Título: Risco-Brasil sobe 7% em meio a temores de desaceleração global
Autor: Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 15/04/2005, Finanças, p. C1

Os temores de que a economia mundial está com uma desaceleração maior do que a esperada tomaram conta do mercado financeiro internacional, ontem, provocando o que alguns especialistas chegaram a chamar de quase pânico. Em meio a boatos de quebra do grupo General Motors, que tem dívida de US$ 300 bilhões nas mãos do mercado, os investidores venderam os papéis considerados de maior risco, como os títulos da dívida externa brasileira e ações. A alta no risco-Brasil foi de 7,13%, a segunda maior desde abril do ano passado. Às 19h, estava a 466 pontos básicos. Os investidores estrangeiros saíram da Bolsa de Valores de São Paulo, que caiu nada menos que 4,1%. Indicadores americanos, declarações do dirigente do Fundo Monetário Internacional, Rodrigo de Rato, relatório da Organização Mundial do Comércio, resultados de empresas americanas, tudo ajudou o mercado a compor um quadro mais pessimista, provocando uma fuga para ativos considerados mais seguros, como os títulos do Tesouro americano. "De repente, o mercado foi tomado por uma insegurança com relação ao ritmo de crescimento econômico", disse Ricardo Simone Pereira, diretor do Multi Commercial Bank. Houve uma venda forte de ações de empresas com receita mais ligada ao nível de atividade econômica -como infra-estrutura, commodities, mineração, equipamentos e produtos de consumo, com ações chamadas de cíclicas. Os mais importantes índices de ações americanos -S&P, Nasdaq e Dow Jones- caíram 1% ou mais. O índice americano de ações cíclicas caiu 5,2% em dois dias, diz Pereira. Nesse contexto de crescimento menor, as perspectivas para a recuperação da General Motors e sua financeira, GMAC, pareceram cada vez mais remotas. As negociações com o sindicato, realizadas ontem, não avançaram. Também não contribuíram para o otimismo com a empresa as notícias de que a Securities and Exchange Commission (xerife do mercado americano) intimou a GM a apresentar documentos relacionados a transações com a Delphi, sua antiga unidade de autopeças, veiculadas pelo "Wall Street Journal". "Se a GM realmente tiver qualquer problema sério, a crise decorrente disso poderia mesmo gerar uma pequena recessão internacional", diz Pereira. Se a empresa for considera de alto risco ("non-investment grade") pelas agências de classificação de risco de crédito, inúmeros fundos mais conservadores que ainda hoje detêm os títulos da GM seriam obrigados a vendê-lo, desencadeando uma depressão no mercado de renda fixa internacional, explicou José Lembi de Faria, diretor do Bradesco, antes de ir à reunião do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) em Okinawa, no Japão. No encontro em Okinawa, os bancos mostraram um consenso sobre quais seriam os principais riscos para os países da América Latina hoje e o rebaixamento da nota de crédito da GM e/ou da Ford para investimento de risco foi colocado entre os principais, segundo Ricardo Amorim, chefe da pesquisa econômica para América Latina do WestLB. O rebaixamento poderia ter sérios impactos no mercado de títulos de alto risco americano e nos mercados emergentes em geral. Para se ter uma idéia da dimensão da dívida da GM, podemos comparar o endividamento total do grupo, de US$ 300 bilhões, com a dívida do país emergente mais endividado, o Brasil (governo e empresas), de US$ 200 bilhões. Sobre essa dívida da GM, o mercado constrói os mais diferentes tipos de derivativos de crédito, que potencializam o efeito de um rebaixamento na nota da montadora. Ontem, o risco GM já foi muito acima do risco de um país com crédito considerado de alto risco, como o Brasil, chegando a 600 pontos básicos. "Investidores me disseram que estavam vendendo papéis do Brasil para comprar os da GM, por causa da rentabilidade maior", conta Pereira. Também contribuíram para depreciar os mercados emergentes os rumores de que o governo do Brasil estaria preparando para já uma captação externa. A Indonésia lançou US$ 1 bilhão anteontem e também venderam papéis a chilena Celulosa Arauco e a mexicana TFM, em total que chegou a quase US$ 2 bilhões. O excesso de oferta de títulos em um mercado retraído levou o Uruguai a cancelar captação de US$ 300 milhões por 12 anos, que havia sido anunciada.