Título: Próximo passo é ajustar gastos aos ciclos econômicos, afirma Lisboa
Autor: Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2005, Brasil, p. A2

A fixação, na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), de um limite para a carga tributária federal nos próximos anos foi o segundo passo dado pelo governo para melhorar a qualidade do ajuste fiscal. O primeiro foi a decisão de produzir, por prazo indeterminado, superávits primários (excluídos os gastos com os juros da dívida) nas contas públicas. O próximo passo será ajustar os gastos do governo aos ciclos econômicos. Esse ajuste poderá acontecer via adoção, no futuro, de uma banda de variação para o superávit primário. Se durante a execução do Orçamento, a meta de superávit ultrapassar o teto, o governo será obrigado a trazê-la para o que está fixado na banda. Se a meta ficar abaixo do piso, o governo será obrigado a aumentar o esforço fiscal para levá-la ao piso, que hoje é de 4,25% do PIB. Em entrevista ao Valor, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa, enfatizou que essa é uma "discussão de médio e longo prazo". A proposta de criação de um teto para o superávit chegou a ser debatida por técnicos do Ministério do Planejamento durante a elaboração do projeto de LDO enviado semana passada ao Congresso. A discussão, no entanto, é preliminar e não chegou aos ministros Antonio Palocci, da Fazenda, e Paulo Bernardo, do Planejamento. "Essa discussão da melhoria da qualidade do ajuste fiscal é de médio e longo prazo. O primeiro passo dado pelo governo foi a estratégia de se produzir superávits primários por muitos anos. O segundo passo é adotar uma estratégia de redução das receitas administradas e de ajuste das despesas, o que está sendo feito agora", disse Lisboa. O terceiro passo, informou o secretário, será acomodar os gastos públicos, que "não flutuam com a renda nacional", no ciclo econômico. "Tem gasto (público) que não flutua nada. A renda sobe ou desce, o gasto fica parado. Como saúde, educação etc. Varia muito pouco em função do ciclo econômico", explicou Lisboa. "Quando o ciclo econômico está forte, como proporção do PIB, os gastos sociais caem. Quando a economia está fraca, como proporção do PIB, eles sobem ou flutuam 'contraciclicamente' ( seguro-desemprego, por exemplo). Uma melhora da qualidade do ajuste fiscal ocorre se conseguirmos fazer não só uma trajetória de longo prazo de superávits, mas também começar a acomodar a flutuação cíclica para adaptar algo que é da natureza do gasto público. É uma transição lenta e cuidadosa para aumentar a qualidade do ajuste fiscal." No início do governo Lula, foi analisada a possibilidade de se propor ao Fundo Monetário Internacional (FMI) a adoção de um superávit primário anticíclico. Por essa proposta, nos períodos de maior crescimento econômico, o governo economizaria mais, ou seja, aumentaria a meta de superávit primário, abrindo espaço na economia para o investimento privado. No cenário oposto, de menor crescimento, o governo aumentaria o gasto, contribuindo para amenizar os efeitos de menor expansão do PIB. O debate da proposta não prosperou. Lisboa explicou que o ajuste fiscal é a principal âncora da política econômica. "É a política fiscal que permite a eficácia do modelo de metas de inflação e contribui decisivamente para a melhora da situação externa. Foi essa política fiscal (a adoção de superávits de 4,25% do PIB desde 2003) que permitiu queda significativa da relação dívida/PIB. E não só isso. O risco-país caiu. Tudo isso permitiu, a partir de meados de 2003, uma forte retomada da atividade econômica", observou o secretário.