Título: Apetite pelo risco
Autor: Felipe Frisch
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2005, Finanças, p. C1

A procura por títulos prefixados - que definem o ganho no momento da compra - no Tesouro Direto vem crescendo ao longo deste ano. O percentual que as Letras do Tesouro Nacional (LTNs) ocupam nas vendas mensais do site de venda de títulos públicos diretamente a pessoas físicas passou de 43,91% em janeiro para 57,57% no mês passado, o maior percentual desde os 70,58% de julho de 2002. A elevada demanda pelas LTNs no Tesouro Direto se mostra não apenas na participação sobre o total, mas no valor, o maior já registrado por esses papéis em um mês: R$ 30,013 milhões. Com a expectativa de redução da taxa básica de juros, a Selic, os papéis prefixados se firmam como preferência dos investidores. E mostram maior apetite por risco, já que estes papéis têm oscilações fortes cada vez que o mercado muda a percepção para os juros. Como têm juros fixos, esses papéis se desvalorizam quando a expectativa é de alta para as taxas, uma desvantagem em relação aos pós-fixados em cenários mais turbulentos. Esta busca pelos prefixados tem se refletido em parte na captação dos fundos de investimento e nas estratégias destas carteiras. Para o estrategista-chefe da Modal Asset Management, Alexandre Póvoa, o interesse das pessoas físicas mostra uma percepção de parte do mercado de que o aperto monetário está, na pior das hipóteses, prestes a ser interrompido. "Como há a razoável chance de a alta dos juros acabar agora, há também uma oportunidade de ganho não desprezível nos prefixados." Póvoa, que espera a efetiva queda dos juros para o segundo semestre, reconhece que é mais cômodo estar num fundo ou título pós-fixado, que pode render 19,25% ao ano brutos pela taxa Selic de hoje. Mas admite que o prefixado "já faz sentido para quem quer um pouco mais de risco", avalia. Apesar disso, ele acredita que a procura seja maior no Tesouro Direto por se tratar de investidores com mais conhecimento. Na avaliação do executivo, a compra maior de LTNs vem alinhada com a intenção do governo de aumentar a parcela prefixada da dívida. Para ele, o prazo destes papéis prefixados também é importante para se analisar o perfil de risco do mercado. Apesar do aparente apetite pelo risco, com o aumento da parcela pré - de 2% da dívida pública federal em dezembro de 2002 para 19% hoje -, o prazo médio da dívida caiu de 42 meses, em 2001, para 29 meses atualmente, diz. O alongamento dos títulos prefixados também não é interessante para o Tesouro, pois pode travar um custo da dívida muito alto mesmo em um cenário de queda dos juros. No Tesouro Direto, os títulos com menos de um ano em poder dos investidores representam 44,12% do total já vendido pelo sistema, mais do que os 37% do fim do ano passado. Isso mostra que a procura pelo longo prazo, esperada pelo governo com a tabela regressiva do imposto de renda, ainda não se confirmou. Na opinião do estrategista-chefe da SulAmérica Investimentos, Paulo de Sá Pereira, ainda é cedo para dizer que a procura pelo risco ou pelos papéis prefixados no Tesouro é condizente com a que ocorre nos fundos. "O ambiente ainda está indefinido em termos da politica monetária do Banco Central, com a expectativa de inflação crescendo, por exemplo", diz. Ele se refere ao sétimo aumento consecutivo da expectativa de inflação no Relatório de Mercado do BC divulgado ontem, com projeção de IPCA a 6,1% nesse ano, acima dos 5,1% da meta de inflação e dos 6,04% que o mercado projetava na semana passada. Pereira explica que o cenário ideal para os prefixados é quando se torna possível já detectar o ciclo de baixa dos juros. Mas "há dúvidas se a fase de alta está no fim" e ele mesmo consideraria correta uma última alta de 0,5 ponto na reunião que termina amanhã, para 19,75% ao ano. O pequeno investidor no Tesouro Direto, diz, tem menos poder para negociar taxas e prazos, enquanto para os grandes investidores - como fundos de investimento - o governo só consegue vender LTNs oferecendo taxas mais altas do que as dos juros futuros.