Título: Intervenção pode ameaçar obras e empregos
Autor: Medeiros, Luísa
Fonte: Correio Braziliense, 24/03/2010, Cidades, p. 23

Para o setor produtivo, medida judicial teria comoefeitos colaterais a paralisação de obras, com forte impacto na geraçãode postos de trabalho

A menos de um mês de completar 50 anos, Brasíliavive diante da ameaça de perder a autonomia política e ter a históriamarcada por uma intervenção federal. Caso os ministros do SupremoTribunal Federal (STF) aceitem o pedido da Procuradoria-Geral daRepública (PGR), o DF seria a primeira unidade federativa do país a sercomandada por uma pessoa escolhida pelo presidente da República.Representantes do setor produtivo estão mobilizados para que isso nãoocorra. Eles participam amanhã do protesto contra a intervençãoencabeçado pela Ordem dos Advogados do Brasil no DF (OAB-DF). Segundoos empresários, uma eventual intervenção trará grande prejuízo àeconomia local e atingirá todos os brasilienses. A paralisação dasobras do GDF e a demissão de trabalhadores são alguns dos prováveisreflexos.

Além de ser um atestado de incompetência para resolver os problemasadvindos da crise política-administrativa que abalou o Executivo e oLegislativo locais, a intervenção federal pode trazer obstáculos para oandamento das obras de infraestrutura espalhadas pelas cidades. E, comoconsequência, prejuízos para o mercado imobiliário.

A tese é defendida pelo presidente do Sindicato da Indústria daConstrução Civil no DF (Sinduscon), Elson Ribeiro Póvoa. A intervençãonesse momento é um golpe. Temos a Constituição e a nossa Lei Orgânica,que têm condições de resolver os problemas referentes à sucessão docargo de governador. As leis estão vigentes e estão sendo respeitadas,afirmou, dizendo que o Poder Judiciário está cumprindo o seu papel eseparando o joio do trigo nas investigações das denúncias decorrupção no DF. Póvoa salientou que, apesar de mensurar algunspossíveis efeitos da intervenção, a medida é imprevisível. Dá parasaber como ela começa, mas não como termina. Isso vai manchar oaniversário da cidade, declarou.

O presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do MercadoImobiliário (Ademi-DF), Adalberto Valadão, é detalhista ao falar dosprejuízo ao DF decorrentes de uma suposta intervenção. O interventordeverá paralisar as obras para rever os contratos do governo. Imaginaparar as obras do Noroeste, do Mangueiral, da Linha Verde? As vendas dosetor imobiliário vão desacelerar e as pessoas vão ficar sem osempreendimentos, à espera das melhorias, afirmou. Apesar de reconhecera gravidade da crise política e de defender a apuração das denúncias dosuposto esquema de pagamento de propina no DF, Valadão não apoia opedido da PGR. O reflexo negativo atingirá a economia como um todo,disse.

O atual processo de amadurecimento político vivido pela populaçãodo DF deveria ser repetido nas urnas em outubro, sugeriu o presidentedo Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci-DF), HermesRodrigues Filho. A crise deve servir de lição para as pessoas saberemusar melhor o voto. Nós estamos passando por um problema que ninguémimaginaria que fosse acontecer, ressaltou. A visão otimista do momentonão é refletida no futuro do mercado imobiliário, caso haja aintervenção. A despensa de mão de obra das construções civis podeacarretar um efeito dominó no mercado. O peão vai deixar de comprar atelevisão que a loja vai deixar de importar, e assim sucessivamente. Ocomércio deixa de vender e o processo de desenvolvimento da capital vairetrair, explicou.

Efeitos sentidos A crise política deflagrada pela Operação Caixa de Pandora, daPolícia Federal (PF), em novembro teve reflexos negativos no primeirobimestre deste ano no comércio do DF. De acordo com o presidente doSindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do DF (Sindhobar), ClaytonMachado, as vendas caíram de 30% a 35%. A queda tradicional de janeiroe fevereiro era de 10% a 15% inferior ao índice registrado nesse ano. Acrise enclausurou as pessoas envolvidas direta ou indiretamente. Estãoreceosas de aparecer, ir a um restaurante, fazer um happy hour,afirmou.

