Título: EUA e UE não gostam de proposta industrial do Brasil
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2005, Brasil, p. A4

Os Estados Unidos e a União Européia (UE) disseram ontem ao Brasil e Índia que a proposta na área industrial apresentada por esses países "não tem ambição suficiente" na abertura dos mercados emergentes, mas também não a rechaçaram, como alguns negociadores temiam. Brasil e Índia retrucaram que sua proposta de fórmula para reduzir tarifa de bens industriais e de consumo tem um "elemento aberto" que pode calibrar o tamanho da abertura. E que vai depender de duas contrapartidas: dos resultados na negociação agrícolas e da revisão do acordo de antidumping a fim de evitar abusos na aplicação de sobretaxas. No entanto, a negociação agrícola continua no impasse. Ontem mais uma vez o G-10, grupo protecionista agrícola liderado por Suíça, Japão e Noruega, recusou bater o martelo num acordo sobre como converter tarifas específicas (expressas em dólar por tonelada) em equivalentes "ad valorem" (alíquota expressa em percentagem). Eles acham que o tipo de conversão proposto vai impor-lhes depois amplos cortes tarifários de produtos agrícolas. O representante brasileiro, embaixador Clodoaldo Hugueney, acusou o G-10 de estar atrasando a negociação agrícola enquanto exige avanço em industrial e em serviços. "Já fizemos concessões sobre conversão das tarifas, não dá mais, é um absurdo o que esses países estão querendo", reagiu. Os suíços só querem fechar um acordo nessa área na reunião miniministerial do começo de maio em Paris. As negociações na OMC estão numa fase crucial. Todos os esforços são para evitar um novo fiasco em julho, que comprometeria avanço na conferência ministerial de Hong Kong em dezembro e a possibilidade de se concluir a Rodada de Doha em 2006. Na agricultura, os países se afrontam sobre como converter tarifas, para depois negociar uma fórmula de cortes. Na negociação industrial, a discussão é diretamente sobre qual fórmula será utilizada. A última proposição colocada na mesa partiu do Brasil e da Índia. "Eles não gostaram da nossa proposta (de fórmula para produtos industriais), nós não gostamos das deles, mas o diálogo está aberto", resumiu um diplomata brasileiro após encontro entre Peter Allgeier, representante dos EUA, Peter Carl, principal negociador europeu, Hugueney, do Brasil, além de altos funcionários do Canadá, Austrália, Hong Kong, Índia, Malásia e Quênia. Os EUA consideram que já fizeram importante concessão com sua proposta de fórmula com dois coeficientes, um para cortar tarifas nos países ricos e outro nos emergentes. Coeficiente define a magnitude do corte: quanto maior ele for, menor a redução. Mas para os brasileiros, para se assegurar "reciprocidade menos que total" pelos emergentes, ou seja, cortar menos, a fórmula americana teria que ter coeficiente cinco vezes maior para países como o Brasil e Índia. Exemplo: para um corte de 30% numa tarifa industrial, o coeficiente deveria ser de 50 para os emergentes e só de 10 para os industrializados, que hoje já têm alíquotas muito baixas. Mas os EUA acenam com uma relação 10/15, por enquanto, o que levaria os emergentes a se comprometerem com corte de alíquota muito maior.