Título: Pequim ameaça retaliar parceiro que adotar barreiras
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2005, Brasil, p. A3

A China advertiu pela primeira vez que poderá retaliar parceiros comerciais que aplicarem salvaguardas especificas para conter a entrada de produtos chineses em seus mercados. A mensagem serve diretamente para o Brasil. Esse tipo de salvaguarda (sobretaxa ou cota), mais fácil de ser aplicada, é o que a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) pede que o governo federal imponha às importações chinesas. A ameaça de Pequim foi dada em resposta por escrito a uma questão da União Européia. Os chineses indicam que só aceitam a aplicação do Acordo de Salvaguardas da Organização Mundial do Comércio (OMC), pela qual os países podem reagir contra os produtos importados, somente após "legítima investigação" e "de modo correto e sem discriminação". A mensagem chinesa é claramente de que não há carta branca no mecanismo de salvaguarda específica, que Pequim aceitou no seu protocolo de entrada na OMC, para os países aplicarem tarifa adicional ou cota como bem entenderem. Pequim qualifica de "discriminatória" a aplicação de salvaguarda especifica e avisa que dispõe de regulamentação interna permitindo "contramedidas" para quem utilizá-la. O artigo 32 da regulamentação chinesa sobre salvaguarda estabelece que, quando qualquer país ou região "aplicar medidas de salvaguarda discriminatórias contra a China, esta pode adotar medida correspondente"´ contra o utilizador do mecanismo. A regulamentação chinesa não especifica o que considera "medidas discriminatórias", mas Pequim promete implementar o artigo 32 "em conformidade com as regras da OMC". O fato é que mais e mais países demonstram disposição de recorrer à exceção prevista no contrato de entrada da China e aplicar salvaguardas especificas. Esse mecanismo pode ser utilizado até 2013 sobre todos os produtos chineses, e não apenas têxteis. Pelo artigo 16 do protocolo de entrada da China na OMC, o governo de um país-membro pode pedir consultas com Pequim, se determinar que produtos chineses estão sendo importados em tal quantidade que causem, ou ameacem causar, "desorganização do mercado" para produtores nacionais. Se os dois lados concordarem que as importações de fato causam problemas, a China toma medidas para corrigir a situação. Se não houver acordo em 60 dias, o país reclamante pode impor unilateralmente tarifa maior ou cota restringindo a entrada do produto. A aplicação da "salvaguarda especifica" é menos difícil que aquela sob o Acordo de Salvaguardas da OMC. A primeira fala de importação que "causa ou ameaça causar prejuízo". A segunda só permite proteção se ficar provado que o crescimento das importações causa ou ameaça causar "sérios prejuízos" para a indústria doméstica. Nos dois casos, a salvaguarda pode vigorar por até três anos. Especificamente no caso de têxteis, os países podem aplicar até 2008 uma salvaguarda ainda mais fácil contra os produtos chineses, conforme o artigo 242 do mesmo protocolo de acessão de Pequim. Basta o governo demonstrar que os têxteis da China "desorganizaram o mercado" doméstico. "A questão agora é o que realmente vale, a salvaguarda especifica ou o Acordo de Salvaguardas da OMC", diz um analista. A resposta da China à União Européia foi entregue à OMC pouco antes da sessão desta semana do Comitê de Salvaguardas da entidade. Significa que, oficialmente, o documento só será examinado em outubro. Mas EUA e UE já manifestaram preocupação sobre a compatibilidade da regulamentação chinesa sobre salvaguarda com o acertado na própria OMC.