Título: Brasil tenta intermediar solução para o Equador
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2005, Internacional, p. A8

O Brasil se ofereceu ao novo governo do Equador para auxiliar os entendimentos entre os grupos políticos, na sucessão de Lúcio Gutiérrez, deposto da Presidência do país na quarta-feira e asilado na Embaixada do Brasil, em Quito. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prefere que qualquer ação internacional para assegurar a normalização política no Equador seja executada apenas por governos sul-americanos, da recém-criada Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA). A Organização dos Estados Americanos (OEA) reuniu-se ontem para debater a crise equatoriana, porém, e, sem consenso, adiou para hoje uma decisão sobre o assunto. Peru e Venezuela questionam a constitucionalidade da deposição de Gutiérrez. À noite, o Brasil obteve o apoio dos vizinhos para uma missão da CASA ao Equador, a fim de dialogar com as forças políticas. O chanceler brasileiro, Celso Amorin, e os colegas do Peru, Manoel Rodríguez, e da Bolívia, Juan Ignacio Siles del Valle farão parte de missão. A Argentina, que é chefe do Grupo do Rio, também participará. A queda de Gutiérrez se deu por votação do Congresso, após os militares retirarem a sustentação que davam ao presidente equatoriano, alvo de repetidas manifestações populares de protesto. Após a malsucedida tentativa de embarcar em um avião para o Panamá, Gutiérrez pediu asilo diplomático à Embaixada do Brasil, onde chegou no porta-mala de um automóvel. O asilo no Brasil foi concedido pelo presidente Lula, após reunião com Amorim que, ontem pela manhã, fez consultas por telefone a chanceleres do Uruguai, do Paraguai e do Chile. Até o fechamento desta edição, a embaixada brasileira em Quito aguardava garantias de segurança para o embarque de Gutiérrez, em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB), ao Brasil. Na opinião do governo brasileiro, a queda do presidente do Equador é fato consumado, e se deveu a problemas dele com a "superestrutura política e jurídica do país". A decisão da Suprema Corte, nomeada pelo governo, de anular processos por corrupção contra o ex-presidente Abdala Bucarám (com quem Gutiérrez buscava apoio político) desencadeou os protestos que culminaram na queda. O emissário do novo governo equatoriano à reunião da OEA, Jaime Barberis, pediu uma manifestação da organização em favor do novo governo, mas, por pressão das delegações do Peru e da Venezuela, foi convocado a explicar o processo de demissão de Gutiérrez - o que deve fazer hoje. A carta da OEA determina a expulsão do país-sócio que não seguir princípios constitucionais e democráticos. Da Espanha, onde participa de uma reunião sobre a cúpula ibero-americana, o assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, disse ao Valor que o governo brasileiro se dispôs a participar de qualquer esforço de mediação, em caso de impasse entre as forças políticas locais. Ressalvou, porém, que é preciso esperar a iniciativa do atual governo local. "É preciso deixar a situação se acomodar; não funciona negociação enquanto continuam as manifestações de rua". Na quarta, Garcia chegou a ser procurado por emissários de Gutiérrez, em busca de apoio para manutenção no posto; a deposição do presidente ocorreu antes que o assessor falasse com Lula. Manifestantes voltaram ontem a bater panelas e entoavam slogans anti-Gutiérrez em frente à Embaixada do Brasil. O sucessor, Alfredo Palacios, prometeu um referendo e uma Assembléia Constitucional para promover uma reforma institucional no país. O Brasil aguarda a decisão das forças políticas equatorianas em relação ao mandato de Palacios, que poderá ser mantido até o fim do período previsto para Gutiérrez ou interrompido pela convocação de eleições. Há simpatia, em Brasília, pelo prefeito de Quito, Paco Moncayo, líder esquerdista e provável candidato nas próximas eleições presidenciais. A convite de Moncayo, Garcia visitou o Equador, no início de abril, e recebeu um título de cidadão honorário de Quito. Com Gutiérrez, Garcia negociou projetos de apoio brasileiro à construção da estrada Quito-Guayaquil, a reforma de um aeroporto e a venda de aviões da Embraer, negócios que o governo espera serem mantidos pela atual administração. O embaixador do Brasil em Quito, Sérgio Florêncio, comentou ser "prematura" qualquer avaliação de mudança na política econômica e descartou a possibilidade de que alguma das forças políticas locais inicie pressões para acabar com a dolarização da economia.