Título: Global 40 passa C-Bond e assume primeiro lugar dos emergentes
Autor: Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 14/04/2005, Finanças, p. C1
Pela primeira vez desde a reestruturação da dívida externa de 1994, o brasileiro C-Bond deixou de ser o título mais negociado dos mercados emergentes. O também brasileiro Global 40 assumiu o seu lugar e é agora o novo benchmark, com o maior volume de negócios. O Global 40 girou US$ 292,649 bilhões no ano passado, passando o C-Bond, que girou US$ 222,353 bilhões. Em 2003, o primeiro colocado havia sido o C-Bond, com US$ 286,779 bilhões e o segundo, o Rússia 30, com US$ 149,027 bilhões. O Global 40 estava em terceiro lugar, com US$ 83,506 bilhões. Os números são da EMTA (Emerging Markets Traders Association). O C-Bond é um título da dívida renegociada do Brasil, nos moldes do Plano Brady, e como todos os chamados "bradies" carrega consigo o estigma da moratória. Justamente com o objetivo de reduzir sua importância nos mercados emergentes foi que o Banco Central, sob o comando de Armínio Fraga e com Daniel Gleizer na área externa, lançou o Global 40. Em agosto de 2000 foram emitidos US$ 5,16 bilhões desse papel e parte da emissão foi paga com "bradies" e "pré-bradies, inclusive o C-Bond. Os objetivos do antigo BC foram agora alcançados. E foi a alta de preços dos papéis da dívida externa brasileira aliada ao fortalecimento das reservas internacionais, o caixa em moeda forte do país, a principal razão para o desinteresse crescente no C-bond e para a migração de recursos para o Global 40, segundo os especialistas. Não só os C-Bonds, mas todos os "bradies" podem ser recompradas pelo Tesouro por 100% do seu valor de face nos dias de vencimentos de juros, em 15 de abril e 15 de outubro de cada ano. Para exercer esse direito, porém, o Tesouro deve emitir comunicado entre 30 e 60 dias antes do pagamento de juros. Com a valorização dos papéis brasileiros, em janeiro do ano passado o C-Bond passou pela primeira vez 100% de seu valor de face no mercado secundário, tornando a opção de recompra antecipada interessante para o Tesouro. O mais recente fortalecimento das reservas tem tornado a opção de recompra do C-Bond viável: o governo agora tem dinheiro suficiente para comprar o título e cada vez mais participantes do mercado acreditam que a opção será exercida. "A opção limita o potencial do alta de preços do C-Bond", explica Felipe Illanes, analista de renda fixa da Merrill Lynch. "Com isso, o título deixou de refletir corretamente o risco-Brasil, o que não acontece com o Global 40", diz o especialista. Todo investidor comprado em C-Bond está vendido automaticamente na opção de resgate antecipado, completa John Welch, analista da Lehman Brothers. Quando o preço sobe, o valor da opção cai e vice-versa. "Por causa da opção, o papel é quase como um título de juros flutuantes", explica Welch. Os impactos de uma alta ou baixa nos juros americanos ficam menos refletidos em seu preço, portanto. Já o Global 40, o papel da dívida brasileira de prazo de vencimento mais longo, tem um prazo médio maior e justamente por isso sofre impacto maior de alterações nos juros dos EUA. O título tem opção de recompra antecipada pelo Tesouro, mas apenas em 2015. A opção não limita seu preço neste momento, portanto. O Global 40 passou agora a ser muito usado por investidores dos dos mais diferentes títulos de países e empresas de mercados emergentes. Quando o mercado piora, os investidores que possuem títulos sem liquidez e que não conseguem vender esses títulos por falta de compradores vendem em seu lugar o Global 40 para se proteger. Quando o mercado melhora, a procura cresce e os vendidos a descoberto são obrigados a entregar o papel, comprando mais e potencializando sua alta. Era o que acontecia antes com o C-Bond quando a opção não limitava seu preço. "O Global 40 hoje dá sustentação aos mercados emergentes e, por seu papel de hedge, reduz o custo de captação do Brasil e de outros países", comenta Welch. O C-Bond se tornou o papel mais negociado não pelo seu volume de emissão, ao contrário do que pensam muitos. Em 15 de abril de 94 foram emitidos US$ 7,4 bilhões desse tipo de papel, que tem capitalização de juros (o C é de "capitalization"). Vários outros "bradies" brasileiros tiveram emissão maior, como por exemplo o Par, do qual foram lançados US$ 10,5 bilhões na mesma data que o C-bond. Mas, logo depois de lançado, o C-Bond acabou ganhando crescente importância e desbancou outro título até então mais negociado dos mercados emergentes, o argentino FRB. A reestruturação da dívida argentina nos moldes do Plano Brady foi anterior à brasileira: aconteceu em 1991. O FRB sumiu do mercado com a moratória argentina, mas, agora, os papéis do país vizinho podem voltar a desbancar os brasileiros em volume de negócios por seu valor de emissão: serão apenas dois títulos, o Discount e o Par, em várias moedas, para dívida de US$ 32 bilhões aproximadamente. Welch não acredita que o Global 40 vai perder sua posição. "O tipo de investidor que está com os papéis argentinos não dá sustentação a eles -compra e vende a qualquer momento", afirma. São os agressivos fundos de hedge e tesouraria de bancos de investimento que compraram os papéis argentinos do investidor de varejo e participaram da reestruturação, conta. O Global 40 ajudou o Brasil a se tornar no ano passado o país emergente com maior giro em títulos da dívida de todos os emergentes, com US$ 1,382 trilhão, passando o México, o líder de 2003, segundo a EMTA.