Título: Inflação sobe e Argentina discute aperto dos juros
Autor: Paulo Braga
Fonte: Valor Econômico, 06/04/2005, Internacional, p. A9

A inflação voltou a subir com força na Argentina, atingindo 1,5% em março. O índice de preços ao consumidor acumulado nos três primeiros meses do ano já chega a 4,05%, a taxa dos últimos 12 meses é de 9,1%. Analistas esperam que o Banco Central passe a adotar uma política monetária mais restritiva, aumentando os juros para tentar conter a escalada de preços. A necessidade de tirar dinheiro de circulação também leva a crer que o crescimento econômico pode sofrer uma desaceleração. Outro efeito possível é a diminuição das intervenções do Banco Central, deixando de comprar dólares no mercado, o que também levará a uma valorização do peso.

"As respostas ao problema teriam de se focalizar em reverter a expansão monetária, e deveria ocorrer um aumento nas taxas de juros", disse o economista Esteban Medrano, da consultoria Macrovisión. Com a alta de março, a maioria dos analistas considera quase impossível que a inflação de 2005 se mantenha na meta estabelecida pelo BC, entre 5% e 8%, e acreditam que pode chegar a dois dígitos. No final do ano passado, a economia argentina recebeu uma forte injeção de dinheiro graças a um pacote de estímulo ao consumo, que incluiu aumentos de aposentadorias e do funcionalismo público. Somou-se a isso a forte intervenção do BC, comprando dólares, e consequentemente injetando pesos na economia, para manter a cotação da moeda americana em torno de 3 pesos argentinos. Nos últimos meses, o BC diminuiu o ritmo das compras e passou a absorver pesos do mercado, mas a ação não conseguiu impedir uma alta dos preços, que também foi estimulada por outros fatores. Segundo Medrano, a inflação na Argentina é resultado de um "coquetel". Na mistura estão incluídos o aumento da demanda, causado pelo crescimento econômico de 9% no ano passado e pela recuperação do crédito ao consumo; a "rédea solta" na política monetária, com a injeção de pesos na economia pela compra de dólares; a alta no preço de commodities, como petróleo, cobre e alumínio; e a manutenção do peso fraco frente ao dólar enquanto a moeda americana se desvaloriza, o que implica produtos importados mais caros. O economista Mariano Flores Vidal também diz que a arma mais efetiva para conter a inflação é o aumento das taxas de juros, e há um forte espaço para incrementar o custo do dinheiro. Nesta semana, o BC já deu um sinal nesse sentido, subindo a taxa básica de curto prazo de 2,75% para 3,25% ao ano. Vidal acredita que o incremento das taxas de juros tenha como efeito principal o "enxugamento" da economia doméstica, estimulando pouco o ingresso de capitais especulativos de fora do país, já que a Argentina ainda é vista com desconfiança pelos mercados internacionais e o problema do default ainda não foi totalmente solucionado. Isso permitiria limitar o efeito do aumento das taxas de juros sobre o câmbio, limitando a pressão para a valorização do peso. Mesmo assim, o economista acredita que o governo poderia permitir que o peso se valorizasse ao mesmo nível do real, criando um fator de inibição de preços via importações sem afetar muito a competitividade dos produtos argentinos no mercado externo. Para Medrano, o desafio das autoridades argentinas será limitar o impacto sobre o crescimento das medidas de combate à inflação. Ele sugere que, paralelamente às medidas que podem inibir a demanda e o crédito de curto prazo, as autoridades consigam estimular o aumento do crédito de longo prazo, para facilitar os investimentos produtivos necessários para que o país possa continuar crescendo num ritmo sustentado.