Título: Brasil pede a Powell ajuda com as tropas no Haiti
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2004, Brasil, p. A-4

Secretário americano promete pressionar ONU

O governo brasileiro aproveitou a visita, ao país, do secretário de Estado dos Estados Unidos, Colin Powell, para pedir socorro na difícil administração das tropas da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti, sob comando brasileiro. Dos seis mil homens prometidos à ONU, só 2,7 mil estão no país, onde o difícil controle dos rebeldes aliados do presidente deposto Jean Aristide somou-se às atribulações para distribuir alimentos e atender à população faminta e doente devido aos furacões do Caribe que provocaram colapso em algumas cidades. Powell prometeu reforçar a pressão já feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, para acelerar o envio de tropas prometidas por países como o Sri Lanka e o Nepal. Preocupado em não repetir o fracasso de outras missões de paz da ONU, emperradas pela burocracia, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, quer também que a ONU acelere os procedimentos burocráticos para liberação de US$ 1 bilhão arrecadados por diversos países para ajudar o país. O problema, segundo assessores de Amorim, é garantir controle multilateral sobre o bom uso do dinheiro sem alijar o governo haitiano da administração da ajuda internacional. Powell disse a Amorim que o sucesso da missão é de total interesse dos EUA, que são gratos ao governo brasileiro por assumir a tarefa de ajudar na reconstrução do Haiti. O drama haitiano e o risco de problemas para o comando brasileiro assumido no país fazem parte da "agenda positiva" entre Brasil e EUA, que Colin Powell fez questão de ressaltar durante sua curta visita ao país, encerrada ontem. Em plena eleição presidencial, Powell, que já anunciou sua intenção de não permanecer no governo mesmo em caso de reeleição de George Bush, tentou mostrar, no Brasil, como Bush é capaz de manter ótimas relações com o mais famoso líder de esquerda da América Latina, ao contrário da imagem de radicalismo e intolerância de que seu governo é acusado. Com Amorim, Powell chegou a discutir meios de atuar na Venezuela após o referendo que não conseguiu derrubar o presidente Hugo Chávez, para evitar uma ruptura total de diálogo entre governo e oposição locais. A diplomacia brasileira tem esperança de intermediar contatos entre os governos americano e venezuelano, de forma a conter a radicalização no discurso chavista e afastar as expectativas da oposição local por algum tipo de intervenção dos EUA. Powell garantiu que o Brasil seria "um candidato sólido" para uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, declaração comemorada por Amorim como sinal das boas relações entre os dois países. O americano deixou claro ser uma afirmação protocolar; pouco antes de um jantar no Palácio do Itamaraty, em uma conversa informal com jornalistas, disse ser impossível para os Estados Unidos apoiar alguma candidatura isolada, porque outros países, "como Índia e México" cobrariam apoio semelhante. Apesar das boas intenções, Powell e Amorim não deixaram de manifestar divergências, em questões como o conflito entre israelenses e palestinos. Powell classificou a repressão militar contra os palestinos na faixa de Gaza como exercício livre do "direito de defesa" de Israel, embora manifestasse expectativa de que cessem logo os ataques israelenses. Amorim fez questão de condenar o ataque israelense. Ambos mostraram, ainda, ter visões distintas sobre a guerra no Iraque.