Título: O que há com as cotas?
Autor: Angelo Pavini e Daniele Camba
Fonte: Valor Econômico, 06/04/2005, EU &, p. D1

O processo de ajuste dos fundos de investimento às normas da Instrução 409 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) vai mudar a forma como o setor calcula e compara as rentabilidades. A partir de 4 de julho, todos os fundos deverão usar como referência o dia 30 de cada mês, conforme circular 010/05 da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). Hoje, alguns estimam o retorno de 1º de um mês a 1º do mês seguinte. A diferença se devia em geral à forma como o valor da cota era obtido. Se a cota usada era a de abertura do dia dos negócios, o fundo usava o dia 1º do mês seguinte como referência. Se a base era o fechamento do dia, usava o dia 30 do mês. Pela determinação da Anbid, porém, mesmo os fundos com cota de abertura passarão a usar o dia 30. Isso obrigará os gestores a recalcularem as séries históricas de rentabilidade usando o novo critério, o que poderá até mudar o desempenho de algumas carteiras. Principalmente entre os fundos mais voláteis, como os multimercados, onde um dia pode fazer diferença, alertam os gestores. Essa e outras alterações de dados estão fazendo com que a Anbid deixe de divulgar as cotas e rentabilidades de cerca de 400 fundos nas tabelas diárias publicadas pelo Valor. Segundo executivos que acompanham o processo, como o prazo para as mudanças terminou em 31 de março, muitos fundos estão ainda informando a Anbid das alterações. Além das cotas, os gestores estão mudando outros dados, como nome do fundo, categoria, qual tributação pretende adotar e para que tipo de investidor é indicado. E, muitas vezes, a categoria CVM escolhida pelo fundo não bate com a da Anbid e exige nova consulta ao gestor. "Tem fundo que se classifica como cambial na Anbid e renda fixa na CVM", diz um executivo. A expectativa da Anbid é de que esse processo esteja concluído até o fim de abril. De acordo com a 409, apenas fundos de renda fixa, referenciados (como os DIs) e curto prazo podem ter cotas de abertura. Os demais devem ter cotas de fechamento, como os multimercados. Isso fez com que muitos gestores passassem a adotar a cota de fechamento para todos os seus fundos. Na cota de fechamento, se o investidor resgatar ao longo do dia, leva o valor calculado no final do expediente, embutindo ganhos ou perdas que ocorrerem até o fechamento dos negócios. Pela cota de abertura, o retorno é calculado com a cota do fechamento do dia anterior, acrescida de uma estimativa de rentabilidade para o dia, baseada no juro "overnight". Em fundos mais voláteis, como os multimercados, o investidor poderia sacar sem pegar uma perda eventual no dia, deixando o prejuízo para quem ficou no fundo. Com as mudanças, a Anbid aproveitou para padronizar o cálculo do rendimento de todas as categorias de fundos para o dia 30. A Associação vai recalcular a série histórica de retorno de todos os fundos do mercado, mas vai manter em arquivo a série feita até agora com o dia 1º. A diretora da Anbid e do Banco Safra Luciane Ribeiro lembra que a mudança de cálculo não representará perdas aos investidores. "Estamos apenas tirando um dia da base de cálculo e incluindo outro", diz Luciane. Em fundos conservadores, como os DI e os renda fixa, a mudança de dia afeta marginalmente a rentabilidade. Já em fundos mais arriscados, como os multimercados, pode-se excluir um dia em que o mercado foi bom e a cota foi positiva e colocar um dia de mercado ruim, com cota negativa. Isso pode acontecer principalmente em multimercados com renda variável, uma vez que o mercado de ações é extremamente dinâmico. Segundo Luciane, exatamente por essa possível distorção, a Anbid vai manter as duas séries históricas. Além do cálculo das cotas, Marcelo d'Agosto, sócio do site Fortuna e autor do livro "Como escolher o melhor fundo de investimento", lembra que também é importante saber qual data o fundo usa para conversão da aplicação ou resgate. Um dos efeitos das cotas de fechamento é que alguns fundos vão limitar os resgates totais durante o dia, já que não sabem exatamente quanto o cliente tem aplicado. Nesses casos, será creditado na hora um valor menor na conta do cliente e, no final do dia, o valor restante. Nos resgates parciais, será creditado na conta o valor total e a diferença da cota, se houver, será descontada no saldo que ficar no fundo.