Título: Cade pode derrubar restrições à Vale
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 15/04/2005, Empresas &, p. B4

A presidente do Cade, Elizabeth Farina, afirmou, ontem, que os pareceres que impõem restrições à Companhia Vale do Rio Doce não são definitivos e podem ser revistos no julgamento final do órgão antitruste. "Os pareceres não são vinculantes", explicou Farina, em entrevista ao Valor. "As análises feitas até aqui não comprometem a nossa decisão", completou. Os pareceres das secretarias de Direito e de Acompanhamento Econômico dos ministérios da Justiça e da Fazenda (SDE e Seae) e da Procuradoria do Cade indicam a adoção de uma série de restrições à Vale. São, em resumo: a venda de mineradoras, o fim do direito de preferência da Vale para a compra do excedente da mina Casa de Pedra da CSN, a alteração no acordo de acionistas da MRS para tirar a possibilidade de veto da Vale em algumas decisões dessa empresa e a criação de uma subsidiária para controlar a Estrada de Ferro Vitória-Minas, responsável pelo escoamento de boa parte da produção de aço no Brasil para exportação. Farina disse que o Cade pode pedir análises adicionais aos estudos feitos pelas secretarias e pela Procuradoria do órgão. Mais do que isso: o conselheiro-relator do caso Vale, Ricardo Cueva, pode, segundo Farina, mudar os parâmetros de análise das secretarias. Ou segui-los. "Não há nada definido", resumiu a presidente do Cade. Ao julgar fusões e aquisições, o Cade segue vários parâmetros, como a definição do mercado em que a empresa atua, o grau de concentração desse mercado resultante de suas aquisições, a análise dos rivais dessa empresa, a existência ou não de barreiras à entrada de concorrentes e as eficiências econômicas que as fusões podem trazer ao mercado. Esses parâmetros podem variar. As secretarias adotam um método para analisá-los e o Cade outro. Por exemplo, não se sabe se o Cade irá avaliar o mercado de minério nacional, ou se pretende destacar aspectos regionais da produção de minério em Minas Gerais. Cueva ainda não divulgou os métodos pelos quais pretende analisar a concentração de mercado da Vale no mercado de minério de ferro. O conselheiro pode seguir a análise das secretarias, o que aumentaria a possibilidade de ele votar por restrições à Vale, ou não. Nessa última hipótese, crescem, por outro lado, as chances de aprovação sem condições à companhia. "O Cade pode acatar ou não as sugestões das secretarias", explicou Farina. O órgão antitruste já decidiu contra as sugestões das secretarias em vários processos. O caso mais conhecido em que isso ocorreu foi no julgamento da criação da AmBev. A Seae sugeriu a venda da Skoll a concorrentes como condição para aprovar a fusão entre a Brahma e a Antarctica. A SDE recomendou a venda de uma das três principais marcas da AmBev: Skoll, Brahma ou Antarctica. O Cade decidiu por um caminho diferente: ordenou a venda da Bavária. O que valeu, ao final do processo, foi a decisão do Cade. Na última sessão de julgamentos, houve outro exemplo forte de como o Cade pode tomar decisões diferentes dos pareceres das secretarias. O órgão antitruste julgou a compra da Arisco e da Bestfoods pela Unilever. A Seae havia recomendado a venda das marcas Arisco, dos atomatados Beira Alta, da maionese Gourmet e do catchup Pic a concorrentes. A SDE sugeriu apenas a venda dos dois últimos produtos. Já o Cade decidiu que bastava a Unilever se livrar da maionese Gourmet para o caso ser aprovado. Como a companhia licenciou esse produto à Cargill, o processo foi aprovado sem condições, explicou o advogado que cuidou do caso, José Ignácio Gonzaga Franceschini. "Na verdade, o caso Unilever começou com um parecer bastante restritivo da Seae, mas acabou com a aprovação incondicional do Cade", disse o advogado. O Cade já recebeu representantes da Vale, da CSN e do Departamento Nacional de Produção Mineral para ouvi-los sobre a concentração no mercado de minério de ferro. O Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS) ainda não se manifestou ao órgão antitruste.