Título: Verticalização ajuda Lula a dobrar o PT
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2005, Política, p. A6

Se julga-se essencial ter o PMDB para assegurar a reeleição de Lula no primeiro turno, em 2006, é difícil entender por que o Palácio do Planalto e a cúpula do PT fincaram o pé na verticalização das eleições, contra a qual se bateram em 2002. É mais fácil para a federação pemedebista entregar o que interessa - seu precioso tempo de TV - ao presidente se estiver livre para voar nos Estados, nas próximas eleições, do que engessado por alianças heterodoxas. A verticalização servirá para dobrar o PT onde isso for necessário. O discurso está alinhavado: os interesses regionais de modo algum devem se sobrepor ao interesse maior do partido, que é a reeleição de Lula e a continuidade do projeto de poder do PT. Por enquanto, José Genoino (SP), candidato à reeleição à presidência do PT, tem adotado tom conciliador. Confirmado no cargo, em eleição marcada para 18 de setembro, não hesitará em recorrer ao centralismo democrático para limpar a área. Às vésperas de ano eleitoral, "enquadrar a moçada", como se diz no Planalto, não é tarefa fácil. Ilustrativo é o exemplo dado pela corrente "Movimento PT" no último fim de semana. No final da tarde de sexta-feira, comemorou a posse de Geraldo Magela como novo presidente do Banco Popular, subsidiária do Banco do Brasil. No sábado, mostrou os dentes e apresentou a candidatura da deputada Maria do Rosário (RS) para concorrer com Genoino ao cargo. Não era bem o combinado. É bem provável que a candidatura de Maria do Rosário seja moeda de troca da tendência petista para futuras negociações, por posições no governo ou no embate eleitoral gaúcho. De Santa Catarina, onde o pragmatismo eleitoral palaciano admite um acordo para reeleger o governador Luiz Henrique (PMDB), a senadora e ex-líder Ideli Salvatti dá uma idéia das inquietações petistas. Em princípio, ela considera a verticalização "um avanço político, por dar coerência e permitir o fortalecimento dos partidos com projetos nacionais". Mas a própria Ideli, candidata em potencial à sucessão de Luiz Henrique, faz a ressalva: "A lógica correta seria essa. Quando essa lógica se inverte, é melhor não ter a verticalização".

Norma de 2002 causa inquietação na sigla

A norma foi estabelecida por uma interpretação legal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para as eleições de 2002. Estabelece que partidos com candidatos a presidente da República não podem se aliar nas eleições para governador. Na época, o PT sugeriu que a decisão era para favorecer a candidatura do tucano José Serra, que, na prática, acabou abandonado na maioria dos Estados pelo PMDB, ao qual se coligara, e pelo próprio PSDB. Pessoalmente, Lula considera que a verticalização ajudará a sua reeleição. Nos Estados, a maioria dos atuais aliados do governo federal tem mais afinidade com PSDB e PFL, partidos de oposição. PMDB, PTB, PL, PP e a maioria dos tucanos têm se manifestado favoráveis ao fim da verticalização. Provavelmente, pela escassez do tempo, seja o único item da reforma política a ser votado no prazo necessário para valer nas eleições de 2006 - o início de outubro. A votação na comissão técnica da Câmara está prevista para o próximo dia 26. Apesar de a maioria dos partidos ser favorável, o fim da verticalização é uma corrida de obstáculos. Principalmente se houver recesso em julho - restarão 120 dias então para a emenda tramitar e ser votada. Com o Planalto jogando contra e a pauta congestionada por medidas provisórias, é difícil. É também um teste para as relações dos aliados com o PT e do PT com ele mesmo. No partido, é voz corrente que Lula já está eleito e que cada um precisa cuidar da própria vida. Ainda mais que os sinais emitidos do Palácio do Planalto apontam numa única direção: a continuidade de um projeto de poder. Ninguém até agora ouviu de Lula e dos assessores próximos o que ele pretende fazer com um segundo mandado. Lula, na contra-mão, tem dito ao petistas que precisa deles para se reeleger. Entre próximos do presidente, afirma-se que não é blefe, ao contrário do que supõe o PT, quando ele fala que pode até não sair candidato, caso sinta que a reeleição não é pule de dez. Blefe ou não, o fato é que o núcleo de poder palaciano avalia que, para manter a trincheira, é preciso estender as alianças de 2002 para muito além do PL. Nem que, para isso, seja preciso sacrificar o PT em alguns Estados.