líder Arthur Virgílio (AM). Só foi encontrar Aécio já dentro do plenário, pouco antes do início da sessão solene do Congresso, iniciativa de tucanos de Minas. Nas poucas perguntas que respondeu, Serra evitou tratar da eleição presidencial. ¿Vim homenagear o nosso Tancredo Neves. De eleição, a gente fala em outra hora¿, afirmou.

Conciliação Passados os discursos de Sarney e de Temer, com ênfase à democracia, Aécio tomou conta da tribuna. Foi seguido por Serra, que fez um discurso de candidato (leia detalhes na página 3). Aécio, num discurso mais emotivo e recheado de recados, deixou claro que não deseja o confronto com ninguém. Lembrou que seu avô sempre repetia, ¿brigam as ideias e não os homens!¿ E prosseguiu: ¿Tem nos faltado a grandeza de líderes capazes de recuperar o sentido mais amplo da conciliação, para que nos permitíssemos convergir, todos, em torno das grandes causas nacionais ¿, afirmou, num recado direto às divisões atuais, internas e externas ao PSDB.

Quando à dúvida que hoje aflige muitos tucanos e às pressões sobre ele e o governador paulista, Aécio considera que essas decisões serão solitárias: ¿No exercício do poder nunca estamos sozinhos. Mas somos sempre sós. As grandes decisões são sempre solitárias. Indelegáveis. Precisamos resistir às pressões que nos afastam daquilo que acreditamos. Não podemos temer a incompreensão, quando agimos de acordo com a nossa consciência e responsabilidade¿, disse ele, olhando para Serra. Estava dado o recado: ele quer que Serra decida por si o caminho que seguirá e compreenda que o mineiro considera mais importante para o projeto permanecer em Minas, se José Serra for o nome escolhido. Os tucanos continuam divididos e em busca da sonhada unidade dos projetos pessoais.

1 - História do Senado O Salão Nobre é local onde estão expostos os móveis antigos e peças modernas, pertencentes ao acervo histórico do Museu do Senado. O ambiente é destinado à recepção das autoridades estrangeiras, especialmente chefes de Estado e de Governo. É decorado com obras de importantes personalidades das artes plásticas como Burle Marx e Ceschiatti. No salão existem duas galerias permanentes, onde estão expostos os retratos dos presidentes do Senado no Império e na República.

Troca de candidato

A bancada mineira de partidos aliados a Aécio Neves e ao governo Lula aproveitou a solenidade do aniversário de Tancredo, que, se fosse vivo, completaria cem anos hoje, para deflagrar uma campanha pela troca do candidato. E esse movimento deve se intensificar hoje com a inauguração do centro administrativo do governo de Minas Gerais, que Aécio vai inaugurar na presença de políticos das mais diversas matizes partidárias.

A ideia é mostrar que Aécio é capaz de quebrar o castelo de partidos que o presidente Lula tenta construir para abrigar a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. ¿Aécio chegou aqui pressionado para ser o vice do (José) Serra. Saiu nos braços dos aliados do PMDB, do meu PSB, do PSDB e do DEM¿, comentou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).

Tão logo terminou a solenidade no Senado, Aécio se reuniu com um grupo de tucanos no gabinete do líder do partido, Arthur Virgílio (AM), todos ansiosos com o fato de Serra ainda não ter se posicionado diretamente. Ali, tentaram saber de Aécio se ele aceitaria ser candidato se Serra desistisse. O mineiro, no entanto, reforçou que não pretende concorrer, apesar da movimentação dos mineiros. O senador Tasso Jereissati (CE) entrou na conversa: ¿Se o Serra desistir, nós iremos te buscar¿.

A conversa terminou aí, uma vez que a bola da candidatura está nos pés do governador de São Paulo, que mantém o partido ansioso. Os mineiros são os mais nervosos: ¿O que irrita é que a cúpula do PSDB sequer levou em conta a candidatura Aécio. Os paulistas decidiram que o candidato é o Serra e ponto final. O Aécio tem maior capacidade de agregar. Essa história de vice é um desrespeito, dizer que, se não for, será o culpado pela derrota do Serra. O Serra não pode culpar o Aécio¿, diz o deputado Nárcio Rodrigues (PSDB-MG).

O presidente do DEM, Rodrigo Maia, observa preocupado: ¿Temo pelos próprios mineiros, que já se frustraram quando Aécio anunciou que disputaria o Senado. Agora eles podem se decepcionar novamente, apostando na desistência de Serra. Esse jogo é muito ruim tanto para o PSDB como para todos nós que estamos juntos¿, afirma. (DR)