Título: Para Renan, devolução de MPs não é da alçada de Severino
Autor: Maria Lúcia Delgado e Henrique Gomes Batista
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2005, Política, p. A13

Uma ofensiva do Senado jogou por terra ontem a intenção do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, de devolver à presidência da República medidas provisórias que considerar irrelevantes e não urgentes. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), apresentou ontem no plenário uma questão de ordem indagando o presidente da Casa, Renan Calheiros, se Severino teria essa competência. Mercadante argumentou que quem preside o Congresso é o presidente do Senado. "Quem recebe a MP é o presidente do Congresso. Quem constitui a comissão mista para analisar as MPs e as emendas é a presidência do Senado", disse Mercadante. "Quem pode, constitucionalmente, devolver uma MP é o plenário de uma das duas Casas", concluiu o líder do governo. O petista salientou que essa regra está clara no artigo 62 da Constituição. Renan disse não ter nenhuma dúvida sobre isso. "Entendo com clareza o que a Constituição e o regimento do Senado dizem", afirmou. "Nem o presidente do Senado nem o presidente da Câmara têm competência para devolver medidas provisórias. Essa competência cabe ao plenário. Não vejo absolutamente nenhuma dúvida nesta tramitação". O presidente do Senado criticou mais uma vez o excesso de edição de MPs e pregou que seja vedada a discussão de matéria tributária com esse instrumento. A ação de Mercadante e de Calheiros foi rápida e conteve a onda oposicionista, que embarcava no discurso de Severino. O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), havia dito no plenário que não votaria a MP sobre regulamentação do biodiesel porque a considerava relevante, mas não urgente. O líder do governo afirmou que sua questão de ordem não tinha como objetivo fazer disputa política com a Câmara e nem questionar a autoridade de Severino Cavalcanti. "Só que essa discussão não tem fundamento constitucional nem regimental", alegou Mercadante. "Esse governo continua editando MPs como se o rito fosse o antigo. Esse governo pega os defeitos de Severino e faz uma campanha para desmoralizá-lo porque querem chegar ao impeachment do presidente da Câmara", bradou o líder tucano. Por fim, os senadores concordaram que é preciso tomar uma decisão definitiva sobre o rito das MPs. A comissão especial mista que analisa o assunto deve votar o parecer na próxima semana. O presidente do Senado disse que vai se empenhar para que o rito de tramitação das MPs seja modificado. Após Calheiros deferir a questão de ordem de Mercadante, os senadores passaram a sessão praticamente inteira de ontem discutindo o tema. Nada foi votado no plenário. Calheiros disse que continuará pedindo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que reduza o número de medidas provisórias editadas, o que inviabiliza o trabalho da Câmara. As MPs têm prioridade de votação e, por isso, trancam a pauta. A assessoria jurídica da Mesa Diretora da Câmara ainda não deu parecer oficial sobre a consulta de Severino Cavalcanti sobre a possibilidade de ele rejeitar, sem consultar o plenário, medidas provisórias. No entanto, o dia ontem na Câmara foi marcado por debates sobre essa proposta. O ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, rebateu a proposta de Severino, ao sair da reunião de líderes aliados: "Creio que essa atribuição não cabe ao presidente da Câmara, mas ao conjunto dos deputados e senadores". Severino espera que a consulta que fez à mesa diretora da Câmara só fique pronta na próxima semana, após seu retorno de viagem a Roma. A Secretaria Geral da Casa informou que o estudo é "trabalhoso" para ser realizado e também confirmou que a análise técnica do pedido de Severino só deverá ser concluído na próxima semana.