Título: Estudantes entram no microcrédito
Autor: Altamiro Silva Júnior
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2004, Finanças, p. C-8

Tudo começou com um trabalho de pós-graduação no curso de MBA do Coppead, o centro de estudos avançados em gerência de negócios da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Três estudantes, Marco Gorini, Carlos Pires do Rio e Islan Morais, escolheram o tema de microfinanças para o trabalho de conclusão do MBA. Durante a pesquisa, eles descobriram o potencial do mercado para o microcrédito no Brasil. A demanda, segundo eles, pode chegar a R$ 15 bilhões, dos quais menos de 3% é atendida. "Após esta descoberta, resolvemos criar uma empresa especializada em microcrédito", diz Pires. Com isso, nasceu a BSCM Brasil Microfinanças. Criada em 2002, a BSCM começou a funcionar no início do ano passado. Hoje, conta com mais de 500 clientes e tem um patrimônio de R$ 500 mil, cinco vezes acima do capital inicial, de R$ 100 mil. Mas este número deve dobrar no início de 2005. Segundo Marco Gorini, a empresa já pediu autorização no Banco Central para aumentar o patrimônio para R$ 1 milhão e, com isso, aumentar a oferta de crédito que, pelas regras, vai poder chegar a R$ 5 milhões (ou cinco vezes o patrimônio). A BSCM é uma Sociedade de Crédito ao Microempreendedor (SCM), instituição financeira criada pelo governo em 1999 para fomentar o microcrédito produtivo (para o financiamento do capital de giro e de investimentos de microempreendedores, seja no mercado formal ou informal). Pelas regras, estas SCMs não podem fornecer crédito ao consumo. O limite máximo de empréstimo é de R$ 10 mil. Não há limite para as taxas. Segundo Gorini, o sucesso da BSCM já em seu primeiro ano de atividade se deve ao "abismo entre a demanda e a oferta de crédito" no segmento de baixa renda no Brasil. Hoje, são apenas 43 SCMs pelo país. Um exemplo de sucesso é a Colômbia. Lá, apenas o Banco Sol tem uma carteira de US$ 100 milhões para o microcrédito, ou seja, mais que as carteiras de todas as SCMs daqui. Para Pires, o setor tem dois grandes problemas: falta de funding de longo prazo e a escala ainda pequena dos negócios. Uma das soluções para o funding seriam os recursos de bancos privados, que poderiam chegar ao tomador por meio das SCMs. "O microcrédito tem características diferentes do crédito tradicional e as SCMs já sabem lidar com isso", diz. Na BSCM, a inadimplência no primeiro ano foi zero. Pelas regras atuais, os bancos têm que repassar 2% dos depósitos à vista para o microcrédito (a diferença é que os bancos podem emprestar também para o consumo). Os últimos números do BC mostram, porém, que isso não aconteceu. De um total de R$ 1,11 bilhão que poderiam ser usados, as instituições repassaram apenas R$ 216 milhões. A primeira parceria da BSCM foi com um banco público. A empresa acaba de assinar um acordo com a Caixa Econômica Federal para repassar os recursos da instituição para microempreendedores do Rio. Outro plano da empresa é chegar, por meio de parcerias, ao mercado paulista. Segundo Morais, isso deve acontecer no início de 2005. Além disso, a BSCM vai contratar uma empresa de rating, a francesa Planet Finance (especializada em microcrédito), para avaliá-la. "Com isso, poderemos ter acesso a fontes de recursos em organismos internacionais de fomento", diz o executivo. As regras para o setor são outro problema. "A regulação precisa ser mais flexível", diz Pires, destacando que o limite de R$ 10 mil por empréstimo, por exemplo, é muito baixo.