Título: MP 232 abre brecha contra a Receita
Autor: Marta Watanabe
Fonte: Valor Econômico, 15/04/2005, Política, p. A8

Enquanto o texto que restou da MP nº 232 não é votado no Senado e ainda continua valendo , os tributaristas aceleram pareceres sobre uma brecha para planejamento tributário encontrada na medida. Para alguns tributaristas, a brecha permite que as empresas realizem alienação de participações ou incorporações sem reconhecer o ganho derivado de aumento de capital feito no passado. A história da nova brecha começa com um planejamento aproveitado nos últimos anos e permitido pelo artigo 36 de uma legislação de 2002 - a Lei nº 10.637/2002. Esse artigo abria as portas para um planejamento que permitia a uma empresa atualizar seu capital sem que sua holding tivesse de recolher Imposto de Renda (IR) sobre o ganho. Por exemplo, a empresa A, que tinha participação na empresa B, resolve formar uma terceira empresa C, que incorpora a empresa B. Essa estrutura aparentemente confusa permitia que a empresa B atualizasse seu capital sem que a holding A pagasse IR sobre o ganho. E a empresa C ficava com um ágio que poderia ser deduzido no cálculo do IR em 60 meses. Na tentativa de vedar esse planejamento, o texto original da MP 232 previu a revogação do artigo 36. A revogação constava do artigo 15 da MP 232. Quando a MP nº 232 foi alvo da revogação pela MP nº 243, porém, além dos dispositivos relacionados à atualização da tabela de IR, foi mantido também o artigo 15. "Portanto, o artigo 15 continua em vigor, já que a MP 232 foi prorrogada para continuar surtindo efeitos enquanto estiver em votação na câmara dos deputados e no senado", explica o advogado Paulo Vaz, do Levy & Salomão. A questão, diz Vaz, é que o artigo 36 previa basicamente duas coisas: a primeira era a possibilidade de não pagar IR sobre o ganho de capital apurado na incorporação com ágio. A segunda previsão era a obrigatoriedade de reconhecer o tal ganho de capital no caso de venda de participação ou incorporação. Como o artigo 15 da MP nº 232 revoga todo o artigo 36 - ou seja, tanto o benefício de IR quanto a obrigatoriedade de tributação - , há especialistas estudando a possibilidade de não pagar o IR caso a alienação ou incorporação aconteça enquanto estiver em vigor o que restou do texto da medida. A vigência do texto foi prorrogada pelo Executivo por 60 dias contados a partir de hoje. Ou seja, o imposto deixou de ser recolhido quando houve aumento de capital e poderia deixar de ser recolhido na venda da participação. "Estamos elaborando parecer sobre o assunto a pedido de uma empresa", diz Vaz. "Na verdade o Executivo não foi cauteloso quando resolveu acabar com o planejamento permitido pelo antigo artigo 36. Faltou perícia legislativa." A questão do artigo 15 da MP 232 ficaria numa situação curiosa, diz o advogado: se for revogado na votação, volta a brecha do antigo artigo 36. Se for mantido, pode abrir brecha para novo planejamento. "A saída é a modificação do texto", diz Vaz. O receio das empresas com a revogação do artigo 36, diz o advogado Plínio Marafon, é o de ter de a pagar IR sobre o ganho de capital não reconhecido no passado, mesmo antes de uma alienação ou incorporação. Para ele, as empresas têm direito adquirido. "Quem fez a operação quando o artigo 36 estava em vigor está protegido." O impasse do artigo 15 ainda não foi oficialmente detectado nas discussões do projeto de lei que vai trazer as compensações tributárias que saíram da MP 232. O assunto, contudo, ainda deve demorar muito para maturar e pode ser corrigido antes mesmo de ser enviado ao Congresso. Como a base governista está toda dividida e esse projeto começa a enfrentar fortes oposições, está sendo adiado. De acordo com o líder do governo na Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), o assunto sequer será tratado na reunião da semana que vem entre o ministro da Fazenda, Antônio Palocci e os líderes da base. (Colaborou Henrique Gomes Batista, de Brasília)