Título: Seminário
Autor: Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2004, Finanças, p. C-8

Stanley Fischer e Kenneth Rogoff acham que elevar meta acima de 4,5% ajuda queda de juros

Economistas internacionais de peso sugerem que o Brasil aumente o superávit primário acima da atual meta de 4,5% para facilitar uma queda mais rápida das taxas de juros e o crescimento sustentado da economia. Mas só reduzir a taxa de juros básica não é suficiente para estimular o crescimento. O FMI e os economistas, inclusive do setor financeiro, vêem com preocupação os altos spreads bancários no país, que elevam o custo do capital para as empresas e dificultam os investimentos. Dois economistas que já tiveram altos cargos no Fundo Monetário Internacional (FMI) fizeram essa recomendação ontem durante um seminário sobre economia brasileira em Washington: Stanley Fischer (hoje vice-presidente do Citigroup, ex-vice-diretor gerente do Fundo) e Kenneth Rogoff (hoje na Universidade de Harvard e economista-chefe até 2003). O vice-diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental, Charles Collyns, também considera que as altas taxas de juros reais atrapalham as perspectivas de crescimento econômico, mas sua maior preocupação é com os spreads bancários em crédito, que resultam num custo de capital excessivamente alto para o setor produtivo. "Ainda é cedo" para saber se isso é possível, foi a resposta de Collyns sobre a possibilidade de se definir um superávit primário acima de 4,5%. Se o crescimento econômico for mais alto, seria mais fácil elevar o superávit, afirmou. Rogoff, de Harvard, disse durante sua apresentação no seminário organizado pela Câmara de Comércio Brasileira-Americana que o governo "deveria avaliar se vale a pena aumentar o superávit primário para 5% ou 6% do PIB para que as taxas de juros possam cair mais rapidamente". O economista acredita que reduzir os juros poderia melhorar a perspectiva de sustentabilidade da dívida pública nos próximos anos. O presidente do Itaú, Roberto Setubal, diz que gostaria de ver um superávit maior para que o Brasil "chegue mais rapidamente à classificação de grau de investimento", referindo-se às notas dadas pelas agências de rating. O secretário do Tesouro, Joaquim Levy, evitou comentar o assunto, dizendo que o orçamento de 2005 está no Congresso. Durante sua exposição na conferência, Levy ressaltou a necessidade de investir em infra-estrutura para evitar problemas como a falta de energia elétrica ou congestionamentos em portos que interfiram no escoamento das exportações. Na parte de perguntas e respostas, o presidente do Banco Itaú, Roberto Setubal, perguntou diretamente ao secretário Levy se o governo tinha a intenção de aumentar o superávit. Levy não respondeu diretamente. O diretor do HSBC Securities, Paulo Vieira da Cunha, perguntou então se o governo pretendia fazer uma política fiscal expansionista até o fim do ano, já que acumulava até agosto superávit em torno de 5% e resolveu fixar a meta em 4,5%. O secretário disse então que o governo não está "correndo" para assumir o compromisso de um superávit mais alto, e que o orçamento está em discussão no Congresso. O vice-diretor do FMI, Charles Collyns, preferiu não se comprometer e disse que a decisão sobre superávit deve ser tomada pelo governo brasileiro. Mas se houver um crescimento da economia acima das previsões nos próximos anos, pode ser mais fácil aumentar o superávit, afirmou. O FMI projeta uma redução do índice de dívida pública sobre PIB para 45% nos próximos 5 anos, considerando taxa média de crescimento de 3,5% anuais. Mas uma das principais preocupações dos economistas, mais que a taxa de juros básica da economia, é o custo final para os tomadores de empréstimos. Stanley Fischer, vice-presidente do Citigroup, disse que o tamanho dos spreads bancários no Brasil é um "mistério", mesmo considerando a alta carga tributária sobre empréstimos, a inadimplência e as dificuldades de cobrança de créditos ruins. Fischer descreveu sua última visita ao país, há dois meses, durante a qual disse ter ouvido muitas reclamações sobre o custo do crédito. "Mesmo considerando a incerteza jurídica e o alto nível de reservas sobre depósitos, acho que o tamanho do spread ainda é um mistério. Eles devem começar a cair daqui para frente", previu. Collyns também mencionou o assunto. "Concordo que o alto custo da intermediação financeira é um grande problema para o crescimento. Só na Turquia há spreads mais altos que no Brasil." Ele acredita que é necessário estimular a concorrência no setor bancário. Roberto Setubal explicou longamente em sua apresentação as razões para spreads bancários tão altos no Brasil, citando dados das pesquisas de spread do Banco Central comparados com dados em outros países. Setúbal apresentou dados de rentabilidade média dos bancos de 16%, mais altas que na média dos países desenvolvidos, mas disse que descontada a inflação, os níveis de rentabilidade são comparáveis - embora admita que algumas instituições têm rentabilidade bem maior que a média. Em apresentações anteriores ao público externo, os banqueiros brasileiros costumavam falar mais de dados macroeconômicos e não tanto dos custos de intermediação financeira. Setubal mostrou também dados sobre reservas bancárias (cerca de 45% no Brasil ante 10% nos EUA e 9% no Chile) e apontou altos custos (embora os índices do setor bancário brasileiro sejam mais baixos que os custos no México e próximos aos dos Estados Unidos). "Acredito que a demanda por crédito vai crescer, e o aumento dos volumes deve facilitar a queda dos spreads", disse o banqueiro.