Título: Acordo agrícola da OMC deve ficar no "meio do caminho", avalia especialista
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 06/04/2005, Brasil, p. A3

A atual rodada de negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) deve produzir um acordo em agricultura que ficará "no meio do caminho" entre os interesses protecionistas do países desenvolvidos e as demandas de países em desenvolvimento, como o Brasil. "Mas deverá ser um acordo que produzirá resultados interessantes para a agricultura, sobretudo na questão de disciplinas para os subsídios", avalia André Nassar, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone). O cenário projetado por Nassar significa a eliminação dos subsídios à exportação, a redução do apoio doméstico à agricultura, em especial nos EUA, e o corte de 30% a 40% nas tarifas de produtos agrícolas de interesse do Brasil. Nassar afirmou que a OMC "tem uma dívida com a agricultura", porque no passado o sistema multilateral de comércio centrou a liberalização no setor industrial. "Não haverá acordo ideal na OMC, mas será um acordo melhor do que houve na Rodada Uruguai (do Gatt, antecessor da OMC), porque, entre outras coisas, o Brasil e os países em desenvolvimento estão mais aparelhados", disse Nassar. Ele participou ontem de painel sobre as perspectivas da rodada de Doha em seminário que discutiu a política comercial do governo Lula. No evento, promovido pela Rede Latino-Americana de Comércio (Latn), que inicia atividades no Brasil, a economista Sandra Rios, consultora da Confederação Nacional do Comércio (CNI), expôs a visão da indústria sobre as negociações na OMC. Segundo ela, a combinação de dois fatores - a ambição em agricultura e o debate sobre a liberalização na área industrial - levarão a uma solução intermediária na rodada. Esse caminho significaria que a tarifa máxima do Brasil para bens industriais poderia ficar em cerca de 15% e a tarifa média próxima a 14%. Hoje, a tarifa média consolidada pelo Brasil na OMC para bens industriais é de 31%, e a tarifa máxima, de 35%. Já a tarifa média aplicada pelo país é de 10,77% e a máxima, de 35% no setor automotivo. "A tarifa máxima vai cair", salientou. Sandra lembrou que os países desenvolvidos subiram o tom das demandas em bens industriais, movimento que se relaciona com a demanda dos países em desenvolvimento na área agrícola. Essa "conta" teria de ser paga pela indústria de qualquer maneira, independente da maior demanda do agronegócio nas negociações da OMC, afirmou Nassar, do Icone. Sandra lembrou que no início de março, no Qatar, houve forte demanda dos países ricos para avançar na negociação de bens industriais. Em Genebra, os países desenvolvidos pressionaram Brasil e Índia a deixarem mais claras suas posições e fazerem movimentos efetivos em termos de liberalização, acrescentou Sandra. Ela disse que preocupa à indústria o fato de o governo brasileiro não ter estratégia definida sobre as negociações de bens industriais na OMC. O que se percebe, segundo ela, são visões diferentes dentro do governo. O Itamaraty está preocupado com o sucesso da Rodada, o que implica avanços na área industrial. O Ministério de Indústria quer manter espaço para fazer política comercial, e o Ministério da Fazenda, mais ativo em outras negociações, como a da Alca, não tem se envolvido nas discussões sobre produtos industriais na OMC.