A baixa no movimento dos estabelecimentos, no entanto, deve piorarcaso ocorra a intervenção federal, prevê Machado. A comunidade e ogoverno local serão prejudicados. Se as pessoas não saírem para gastar,a receita vai arrecadar menos. A forma inteligente é fazer com que asinstituições continuem fortalecidas e que o Poder Judiciário mantenha otrabalho focado na apuração das denúncias. Não precisamos deintervenção, defendeu.

No entendimento do presidente Sindicato do Comércio Varejista do DF(Sindivarejista), Antônio Augusto de Moraes, a intervenção federal éuma medida extrema que pode ser evitada. Nosso sistema permite aescolha de outras situações antes de apelar para a intervenção. Devemser cumpridas as etapas do processo previsto em lei, e só no últimocaso seja escolhida a intervenção. Além de paralisar os investimentosque estão sendo feitos no DF, teria diminuição da renda e do consumo etambém demissões, afirmou. O efeito cascata atingiria todos ossetores da sociedade.

Além de paralisar os investimentos que estão sendo feitos no DF, teria diminuição da renda e do consumo, e também demissões

Antônio Augusto de Moraes, presidente Sindicato do Comércio Varejista do DF

Agenda

Quando

Amanhã, às 16h

Onde

Representantes de pelo menos 54 entidades da sociedade civil sereunirão para dar um abraço simbólico no prédio do Supremo TribunalFederal (STF)

O que

Além do abraço, será entregue ao presidente do STF, ministro GilmarMendes, um manifesto contrário ao pedido de intervenção no DF.

Depoimentos // Por que sou contra a intervenção

A intervenção federal seria um golpe contra apopulação do Distrito Federal e traria prejuízo incomensurável para aeconomia local. Um dos motivos de preocupação são as obras em execuçãona cidade, que poderiam ser paralisadas. O efeito se estenderia tambémpara projetos licitados ou em processo de licitação. Esse ato deixaria,ainda, dúvidas sobre a realização de obras para a Copa de 2014, emBrasília, uma das 12 cidades-sede do evento. Atualmente, o setor daconstrução civil é responsável por 65 mil empregos diretos no DistritoFederal e há mais de duas mil obras públicas em andamento. É precisomanter o emprego desses profissionais e as construções que trarãoenormes benefícios para a população, como a Linha Verde e várias obrasde saneamento básico e infraestrutura. Entre as obras já licitadas com recursos federais e internacionais previstos para o início dotrabalho estão o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) e a construção dotúnel do Balão do Aeroporto. O DF tem condições de superar essa crisepolítica, sem paralisar a atividade econômica e com preservação daautonomia da unidade federativa. Prova disso é que a cidade não parou,mas está encontrando o caminho de superação dessa fase, com manutençãoda ordem pública e dos serviços prestados à população.

Elson Póvoa, presidente do Sindicato da Indústria de Construção Civil do DF (Sinduscon)

A hipótese de uma intervenção no DF tem que serdescartada em respeito à Constituição, à Lei Orgânica e aos direitosindividuais dos brasilienses. Já existe a visibilidade de uma eleiçãoindireta para escolha do novo governador da capital. Sinal de que alegislação está sendo contemplada e que o Poder Judiciário está fazendosua parte. Não há motivos para que ela ocorra. Todo o setor produtivo écontra. A sociedade é contra. Então, por que insistir com o pedido deintervenção? A comunidade em geral não pode pagar o alto preço daintervenção federal no DF. Será um verdadeiro caos. As obras vão parar.A economia vai desacelerar. Por causa da crise política, as vendastiveram queda de 30 a 35% nas vendas no primeiro bimestre desse ano,índice 10% a 15% acima do normal no período. Imagina se houver aintervenção federal? O interventor vai paralisar tudo como se fosse umgrande balanço. Acredito que o momento em que vivemos é umaoportunidade para as pessoas repensarem sobre as questões da cidade, deuma forma global. A forma inteligente é fazer com que as instituiçõescontinuem fortalecidas e que o Judiciário continue participando demaneira focada.

Clayton Machado, presidente do Sindicato de Hotéis,Bares e Restaurantes do DF (Sindhobar)